Leitura Partilhada
segunda-feira, maio 31, 2004
  Canal do Panamá
Mas o facto de Albertine ter jantado no Palácio do membro do Conselho Geral do banco com esta ou aquela senhora, e de essa senhora a ter até convidado para o próximo Inverno, não deixava de, para a mãe de Andrée, atribuir à rapariga uma espécie de consideração especial que se casava muito bem com a piedade e até com o desprezo que o seu infortúnio despertava, desprezo esse aumentado pelo facto de o senhor Bontemps ter traído a sua bandeira e - ao que se dizia, mostrando-se até vagamente panamista – se tivesse aliado ao Governo. (pag. 519)



- Compagnie Universelle du Canal Interoceanique incorporated under French law, 1881
- Declared bankrupt and dissolved, 1889
- Assets and property vested in Compagnie Nouvelle du Canal de Panama, 1894
- Compagnie Nouvelle purchased by the United States, 1904

(http://www.archives.gov/research_room/federal_records_guide/panama_canal_rg185.html#185.3)



On 1881, driven by patriotic fervor and capitalized by over 100,000 mostly small investors, the French Compagnie Universelle du Canal Interocéanique began work on a canal that would cross the Colombian isthmus of Panama and unite the Atlantic and Pacific Oceans. Ferdinand de Lesseps, builder of the Suez Canal, led the project.

Europeans had dreamed of a Central American canal as early as the 16th century. To sail from Atlantic to Pacific, ships navigated around Cape Horn, the treacherous southern extremity of South America. A New York to San Francisco journey measured some 13,000 miles and took months. A canal across Panama would save incalculable miles and man-hours. It would also, Ferdinand de Lesseps believed, make its stockholders rich, just as the Suez had done for its investors.

De Lesseps had disregarded the warnings of men who knew Panama intimately. Now his crew discovered the real Panama-mile upon mile of impassable jungle, day upon day of torrential rain, insects, snakes, swamps, hellish heat, smallpox, malaria, yellow fever and the Chagres River (ignoring the warnings of engineers who deemed the task impossible, de Lesseps decided to dam and divert the river, which he had only seen at low ebb. In the rainy season, the Chagres rose to a monstrous, churning torrent that swept away anything that stood in its way).

Year after year, the digging and the dying continued. French investors grumbled at the lack of progress. "Is M. de Lesseps a Canal Digger or a Grave Digger?"

When the Compagnie Universelle du Canal Interocéanique failed in December,1888, thousands of French investors lost their money. The word Panama quickly became synonymous with scandal and fraud. About $287,000,000 had been spent. 50,000,000 cubic meters of earth and rock had been moved. 11 miles of canal had been dug. 20,000 men had died. The canal remained unfinished.

(http://www.pbs.org/wgbh/amex/tr/panama.html)

(Bond certificate issued by "L'Achevenete du Canal de Panama" for 500 Francs in 1892.)

Em 1885, e devido a enormes problemas, o plano inicial de um canal ao nível do mar foi alterado de modo a incluir uma comporta. Após quatro anos a companhia não conseguia pagar aos seus credores e faliu. Lesseps e os principais colaboradores, onde se incluía um filho seu, foram levados em 1893 a tribunal e condenados.

Uma nova companhia, a Compagnie Nouvelle du Canal de Panama, foi criada em 1894 pelos franceses para tentar acabar o canal, mas também não teve sucesso. Restava agora encontrar um comprador já que a concessão dos terrenos só terminava em 1903.

(http://www.edinfor.pt/anc/anccanalpanama.html)



J.M.
 
  Spinario
… tal como aqueles pintores que, procurando a grandeza do antigo na vida moderna, dão a uma mulher que corta uma unha do pé a nobreza do “Rapaz Extraindo Um Espinho”… (pag. 533)



J.M.
 
  Fantasia, amor, desejo
Porque o livro me parece conter tudo isso, em porções diferentes embora não diferenciadas; é como se todas se unissem, formando uma massa (levedando), em que a soma das partes não, de forma alguma, o resultado do todo. Há mais no livro do que tudo aquilo de que aqui falámos; é algo que fica para além das fantasias de Marcel, dos seus desejos mais ou menos indistintos; é algo que ultrapassa o amor deste pelas várias formas de arte ao seu alcance; que não reside propriamente na descrição das pessoas com quem se cruza e que formam, por si só, um mosaico complexo. Talvez esse ligante de que falo seja o que dá forma ao livro, o que ultrapassa a análise e resida apenas na sensação (emoção) de o ir lendo. Como o Tempo a dar forma ao que se vive.
nastenka-d
 
domingo, maio 30, 2004
 
"No convívio com pessoas que inicialmente achámos desagradáveis, persiste sempre, mesmo no prazer ilusório que podemos acabar por saborear junto delas, o gosto adulterado dos defeitos que elas conseguiram dissimular. Mas em relações como aquelas que eu tinha com Albertine e as amigas, o prazer verdadeiro que está na sua origem exala esse perfume que nunhum artifício consegue dar aos frutos forçados, às uvas que não amadurecem ao sol. As criaturas sobrenaturais que elas por um instante haviam sido para mim infundiam ainda, mesmo sem eu dar por isso, algum maravilhoso nas relações mais banais que tinha com elas, ou, antes, preservavam essas relações de terem alguma vez algo de banal...
...
muitas vezes, à tarde, ali deitado – tal como aqueles pintores que, procurando a grandeza do antigo na vida moderna....como Rubens, fazem deusas com mulheres suas conhecidas para compor uma cena mitológica - , olhava para aqueles belos corpos morenos e loiros, de tipos opostos, espalhados à minha volta sobre a erva, porventura sem os esvaziar de todo o medíocre conteúdo de que os enchera a experiência diária mas, no entanto..., como se, à semelhança de Hércules ou Telémaco, estivera a brincar no meio das ninfas.
"


Troti
 
 
"A inteligência deixa fugir a corrente dos dias passsado, só guarda fortemente a última extremidade, muitas vezes de outro metal diferente dos elos desaparecidos na noite e na viagem que fazemos através da vida, apenas considera real a terra onde estamos presentemente. As minhas primeiríssimas impressões, já tão distantes, não podiam encontrar na minha memória recurso contra a sua deformação diária, durante as longas horas que passava a conversar, a merendar, a jogar com aquelas raparigas, nem sequer me lembrava de que elas eram as mesmas virgens impiedosas e sensuais que, como que num fresco, vira desfilando junto ao mar.
È verdade que os geógrafos, os arqueólogos, nos conduzem á ilha de Calipso, é verdade que exumam o palácio de Minos. Mas Calipso não passa de uma mulher, Minos não passa de um rei sem nada de divino. Até as qualidades e defeitos que a história nos conta terem sido apanágio dessas pessoas bem reais diferem muito grandemente dos que atribuímoa aos seres fabulosos qiue usavam o mesmo nome. Assim se dissipara toda o graciosa mitologia oceãnica que eu compusera nos primeiros dias. Mas não é totalmente indiferente que, ao menos algumas vezes, nos aconteça passarmos o nosso tempo em familiar contacto com o que julgámos inacessível e desejámos.
"


Troti
 
 
"A pressão da mão de Albertine possuía uma suavidade sensual que estava como que de harmonia com a coloração rósea, levemente rosa-malva, da sua pele. Essa pressão parecia fazer-nos penetrar dentro da jovem, na profundidade dos seus sentidos, como a sonoridade do seu riso, indecente como um arrulhar ou como certos gritos. Ela era daquelas mulheres a quem apertar a mão dá tão grande prazer que ficamos gratos à civilização por ter feito do “shake-hand” um acto permitido entre rapazes e raparigas que se encontram."

Troti
 
 
"Era deliciado que ouvia o chilrear delas. Amar ajuda a discernir, a diferenciar.
Num bosque, o amador de pássaros distingue imediatamente aqueles gorjeios próprios de cada um que o homem vulgar confunde. O amador de raparigas sabe que as vozes humanas são ainda mais variadas. Cada uma delas possui mais notas que o mais rico dos instrumentos. E as combinações segundo as quais as agrupa são tão inesgotáveis como a infinita variedade das personalidades."


Troti
 
 
"Ora, embora a dormir os meus olhos não tivessem visto as horas, o corpo soubera calculá-las, medira o tempo, não num mostrador superficialmente desenhado, mas pelo peso progressivo de todas as minhas forças refeitas que, como um poderoso relógio, deixara descer ponto a ponto do cérebro até ao resto do corpo, onde elas amontoavam agora, até acima dos joelhos, a abundânccia intacta das suas provisões. Se é verdade que o mar foi outrora o nosso meio vital onde tenhamos de remergulhar o nosso sangue para recuperar forças, o mesmo se passa com o esquecimento, com o nada mental; parecemos então ausentes do tempo durante algumas horas; mas as forças que entretanto se armazenaram sem ser gastas medem-no pela sua quantidade com tanta exactidão como os pesos do relógio ou os desmoronados montículos da ampulheta. Aliás, não saímos mais fácilmente de um sono assim que da vigília prolongada, de tal modo as coisas tendem a durar, e, se é verdade que certos narcóticos fazem dormir, dormir muito tempo é um narcótico ainda mais poderoso, depois do qual a muito custo despertamos."

Troti
 
  Como assim, ela é tudo o que há de melhor, são Simonet, só com um ene.
J.M.
 
  Idolatria di Giotto
"...facevo due passi con Albertine che avevo scorta, mentre innalzava in fondo ad un cordoncino un attributo bizzarro che la faceva somigliare all'Idolatria di Giotto; si chiama, del resto, "diabolo", ed é attualmente caduto in disuso che, davanti al ritratto di una fanciulla che ne abbia uno, i commentatori dell'avvenire potranno dissertare, come davanti a una figura allegorica dell'Arena, su ciò che essa ha in mano."(pag. 470)



In "All'ombra della fanciulle in fiore" Albertine che gioca a diabolo sulla spiaggia di Balbec viene paragonata all'Infedeltà che sorregge, attaccato ad una lunga corda, l'idolo o "diavolo" che è l'oggetto della sua colpevole adorazione.
(http://www.marcelproust.it/proust/infed.htm)

Le Virtù e i Vizi della Cappella degli Scrovegni a Padova sono solo il più basso di quattro affreschi, ma Proust, scrive George Painter, ad un certo punto aveva progettato di intitolare un intero capitolo della Recherche "Les vices et les vertues de Padoue et de Combray". Le figure allegoriche di Giotto vengono, nel romanzo, richiamate spesso. Negli anni della maturità il Narratore-Marcel comprenderà il senso profondo di queste allegorie meglio di quanto avesse saputo fare quando, a Combray, ne aveva avuto in dono le riproduzioni da Swann. Giotto rimane comunque sempre uno dei pittori ricorrenti nel complesso meccanismo della memoria e della metafora proustiana.
(http://www.marcelproust.it/proust/giotto.htm#)

J.M.
 
  Tão ternurento...
Tal como Gilberte fora o meu primeiro amor por uma rapariga, elas (flores de espinheiro) haviam sido o meu primeiro amor por uma flor. (pag. 505)

J.M.
 
sábado, maio 29, 2004
  Quando termina a realidade e começa o sonho ou vice-versa IV
A inconsistência dos afectos. A sedução e a elegância que notaram em mim … lamentei não poder reservá-las para a conquista de qualquer outra pessoa mais interessante, tive pena de consumir tudo aquilo no simples prazer de conhecer Albertine.

O rapaz está mesmo muito confuso. (...)à medida que me aproximava da rapariga e a conhecia melhor, este conhecimento fazia-se por subtracção, em que cada parte de imaginação e desejo era substituída por uma noção que valia infinitamente menos. É o que eu digo, ou muda muito, ou vai ter sérias dificuldades em dominar o tédio.

No começo de um amor, como no seu fim, não estamos exclusivamente apegados ao objecto desse amor, mas é antes o desejo de amar, onde ele vai ter origem. Sim, mas tu levas isso completamente à letra e sempre convém um bocadinho de apego à realidade. Nunca resulta iniciar uma relação com base no desespero.

J.M.
 
  Sófocles escreve dos Infernos a Racine para o consolar do inêxito de Atalia
Vamos fazer um exercício e tentar imaginar os nossos pré-universitários a dissertar sobre um tema parecido!

J.M.
 
  Elstir
Como? Não conhecem o célebre pintor Elstir? (pag. 410)

Nel salotto Verdurin è soprannominato "Biche" o "Tiche". E' un pittore che il Narratore ammira molto. Lo ritrova a Balbec dove spera che Elstir gli faccia conoscere la piccola brigata delle fanciulle in fiore. Dietro sua richiesta, Elstir gli fa conoscere Albertine.

E' per potere vedere i quadri della duchessa di Guermantes di cui è l'autore che il N. chiede a Saint-Loup una raccomandazione.

Uno di questi quadri attribuiti nella Recherche ad Elstir è il "Déjeuner des canotiers" di Renoir, che nella realtà apparteneva a Charles Ephrussi il quale nel dipinto compare in fondo, con in testa il cilindro.



In All'ombra delle fanciulle in fiore Elstir dà una vera e propria lezione di estetica al Narratore facendogli scoprire tutte le bellezze delle statue della chiesa di Balbec e la loro grande poesia. Egli attira la sua attenzione su certi luoghi come Creuniers o il porto di Carquethuit e gli dice che l'essenza dell'arte sta nella visione dell'oggetto e non nell'oggetto stesso. Modelli di Elstir: Monet, Manet, Whistler assieme ad altri pittori impressionisti come, appunto, Renoir.

Al personaggio di Elstir contribuì anche, secondo Painter e Tadiè, il celebre pittore di vita parigina Jean Béraud.
(Jean Béraud fotografato nel suo studio)

(http://www.marcelproust.it/person/elstir.htm)

J.M.
 
  Porque ele não podia nunca "ficar sem fazer nada", embora aliás nunca fizesse nada.
J.M.
 
sexta-feira, maio 28, 2004
  Quando termina a realidade e começa o sonho ou vice-versa III
Inventava incríveis histórias amorosas para não morrer de tédio e não amava nenhuma delas amando-as a todas. Estava tão fixado naquelas ficções que a possibilidade de as encontar era para os meus dias o único elemento delicioso, bastava para fazer nascer em mim aquelas esperanças em que caíram todos os obstáculos, esperanças essas muitas vezes seguidas de raiva quando não as via.

Aquele jogo de fingir indiferença acabava por resultar quando ele se deparava com a realidade: a certeza da apresentação às raparigas tivera como resultado, não apenas fazer-me fingir indiferença a seu respeito, mas senti-la. Agora inevitável, o prazer de as conhecer foi comprimido, reduzido, pareceu-me mais pequeno que o de conversar com Saint-Loup.

A Albertine que ele julgava amar pouco mais era que uma silhueta, pois tudo o que lhe agradava nela era sua própria criação, de tal modo no amor as contribuições que vêm de nós vencem as que vêm do ser amado.

J.M.
 
 
À medida que se desce na escala social, o snobismo agarra-se a uns nadas que talvez não sejam mais inúteis que as distinções da aristocracia, mas que, sendo mais obscuros e mais próprios de cada um, são mais surpreendentes. (pag. 429)

J.M.
 
 
(O mundo da indústria e dos negócios) era aquele que à primeira vista me interessava menos, visto que para mim não tinha nem o mistério do povo, nem o de uma sociedade como a dos Guermantes. (pag 429)

J.M.
 
  Sonho
Por vezes, Proust consegue ser um bocadinho possidónio, mas são frases como estas que imediatamente me reconciliam com o escritor:

Se um pouco de sonho for perigoso, a cura não está em menos sonho, mas em mais sonho, mas em todo o sonho. (pag. 427)

Porque a existência não tem grande interesse, a não ser nos dias em que a poeira das realidades se mistura com areia mágica, em que qualquer vulgar incidente se torna energia romanesca. (pag. 449)

J.M.
 
quinta-feira, maio 27, 2004
 
Como o risco de desagradar vem sobretudo da dificuldade de apreciar o que passa ou não despercebido, deveríamos ao menos, por uma questão de prudência, nunca falar de nós mesmos, porque é assunto onde podemos estar certos de que a visão dos outros e a nossa própria visão nunca concordam.

Mas então – pergunto eu – o que resta para ser partilhado?
Se pautamos a nossa relação com os outros apenas pela prudência, se não nos deixamos ir um pouco, se não nos damos, sobre que bases poderemos construir o que quer que seja?

nastenka-d
 
  Quando termina a realidade e começa o sonho ou vice-versa II
Talvez a imaginação desenfreada, naquelas horas estéreis, lhe fizesse mal à saúde... Com o excesso de ócio, propiciador de hipersensibilidade, a canalização dos afectos acaba por tornar-se confusa e sem rumo.

Fosse qual fosse aquela que, em determinado dia, preferia contemplar, as outras, sem essa, bastavam para me emocionar.

J.M.
 
  Whistler
E às vezes ao céu e ao mar uniformemente cinzentos juntava-se um pouco de rosa com um refinamento raro, enquanto uma pequena borboleta que adormecera por baixo da janela parecia apor as suas asas na base daquela “harmonia cinza e rosa” ao gosto das de Whistler, a assinatura preferia do mestre de Chelsea. (pag. 390)


(James Whistler. Variations in Pink and Grey: Chelsea. 1871/2)

J.M.
 
  Bem te podias ter lembrado de peixe melhor…
.. sobre o mar já frio e azul como o peixe a que chamam mugem… (pag. 388)

Com Proust, fico a saber que o peixe a que se chama mugem (Mugil cephalus) é uma tainha. Blhaaacccc….



mas também acabei de perceber que nem todas as tainhas são aqueles animais asquerosos que eu recordo a chapinhar freneticamente no lodo das águas do Douro. Pelos vistos, também há tainhas de mar.

J.M.
 
quarta-feira, maio 26, 2004
 
Ora diz-me lá, tu és snob? És, não és?

nastenka-d
 
  Quando termina a realidade e começa o sonho ou vice-versa I
Ele tinha no coração velhas fantasias de infância e toda a ternura lhe era trazida por um ser que ele próprio construía. Ele não sabia qual daquelas raparigas era a menina Simonet, se alguma delas se chamava assim, mas sabia que era amado pela menina Simonet. E a tarefa de as conhecer, uma vez tornada fácil, afigurava-se-lhe indiferente.

Para ele, nada mais é que aparências e nada mais existe senão em função do nosso sublime nós-mesmos. Para ele, só as sensações presentes importavam. E dava tudo o que tinha dentro de si por alguém que, no dia seguinte, lhe iria parecer desprovido de interesse e logo substituído por novos alguéns.

J.M.
 
  And now something completely different
Portanto era evidente que o Bloch acreditava que em Inglaterra, não apenas todos os indivíduos do sexo masculino são lords, mas ainda que a letra i se pronuncia sempre ai.

nastenka-d
 
  Dentro - e fora de nós
Tememos o desaparecimento dos bens que permaneceram fora de nós mais do que o de todos os outros, porque o nosso coração se não apoderou deles.

Marcel exprime a preocupação pelo seu próprio alheamento – pois é de alheamento que se fala, quando se diz de um amigo que está fora de nós. Esta preocupação não é mais, suspeito, do que um certo sentimento (mesmo que vago) de culpa: culpa por não sentir em si aquilo que imagina poder corresponder à dedicação que o amigo lhe oferece; culpa por ser feliz com maior facilidade quando está só; culpa por sentir quase como perdidas as horas que passa com ele. E tudo isto Marcel sente apesar da forma como o descreve quando o vê pela primeira vez, apesar do fascínio que se desprende das suas palavras:
... vi passar, alto, magro, esguio, pescoço ágil, cabeça erguida e altaneira, um jovem de olhos penetrantes e cuja pele era tão dourada e o cabelo tão loiro como se tivessem absorvido todos os raios de sol. Caminhava depressa, com uma roupa de um tecido ligeiro e esbranquiçado como eu nunca julgaria que um homem pudesse atrever-se a usar, e cuja beleza evocava tanto a frescura da sala de jantar como o calor e o belo dia lá de fora. Os olhos, de um dos quais saltava a todo o instante um monóculo, eram da cor do mar. Todos olharam para ele com curiosidade ao passar, pois sabia-se que aquele jovem marquês de Saint-Loup-en-Bray era célebre pela sua elegância.
Mas a mim parece-me que, tendo-o conhecido, fazendo parte do seu círculo, Marcel se aborrece com a sua presença – como se esta lhe desse assim menos espaço para o fantasiar. Lembro Gilberte, lembro a forma como Marcel a fantasiava; e penso que talvez ele não se relacione com mais ninguém a não ser com os seus fantasmas.
nastenka-d
 
 
À medida que a estação avançava, mudava o quadro que dela avistava da minha janela. De início havia plena claridade, e só fazia escuro quando estava mau tempo; então, no vidro glauco e que parecia inchado pelas vagas redondas do mar, este, engastado entre as ombreiras de ferro da sacada como entre os caixilhos de chumbo de um vitral, desfiava por toda a cavada borda rochosa da baía triângulos empenachados de uma espuma imóvel, delineados com a delicadeza de uma pluma ou de uma penugem desenhadas por Pisanello

e fixados por aquele esmalte branco, inalterável e cremoso que nas obras de vidro de Gallé

representa uma camada de neve. (pag. 387)

J.M.
 
 
De modo que, se não fosse o hábito, a vida devia parecer deliciosa a seres que a todas as horas estariam ameaçados de morte – isto é, a todos os homens.

nastenka-d
 
  E depois, o tédio?
A fugacidade dos seres que não são nossos conhecidos .. coloca-nos naquele estado de perseguição em que já nada detém a imaginação.

É preciso que a imaginação, despertada pela incerteza de poder atingir o seu objectivo, crie um fim que nos oculte o outro e, substituindo o prazer sensual pela ideia de penetrar numa vida, nos impeça de reconhecer tal prazer, de experimentar o seu sabor verdadeiro, de o restringir no seu âmago.


(pag. 381)

J.M.
 
  Vida burguesa
Enfim, neste meio em que as grandezas artificiais da aristocracia não existem, substituem-nas por distinções mais loucas ainda. (pag. 357)

J.M.
 
  Talvez o senhor não tenha mérito pessoal, não sei, há tão pouca gente que o tem!
J.M.
 
  O mar
Mas, antes de tudo, tinha aberto os meus cortinados na impaciência de saber qual era o Mar que naquela manhã brincava junto à praia, como uma nereida. Porque nenhum desses mares ficava mais de um dia. No dia seguinte havia outro que às vezes se parecia com o anterior. Mas nunca vi o mesmo dois dias seguidos.
Havia-os de uma beleza tão rara que, ao vê-los, o meu prazer aumentava ainda mais com a surpresa. Por que privilégio, naquela manhã e não noutra, a janela, ao entreabrir-se, me revelava aos olhos maravilhados a ninfa Glaucónome, cuja preguiçosa beleza, respirando molemente, possuía a transparência de uma vaporosa esmeralda através da qual via afluir os elementos ponderáveis que a coloriam?


nastenka-d
 
  As demarcações demasiado estritas que traçamos em torno do amor apenas provêm da nossa grande ignorância da vida.
J.M.
 
terça-feira, maio 25, 2004
  Usarei um título de príncipe quando quiser viajar incógnito.
J.M.
 
  Ingénuas insistências
… com um escrúpulo de precisão que conservei até à idade em que compreendi que não é perguntando-lha que se fica a saber a verdade acerca da intenção de um homem, e que o risco de um mal-entendido que provavelmente irá passar despercebido é menor que o de uma ingénua insistência. (pag. 345)

J.M.
 
  A verdadeira elegância está menos distante da simplicidade que a falsa.
J.M.
 
 
O género de fraude que consiste em ter a audácia de proclamar a verdade, mas misturando-lhe em boa proporção mentiras que a falsificam, está mais espalhado do que se pensa. (pag. 331)

J.M.
 
  (des)identificação
E ao mau hábito da falar de nós mesmos e dos nossos defeitos deve acrescentar-se (..) aquele outro de denunciar nos outros defeitos precisamente análogos aos que possuímos. Ora é sempre desses defeitos que falamos, como se fosse uma maneira de falar de nós, desviada, e que junta ao prazer de nos absolvermos o de confessarmos.

Um homem pouco asseado só fala dos banhos que os outros não tomam
Um fedorento pretende que o outro cheira mal
Um marido enganado vê maridos enganados por toda a parte
Uma mulher leviana, mulheres levianas
O snob, snobs


(pag. 328)

J.M.
 
  Quão mal faz o excesso de livros cor-de-rosa
... caíra nas garras de uma má mulher, por quem estava louco e que não o largaria, como eu estava convencido que aquele género de amor acabava fatalmente na alienação mental, no crime e no suicídio (pag. 312)

J.M.
 
  Snobismos VI


Cher Greg,

Je suis flatté par la justesse de vos remarques.

Dans ma jeunesse, j'étais anarchiste comme la plupart de mes camarades de classe. On dit de moi que je suis réactionnaire, snob, mondain. Il est vrai que je suis conscient au plus haut point de la dimension mondaine des faits sociologiques.

À l'opposé, quelqu'un comme Legrandin se prend pour une tête jacobine alors qu'il ignore qu'il est snob. Il faut dire que la frontière est mince entre l'amitié, la politique et le snobisme. Aussi Legrandin considère-t-il que le snobisme est un péché sans rémission. S'il a raison, je crains que nous ne soyons tous coupables de ce péché, car vous le savez: il existe même un snobisme de concierge.

Malgré mes travers, rappelez-vous que je n'ai pas hésité à défendre Dreyfus contre l'injustice qui l'accablait. S'il est vrai que la politique et l'art ne font pas bon ménage, faut-il préciser que l'amour de l'art pour l'art est d'un romantisme et d'une naïveté inqualifiable.

Il en va de même pour la philosophie en général et plus particulièrement pour celle de Bergson alias Bergotte. Lorsque vous connaissez l'homme, vous êtes en mesure d'évaluer l'écart entre l'écrit et la pratique. La philosophie idéaliste du docte Bergson est dogmatique. Pourtant, je ne vois dans ses écrits philosophiques que l'opinion d'un snob qui cache sa véritable nature derrière un vocabulaire ésotérique et excentrique, riche en concepts. Ici s'achève ma diatribe, parce que je déteste les procès d'intentions et les procès qui dissimulent le snobisme des uns sous le vocabulaire technique et scientifique des autres...

Marcel Proust


(http://www.dialogus2.org/PRO/votresoidisant.html)

J.M.
 
segunda-feira, maio 24, 2004
  O interesse da espécie
Assim como se diz que é o interesse da espécie que em amor guia as preferências de cada um, que, para que o filho seja constituído o mais normalmente possível, faz com que os homens gordos procurem as mulheres magras e os magros as gordas. (pag. 311)

J.M.
 
 
Censurava Balzac, que se espantava de ver admirado pelo seus sobrinhos, por ter pretendido pintar uma sociedade “onde não era recebido”, e acerca da qual contou mil e uma coisas inverosímeis. (pag. 307)

J.M.
 
  O fascínio dos contos de fadas
(contribuição para o interesse mediático de um casamento)
Porque um desejo parece-nos mais belo, agarramo-nos a ele com maior confiança, quando sabemos que fora de nós a realidade se lhe adequa, embora não seja realizável para nós. E pensamos com maior alegria numa vida em que – desde que afastemos por um instante do nosso pensamento o pequeno obstáculo acidental e específico que nos impede pessoalmente de o fazer – podemos imaginar-nos a satisfazê-lo.

nastenka-d
 
  Snobismos V
Le Proust de 1904 est un enfant gâté de trente-trois ans, volontiers geignard, malade qui ne veut pas guérir, qui dort le jour - exigeant de sa mère qu'elle respecte et fasse respecter son sommeil - , qui fréquente, la nuit, des amis encore plus insupportables que lui, les Montesquiou, les Anna de Noailles, avec lesquels il a constamment de petites querelles d'amour propre; et lorsqu'il sort enfin, c'est pour aller porter lui-même au Gaulois, à minuit, le compte rendu d'une réception mondaine qu'il a donnée dans la soirée. A l'arrière-plan de cette existence d'enfant gâté, se dessine le profil d'une mère à la fois admirable de dévouement et de délicatesse (d'Evian, elle reviendra, en train, mourir à Paris pour épargner à son fils le spectacle de son agonie), et responsable de cette vie apparemment gâchée. « Pour elle, dira à Proust la religieuse qui la veille, vous aviez quatre ans. »

Et pourtant, tout cela avait finalement un sens, ce snobisme, cette frivolité, cette vie artificielle, mais Proust seul, en 1904, savait lequel. On découvre peu à peu que cette vie se conformait, pour ainsi dire, à un modèle encore invisible, qui était celui de l'œuvre à venir. Comme s'il fallait patiemment accumuler les années de vie mondaine et creuse pour laisser le temps se perdre vraiment et pouvoir, un jour, le retrouver.

(http://www.magazine-litteraire.com/archives/ar_proust.htm)

J.M.
 
  Snobismos IV
… e podíamos perguntar se não haverá entre esses outros irmãos humildes, os camponeses, seres que são como que os homens superiores do mundo dos simples de espírito, ou, antes, seres que, condenados por um destino injusto a viver entre os simples de espírito, privados de luz mas, todavia, mais naturalmente, mais essencialmente aparentados com as naturezas de eleição do que a maioria das pessoas instruídas, são como que membros dispersos, transviados, privados de razão, da sagrada família, parentes, que ficaram, na infância, das mais altas inteligências, e aos quais – como se revela no clarão dos seus olhos, impossível de ignorar apesar de não se aplicar a nada - , para terem talento, faltou apenas saber. (pag 233)



(dessin de Nicolas Benthey, Le Livre des snobs du duc de Bedford)

J.M.
 
  Da supressão do desejo
Com isso pretendiam certamente mostrar apenas que, se havia coisas que elas não tinham – naquele caso, algumas das prerrogativas da velha senhora, e manter relações com ela –, era, não porque não pudessem, mas porque não queriam possuí-las. Mas tinham acabado por se convencer a si mesmas; e a supressão de todo o desejo, da curiosidade pelas formas de vida que não se conhecem, da esperança de agradar a novas pessoas, tudo isto substituído naquelas mulheres por um desdém simulado, por uma jovialidade artificial, é que tinha o inconveniente de lhes fazer colar ao desagrado o rótulo do contentamento, e de mentirem permanentemente a si mesmas, condições ambas para serem infelizes.

nastenka-d
 
  A pequena sociedade balnear (Balbec)
O notário, o juiz-presidente, o bastonário; as personalidades mais ou menos eminentes, seja na província, seja em Paris; os fidalgos; as discretas marquesas; todos, à sua maneira, contribuem para tornar o pequeno e fechado mundo de Balbec uma espécie de micro-clima onde as relações são ligeiramente diferentes das que se estabeleceriam caso estivessem rodeadas pelo ambiente do quotidiano (embora tenham também como base uma estrita separação entre círculos).
Balbec, Moledo, Miramar, Figueira... No tempo em que os Verões tinham mais ou menos três meses.
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domingo, maio 23, 2004
 
"Os nossos desejos vão interferindo uns com os outros e, na confusão da existência, é raro que uma alegria venha poisar sobre o desejo que a reclamara.

Troti
 
  O eu
“Ora ele já não é uma criança. Agora sabe bem aquilo de que gosta, é pouco provável que mude, e é capaz de ter consciência do que o fará feliz na vida.”
...
as palavras do meu pai nessa noite desgostaram-me muito...
...
ao falar dos meus gostos que não mais mudariam, do que estava destinado a tornar a minha vida feliz, insinuava em mim duas suspeitas terrívelmente dolorosas. A primeira era de que a minha vida tinha já começado ( quando todos os dias me considerava como que no limiar da minha vida ainda intacta, e que só começaria no dia seguinte de manhã), mais ainda, que o que se ia seguir não seria muito diferente do antecedente. A segunda suspeita, que a bem dizer não passava de outra forma da primeira, era de que não estava situado fora do Tempo, antes sujeito às suas leis, tal como aquelas personagens de romance que, por causa disso, me lançavam em tal tristeza quando lia as suas vidas, em Combray, ao fundo da minha guarita de verga. Teoricamente sabe-se que a Terra gira, mas de facto não damos por isso, o chão que pisamos parece que não se mexe e vivemos tranquilos. É o que se passa com o Tempo na vida...
...
Ao dizer a meu respeito: “Já não é uma criança, os seus gostos não vão mudar, etc...”. o meu pai acabava de repente de me revelar a mim mesmo dentro do Tempo..."



Troti
 
  A força das ideias
"...e veja-se então se na vida em comum vivida pelas ideias no seio do nosso espírito existirá uma só das que nos tornam mais felizes que não tenha começado por ir buscar a uma ideia alheia e próxima, como um verdadeiro parasita, o melhor da força que lhe faltava."


Troti
 
  Snobismos III
Cher Monsieur,

Qu'est-ce que vous pensez de ces gens qui vous attaquent à cause de votre soi-disant conservatisme? Ils vous prennent pour un réactionnaire, mais il me semble que les vrais réactionnaires soient eux. Pour moi il n'y a rien de plus ennuyant que la politique en littérature. C'est dommage pour eux, n'est-ce pas, qu'ils n'arrivent pas à s'arracher de la mesquinerie de leurs petits points-de-vue et leurs doctrines poussiéreuses pour découvrir ce qui est vraiment beau dans l'art. Si tout le monde était un peu plus «obsédé par soi-même» comme vous et consacrait sa vie à ses plaisirs au lieu de ses ennuis il y aurait beaucoup moins de problèmes dans ce monde. Grâce à vous, nous avons fait un pas sur le chemin de l'évolution.

Merci.


(http://www.dialogus2.org/PRO/votresoidisant.html)

J.M.
 
  Snobismos II
Não se poderia falar de pensamento a propósito de Françoise.

Não sabia nada, naquele sentido total em que nada saber equivale a nada compreender, excepto as raras verdades que o coração é capaz de atingir directamente.

O mundo imenso das ideias não existia para ela.

Mas, perante a claridade do seu olhar … ficávamos perturbados como diante do olhar inteligente e bom de um cão, a quem, porém, sabemos serem alheias todas as concepções dos homens…


(pag 233)

J.M.
 
  Snobismos I
Foi William Thackeray quem introduziu o termo snob numa série de reportagens imaginárias na revista Punch em 1846, depois compiladas no seu “The Book of Snobs”. Entrou na história o sine nobilitate como quem possui um respeito exagerado pela posição social ou pela riqueza e se envergonha de relações socialmente inferiores.

Matéria muito aprofundável com o Julian Sorel de Stendhal, com as heroínas de Balzac, com o Fradique de Eça, com as duquesas de Proust. Convém ter presente um bocadinho de Tocqueville e de como mesmo a democracia na América foi temperada pelo snobismo dos descendentes da velha Inglaterra, ou da aristocracia sulista.

(Mendo Castro Henriques, EURONOTÍCIAS, 18/Ago/2000)

J.M.
 
sábado, maio 22, 2004
  Françoise
Os proletários, embora só a custo viessem a ser tratados pela Françoise como pessoas conhecidas … em compensação eram, mal o conseguiam, as únicas pessoas que contavam para ela (pag. 276)

… achava a todo o instante que alguém estava “em falta” connosco, conclusão a que, aliás, era facilmente levada, tanto pelo seu amor excessivo por nós como pelo prazer que tinha em ser-nos desagradável. (pag. 279)

… a Françoise perdoou-lhe (à senhora de Villeparisis) o ser marquesa… (pag. 280)

J.M.
 
  Sobre a beleza (e sobre os livros)
E é assim que boceja antecipadamente de tédio um letrado a quem falam de um novo «belo livro», porque imagina uma espécie de composto de todos os belos livros que leu, ao passo que um belo livro é específico, imprevisível, e não feito da soma de todas as obras primas anteriores, mas de alguma coisa que o ter-se assimilado perfeitamente aquela soma não basta de modo algum para encontrar, porque está justamente fora dela.

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  Embriaguez
E, no entanto, a mim, a minha própria voz dava-me prazer, e também os movimentos mais insensíveis, mais íntimos, do meu corpo. Por isso tratava de os fazer durar, deixava que cada uma das minhas inflexões se demorasse longamente nas palavras, sentia que cada dos meus olhares se sentia bem onde estava poisado, ali permanecendo para além do tempo habitual.

A viagem ébria de Marcel faz-me pensar que todas as viagens são uma espécie de embriaguez. Por nos encontrarmos fora do Hábito, fora das rotinas do quotidiano; por nos entregarmos a horários diferentes, em espaços diferentes, sob uma luz diversa; tudo isso nos deixa um pouco fora do mundo, como se não estivéssemos a viver realmente, mas apenas sonhando.
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  L'Insupportable Proust


Snob, égoiste, homosexuel, névrosé: en un mot, le plus insupportable des êtres humains: tel était Marcel Proust. Mais aussi un génie. Un Anglais, George D. Painter, vient de lui consacrer dix-huit ans de sa vie. Il a consulté 350 ouvrages, enquêté pour retrouver chaque minute de son temps, chaque source de son oeuvre. Un roman policier autour d'une madeleine.

(Henri Godard, Magazine Littéraire nº 3, Jan/67)

J.M.
 
sexta-feira, maio 21, 2004
  Hipótese de trabalho
Marcel amava Gilberte pelo que esta simbolizava deste mundo, o mundo de Odette, de Swann. É uma sensação que vem já desde o início da sua relação; mas o final desta parte (que se chama, exactamente, Em torno da senhora Swann), dá-me essa quase certeza. Amando Gilberte, era a Odette que venerava.

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  Odette
... e a sua negra ou cinzenta aglomeração obediente, executando os movimentos quase mecânicos de uma moldura inerte em redor de Odette, fazia com que aquela mulher, que apenas nos olhos tinha intensidade, parecesse olhar em frente, por entre todos os homens, como de uma janela de que se tivesse abeirado, e fazia-a surgir, frágil, sem medo, na nudez das suas ternas cores, como a aparição de um ser de uma espécie diferente, de uma raça desconhecida e de um poderio quase guerreiro, graças ao qual compensava por si só a sua múltipla escolta.

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No entanto, um dia em que lhe dizia numa carta que tinha sabida da morte da nossa velha vendedora de chupa-chupas dos Campos Elísios, quando acabei de escrever estas palavras: «Pensei que a notícia a ia desgostar, em mim agitou muitas recordações», não pude deixar de me desfazer em lágrimas ao reparar que estava a falar no passado, e como se se tratasse de uma morte já esquecida, daquele amor no qual, sem querer, nunca deixara de pensar como estando vivo, como podendo, ao menos, renascer.

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  Sonhos
Num sonho os rostos das pessoas podem iludir-nos. Neles, a pessoa de quem gostamos deve ser reconhecida apenas pela força da dor sentida.

Há também quem advogue que, num sonho, não figura senão quem sonha, que cada personagem é o sonhador. O que acaba por ser apenas uma variação do que o próprio Marcel diz, quando admite a distância entre a Gilberte real e aquela que ele cria e ama, aquela cuja imagem encerra de forma permanente no seu coração.
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  Teaser (2)
Houve uma cena doméstica porque não acompanhei o meu pai a um jantar oficial onde deviam estar os Bontemps com a sua sobrinha Albertine, uma rapariguinha quase criança. Os diferentes períodos da nossa vida sobrepõem-se uns aos outros. Recusamo-nos desdenhosamente, por causa do que amamos e que um dia nos será tão indiferente, a ver aquilo que hoje nos é indiferente, que amanhã amaremos e que, se tivéssemos aceitado ver, talvez pudéssemos ter amado mais cedo, e que assim abreviaria os nossos sofrimentos actuais, é certo que para os substituir por outros.

Parece fácil, quando o lemos assim tão claro e explícito; quem recorda, quem vive retrospectivamente é capaz de pontuar a existência com reflexões pausadas e lúcidas – que de pouco ou nada serviriam a vida vivida no instante imediato.
Sim, sinto pesar por ver o amor por Gilberte já condenado, definhando (e cada um de nós saberá quão fácil é esquecer quando já não há amor, apenas indiferença); e sinto Albertine entrar lentamente (como antes também entrou Gilberte) na vida de Marcel: personagem que não é mais do que um nome, e que não está sequer ladeada por espinheiros cor-de-rosa.

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  Gustave Moreau (1826-1898) – “Jupiter and Semele” (detalhe)
...aquele homem, tão grande no meio dos outros tão pequenos, como aquele Júpiter a quem Gustave Moreau atribuiu, quando o pintou ao lado de uma frágil mortal, uma estatura mais que humana. (pag.285)



J.M.
 
  Françoise
a modéstia e honestidade que muitas vezes conferiam nobreza ao seu rosto; mulher reservada mas sem baixeza, que sabe pôr-se no seu lugar; vestira-se para a viagem para ficar digna de ser vista na nossa companhia sem querer parecer exibir-se (pag 233)

J.M.
 
quinta-feira, maio 20, 2004
  O que torna uma pessoa tão feliz é a presença no seu coração de algo de instável.
J.M.
 
 
A verdade que pomos nas palavras não abre caminho directamente, não é dotada de uma evidência irresistível.

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  El Greco
... (seu pai) deseja consagrar um dia a Toledo, porque é admirador de um discípulo de Ticiano de cujo nome não me recordo e que só lá se vê bem. (pag. 285)



(View of Toledo)

J.M.
 
 
Sentia-se que ela não se vestia apenas em função da comodidade ou do enfeite do seu corpo; andava envolvida na sua toilette como no aparato subtil e espiritualizado de uma civilização.

nastenka-d
 
  O espaço do amor
É certo que essas novas amizades por lugares e pessoas têm por detrás o esquecimento das antigas. (pag. 254)

A nossa capacidade de amar não é infinita. Por muito espaço que julguemos ter no coração, é sempre necessária uma gestão cuidadosa, para que todos os nossos amores sejam devidamente acarinhados.

J.M.
 
 


Nínive fue una de las ciudades más antiguas y las más importantes de la Asiria antigua. Se extiende aproximadamente un Km., sobre el Tigris frente a de la ciudad moderna de Mossoul, en el norte de Irak. Rodeada por tierras ricas y bien irrigadas, se situaba cerca de un vado sobre el Tigris muy frecuentado en la Antigüedad, lo que le permitía controlar las principales carreteras comerciales que iban en todas las direcciones.

La parte más antigua de la ciudad es el gran Tell de Kouyoundjik, de 40 Ha., que se construyó en la antigua confluencia del Tigris y el Khosr. Este tell absorbió, un Tell mas pequeñ: el Nebi Younous, (15 Ha. aproximadamente).

Nínive se desarrolló considerablemente bajo el reino de Sennachérib que hizo de ella la capital de su imperio, posición que conservará hasta su caída en 612 bajo los ataques de la coalición de medos y babilonios. Se descubrieron varios palacios durante las excavaciones: uno, al norte, construido por Asurbanipal, otro, al sur, residencia de Sennachérib.

Existen construcciones asignadas a Salmanasar I, Teglath-Phalazar I, Adad-nirari II, Assurnazirpal II o Tukulti-Ninurta II que certifican del papel jugado por la ciudad durante toda la dinastía. Según Estrabón , Nínive era mayor que Babilonia.

http://www.dearqueologia.com/relieve_asirio.htm


Troti
 
 


ESTELA ASIRIA: ASURBANIPAL EN UNA CACERÍA DE LEONES
DIMENSIONES: 110 X 65 cm.
CRONOLOGÍA: VII a. C.
RELIEVE
LOCALIZACIÓN: Museo Británico
PROCEDENCIA: Asiria (Palacio Norte de Nínive)



Troti
 
 

Dictionnaire de synonymes
règne Assurbanipal, ancienne Ninive
Paris, Louvre


Troti
 
  Assurbanipal e a Biblioteca de Ninive
"...fiquei tão maravilhosamente surpreendido como no dia em que li pela primeira vez, num livro de Maspero, que conhecemos exactamente a lista dos caçadores que Assurbanipal convidava para as suas batidas, dez séculos antes de Cristo."


Deuxième fils d'Asarhaddar, Assurbanipal est choisi par son père pour lui succéder à la tête de l'Empire, tandis que son frère aîné est placé sur le trône de Babylone récemment reconstruite. Sous son règne, l'Assyrie (située dans l'Irak actuel) devait connaître une ascension fulgurante, étendant ses frontières jusqu'à la Basse-Égypte et dans toute la vallée du « croissant fertile ».
Cependant, malgré des campagnes éclatantes, Assurbanipal s'intéresse moins à la guerre qu'aux lettres. Il quitte peu sa capitale, Ninive, et délègue le plus souvent le commandement de ses armées à son général en chef (le Tartanu). Monarque très cultivé, il s'attache à réunir dans sa bibliothèque le plus grand nombre d' oeuvres possibles.
...
Assurbanipal semble vouloir regrouper dans son palais la quasi-totalité de la production littéraire et scientifique existant dans son pays à son époque. Il se glorifie de connaître le sumérien et de copier lui-même de sa main, de revoir et de collationner des tablettes avant de les déposer dans la bibliothèque de son palais. Il prend soin de faire circuler dans tout le pays quantité d'informateurs, astrologues de métier, qui ont pour mission de scruter le ciel et de transmettre au Palais le résultat de leurs recherches.

http://classes.bnf.fr/dossitsm/b-assurb.htm




La bibliothèque de Ninive.
C’est la bibliothèque d’Assurbanipal (25 000 tablettes en écriture cunéiforme) qui propose autre chose que des écrits économiques. On retrouve la grande épopée de Gilgamesh.
Les tablettes retrouvées signalent surtout des pièces comptables puis d’autres contenus sont tracés : rituel d’exorcisme ou magie, hymnes religieux, mythologie. L’écriture joue encore le rôle d’aide mémoire d’une tradition orale.
...
La première bibliothèque institutionnelle est donc celle de Ninive en Assyrie. Lettré, sachant lui-même écrire, Assurbanipal voulut rassembler une collection d’ouvrages : ordres donnés pour faire parvenir les oeuvres, apparition des chasseurs de tablettes.
Cette bibliothèque a été retrouvée en 1850 : 25 à 35 000 tablettes, soit 2000 oeuvres. On y trouve des textes religieux, des actes administratifs, des listes de souverains et leurs hauts faits, des textes mathématiques, des traités de médecine, de divination. Ce qui est intéressant c’est qu’on y trouve déjà des listes, des catalogues qui servaient à faciliter la mémorisation des classements thématiques : par exemple sous la rubrique berger, on distinguer : berger, chef berger, bouvier, porcher, anier....Þ tableau logique, raisonné, global de tout un secteur de la réalité.
On a retrouvé un véritable tableau du monde sur 22 tablettes :
- arbres : variétés et parties utilisables
- objets fabriqués
- roseaux : variétés et objets de roseaux
- animaux domestiques et sauvages
- herbes, plantes et légumes
- montagnes
- cours d’eau et étoiles
- alimentation
- immense dictionnaire bilingue sumérien / Akkadien

C’est l’esquisse d’un tableau universel, mais est-ce l’ébauche d’un encyclopédisme ?

http://www.sha.univ-poitiers.fr/documentation/histoirebib.html

Troti

 
 
"As obras-primas não são tão frequentes como isso!"


Troti
 
 


Ver Meer, "La Vue de Delft"
("le plus beau tableau du monde," selon Proust)


Troti
 
 
“Podemos fazer tudo aos homens que nos amam, eles são tão idiotas.”


Troti
 
  Amor
"Quase toda a gente se admirou daquele casamento, e é isso que é de admirar. Não há dúvida de que poucas pessoas compreendem o carácter puramente subjectivo do fenómeno do amor, e a espécie de criação que é de uma pessoa suplementar, distinta da que usa o mesmo nome na sociedade, e cujos elementos são na sua maioria retirados de nós mesmos."

Troti
 
  Casamento
À sua maneira, que não é a que todos os maridos prefeririam – mas enfim, aqui entre nós, parece-me difícil que Swann, que a conhecia havia muito e está longe de ser um asno chapado, não soubesse aquilo com que tinha de contar -, é inegável que ela parece ter-lhe afeição. Não digo que ela não seja volúvel, e aí até o próprio Swann também não deixa os seus créditos por mãos alheias, a acreditar nas boas línguas que, como podem imaginar, trabalham depressa. Mas está-lhe reconhecida por tudo o que fez por ela, e, ao contrário dos receios que toda a gente sentia, parece que se tornou de uma doçura angélica.


Troti
 
quarta-feira, maio 19, 2004
 


August Renoir, Le Bouquet de Chrysanthèmes (1884)

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E também eu tinha de voltar para casa, antes de ter saboreado aqueles prazeres do Inverno, dos quais achara que os crisântemos eram um brilhante invólucro.

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  Podem ser apenas as violetas...
E, mais do que o livro, as flores viviam; as pessoas ficam embaraçadas quando entravam para visitar a senhora Swann e percebiam que ela não estava só, ou, quando entravam em casa com ela, não encontravam o salão vazio, de tal modo ali ocupavam um lugar enigmático e ligado a horas desconhecidas da vida da dona da casa aquelas flores que não haviam sido preparadas para os visitantes de Odette, mas como que esquecidas por ela, que tinham tido e teriam ainda com ela conversas particulares que os intrusos tinham medo de perturbar e cujo segredo em vão tentavam ler, fitando os olhos na cor deslavada, líquida, roxa e dissoluta das violetas-de-parma.

... mas este fragmento de texto faz-me entrar, mais do que no salão da senhora Swann, na sedução que ela prepara. Armadilhas para pássaros descuidados (ou apenas sensíveis...). Associado ao fragmento anterior, então, é como se abrisse diante dos meus olhos um tratado sobre a sedução; primeiro o amor e agora a sedução, como faces (díspares?) da mesma moeda.
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  Seduzir
Uma grande cocotte, como ela fora, vive muito para os seus amantes, isto é, em casa, o que pode levá-la a vivê-la para si mesma. As coisas que se vêem em casa de uma mulher honesta e que certamente também a ela podem parecer importantes são, em todo o caso, as que para a cocotte o são mais. O ponto culminante do seu dia é, não aquele em que se veste para a sociedade, mas aquele em que se despe para um homem. Precisa de estar tão elegante de roupão, ou de camisa de dormir, como numa toilette de sair. Outras mulheres mostram as suas jóias, mas ela vive na intimidade das suas pérolas. Este género de vida impõe a obrigação, e acaba por gerar o gosto, de um luxo secreto, isto é, quase desinteressado.

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  O Amor e o Hábito IV
É habitualmente com o nosso ser reduzido ao mínimo que vivemos, a maior parte das nossas faculdades permanece adormecida porque elas assentam no hábito que sabe o que há a fazer e não precisa delas. (pag. 239)

A minha razão sabia que o hábito se encarrega também de nos tornar caros os companheiros que de início nos haviam desagradado, de dar outra forma aos rostos, de tornar simpático o som de uma voz, de modificar a inclinação dos corações. (pag. 254)

J.M.
 
  O Amor e o Hábito III
A minha viagem a Balbec foi como que a primeira saída de um convalescente que só esperava por ela para perceber que estava curado.(pag. 227)

Balbec constituiu a mudança de hábito necessária para o corte com os pensamentos de amor por Gilberte. Foi o início de um novo processo de habituação e da descoberta de novos focos de amor.

Havia anos que em cada dia eu decalcava como podia o meu estado de alma do estado de alma da véspera. (...) Casos há em que, como a sedentariedade imobiliza os dias, o melhor meio de ganhar tempo é mudar de lugar. (pag. 227)

J.M.
 
  O Amor e o Hábito II
À plena luz de memória habitual, as imagens do passado empalidecem a pouco e pouco, apagam-se, já nada resta delas, já não reencontramos esse passado. Ou, antes, já não o encontraríamos se algumas palavras não tivessem sido cuidadosamente encerradas no olvido. (pag. 226)

J.M.
 
  O Amor e o Hábito I
As lembranças de amor também se regem pelas leis do hábito. O hábito esfuma, enfraquece, encerra as memórias no fundo de nós. É apenas graças ao olvido (= estado de uma pessoa ou coisa esquecida) que podemos, por vezes, reencontrar o ser que fomos, aquele ser que via uma razão naquilo que hoje nos é indiferente.

Por isso é que a melhor parte da nossa memória está fora de nós, numa aragem pluviosa, num cheiro de quarto fechado ou no cheiro de uma primeira labareda, em toda a parte onde encontramos de nós mesmos o que a nossa inteligência, por não o utilizar, pusera de lado, a última reserva do passado, a melhor, aquela que, quando todas as nossas lágrimas parecem esgotadas, nos sabe ainda fazer chorar. (pag. 226)

J.M.
 
terça-feira, maio 18, 2004
  Pior que a dor, a indiferença
Quando, enfim, conseguimos vencer a dor da ausência, através da conquista de uma certa indiferença, chegamos à conclusão que só gostaríamos de poder voltar atrás pois, bem pior que sofrer por amar, será sofrer por não amar.

E o temor de um futuro do qual nos serão arrebatados a vista e a convivência daqueles que amamos, das quais hoje retiramos a nossa mais cara alegria, esse temor, longe de dissipar-se, aumenta, se à dor de tal privação pensamos que irá juntar-se o que actualmente nos parece mais cruel ainda: não a sentir como uma dor, ficar-lhe indiferente.

J.M.
 
  Amar es suficiente compensación
"Yo no sé si Madame de Sévigné quería perdurar a través de sus escritos -por los autores que cita y el esmero con que describe situaciones y sentimientos, se intuye que era una mujer leída y digna de ser leída-, como tampoco sé si esperaba réplica a las apasionadas cartas que escribió a su hija "escribo aunque no tengo ninguna carta que contestar".

Hay personas que nunca esperan de quien aman: amar ya es suficiente compensación.

Aún así, imagino al más altruista ansiar -como el rey Lear de su hija Cordelia- un solo te amo que le impulse a seguir amando, a seguir vivo.

Las cartas -como los sueños- son señales de vida."

(http://www.bkbono.com/cartashija-05.htm)

J.M.
 
  Madame de Sévigné (1626-1696)


Marie de Rabutin-Chantal, marquise de Sévigné, se consacre à 25 ans à ses enfants, après la mort de son mari en duel. Au départ de sa fille, Mme de Grignan, en 1671 pour la Provence, elle lui écrira pendant 25 ans; sa correspondance nous apporte avec verve et simplicité ses commentaires sur tous les événements contemporains du “Grand Règne”. Cette femme de lettres aux yeux brillants, enjouée à la limite de l’exubérance, spirituelle et imaginative, est aussi bienveillante et d’une grande rigueur morale.

(http://francetimbres.chez.tiscali.fr/CH04/T9612.html)

J.M.
 
segunda-feira, maio 17, 2004
  A resignação, modalidade do hábito, permite que certas forças aumentem indefinidamente.
(pag. 201)

J.M.
 
  Botticelli - Madonna del Magnificat (1480-81)
Às vezes, à noite, quando estava fatigada, ele (Swann) fazia-me notar em voz baixa como ela (senhora Swann) imprimia sem dar por isso às suas mãos pensativas o movimento leve, um pouco atormentado, da Virgem que mergulha a pena no tinteiro que o anjo lhe estende, antes de escrever no livro sagrado onde está já traçada a palavra Magnificat. (pag. 197)



Una de las obras más famosas de Botticelli, realizada para algún importante cliente florentino. La gran cantidad de pan de oro empleada indica la riqueza de este cliente anónimo.

Los cuadros circulares reciben el nombre de tondos, siendo muy populares en la Italia del Renacimiento, sobre todo para decorar palacios o edificios gremiales.

La Virgen se curva para formar un semicírculo en sintonía con el marco, de la misma manera que el ángel que protege a los dos que sujetan el libro agacha su cabeza; en los laterales hay dos nuevos ángeles que incluso se muestran cortados; al fondo, un paisaje deudor de las influencias de la pintura flamenca; un arco de medio punto sirve de marco arquitectónico al conjunto; los personajes están sabiamente modelados gracias a la luz.

La delicadeza de los detalles y la minuciosidad que aporta Botticelli indican su aprendizaje como orfebre en su etapa juvenil, manteniendo un cierto rasgo de goticismo en un conjunto que respira equilibrio y belleza clásica por todas partes.

(http://www.artehistoria.com/genios/cuadros/4606.htm)

J.M.
 
 
Chorava mas encontrava a coragem e experimentava a doçura de sacrificar a felicidade de estar ao pé dela à possibilidade de lhe parecer agradável um dia, um dia em que, ai de mim, agradar-lhe me seria indiferente. (pag. 193)

J.M.
 
  A elasticidade do tempo
O tempo de que dispomos em cada dia é elástico; as paixões que sentimos dilatam-no, as que inspiramos encolhem-no, e o hábito enche-o. (pag. 191)

J.M.
 
sábado, maio 15, 2004
  Alexandre Graham Bell (1847-1922)
A cunhada de uma amiga minha tem telefone em casa!
Pode fazer uma encomenda a um fornecedor sem sair de casa!
Acho que não gostava de ter um telefone em casa.



1 - Telefone de caixa de Bell (1877)
2 - Telefone da Columbia Telephone Manufacturing (1894)
3 - Telefone de escrivaninha produzido pela Western Electric para a Companhia do Telefone de Bell (1895)
4 - Telefone com marcador de disco
5 - Telefone fixo, com marcador de teclas

(http://www.ucv.mct.pt/projectos/inventions2003/eca.asp)

6 - Telemóvel assim, telemóvel assado, telemóvel que cozinha, telemóvel que apita, telemóvel que vai às compras, telemóvel que limpa o chão, telemóvel que continua a discutir por nós, telemóvel que precisa de tomar banho, telemóvel que quer festinhas, telemóvel multiusos, multifunções, multioraioqueparta.

J.M.
 
  Quando se ama, o amor é grande de mais para se poder conter inteiramente em nós
irradia para a pessoa amada, encontra nela uma superfície que o detém, que o força a voltar ao seu ponto de partida, e é a esse choque no regresso da nossa própria ternura que chamamos os sentimentos do outro e que nos encanta mais que à ida, porque não reconhecemos que ela vem de nós. (pag. 188)

J.M.
 
  Ao menos não tem ratos?
Não tem medo, Odette, de morar neste bairro perdido? Ao menos não tem ratos? Ainda bem, tinham-me dito que sim. Fico muito contente por saber que não é verdade, porque tenho um medo pânico de ratos e não voltaria a sua casa.
J.M.
 
  Artes do Nada
E secretamente invejava à senhora Verdurin aquelas artes a que a Patroa atribuía tanta importância, apesar de apenas colorirem o inexistente, esculpirem o vazio, e serem, propriamente, as Artes do Nada: a arte de saber “reunir”, de ser entendida em “agrupar”, de “pôr em evidência”, de “se apagar”, de servir de “traço de união”.
J.M.
 
  Para tornar a realidade suportável, somos todos obrigados a alimentar em nós algumas pequenas loucuras.
J.M.
 
  A constante visão dessa felicidade imaginária ajudava-me a suportar a destruição da felicidade real.
J.M.
 
 


O Pai


"O meu pai tinha pelo meu género de inteligência um desprezo suficientemente corrigido pela ternura para que, ao fim e ao cabo, a sua posição acerca de tudo o que eu fazia fosse uma indulgência cega."




A mãe

"A minha mãe não pareceu muito satisfeita com o facto de o meu pai ter deixado de pensar na “carreira” para mim. Acho que, desejosa antes de mais nada de que uma regra de vida me disciplinasse os caprichos dos nervos, o que ela lamentava não era tanto ver-me renunciar à diplomacia como o ver-me entregue à literatura."





Marcel

"Apenas discerni que repetir o que toda a gente pensava não era em política um sinal de inferioridade, mas de superioridade."


Troti
 
  Desilusão e raiva
“Ora bem! Eu nunca acreditaria, mas o velho Norpois não vai nada contra a ideia de fazeres literatura”, dissera-me o meu pai....Escreve alguma coisa como-deve-ser, que lhe possas mostrar...
...
Depois de algumas páginas preliminares, com o tédio a fazer-me cair a pena das mãos, chorava de raiva pensando que nunca teria talento, que não era dotado...
...
Até aqui apenas havia verificado que não tinha o dom de escrever; agora o senhor de Norpois tirava-me até tal desejo. Quis explicar-lhe o que tinha sonhado; a tremer de emoção, queria que todas as minhas palavras fossem escrupulosamente o equivalente mais sincero possível do que sentira e nunca tentara formular para mim mesmo; o mesmo é dizer que as minhas palavras não tiveram qualquer clareza.
...
Aterrado pelo que o senhor de Norpois acabava de me dizer acerca do fragmento que eu lhe apresentara, e pensando por outro lado nas dificuldades que experimentava quando queria escrever um ensaio ou apenas entregar-me a reflexões sérias, senti mais uma vez a minha nulidade intelectual, e que não nascera para a literatura.
...
Sentia-me consternado, reduzido; e o meu espírito, tal como um fluido que só tem como dimensões as do vaso que lhe fornecem, do mesmo modo que em tempos se dilatara até preencher as capacidades imensas do génio, estava agora contraído e cabia inteiro na mediocridade estreita onde o senhor de Norpois subitamente o fechara e restringira.”



Troti
 
sexta-feira, maio 14, 2004
 
« Notre caractère et notre corps sont si liés qu’ils participent à la même infortune »

Essais et articles
Marcel Proust


Troti
 
  Proust et les médecins
Le moins que l’on puisse dire est que Proust et le narrateur ne tiennent pas les médecins en haute estime. Le professeur Cottard, son médecin imaginé, est célèbre, mondain, avec des préjugés diagnostiques : « Il vous trouvera une dilatation d’estomac sans vous examiner, puisqu’il l’a d’avance dans l’œil. Vous pouvez la voir : elle se reflète dans son lorgnon. »
Il renonce à « son jour de salon », « non pas pour un ouvrier qui a une attaque, mais pour un ministre qui a un coryza ». Lors d’une réception, une servante s’est coupé une veine du bras et saigne abondamment ; « Je ne peux pas m’en occuper » dit Cottard « j’ai mis mon gilet blanc. »
Proust, déçu sans doute par l’échec du traitement de son asthme, critique la médecine et les médecins. Dans « Du côté de chez Swan », Cottard pose chez le jeune asthmatique les diagnostics les plus variés : spasmes nerveux, début de tuberculose, bronchite chronique, dyspnée toxi-alimentaire avec insuffisance rénale, et recommande des purgatifs drastiques et du lait, du lait …
La médecine est, pour Proust « un compendium des erreurs successives et des contradictions des médecins. En appelant à soi les meilleurs d’entre eux, on a une grande chance d’imposer une vérité qui sera reconnue fausse quelques années plus tard… »
La nature, ajoute-t-il, ne semble capable que de donner des maladies assez courtes, mais le médecin s’est annexé l’art de les prolonger. Les remèdes, la rémission qu’ils procurent, le malaise que leur interruption fait renaître, composent un simulacre de maladie que l’habitude du patient finit par stabiliser. Pour bien survivre, conclut-il, il faut être un « un bien portant imaginaire. »

http://www.md.ucl.ac.be/ama-ucl/cathedraledepapier29.htm

Troti


 
  A cena da Berma
« Só a ideia de que iam deixar-me ir ver a Berma me distraía...gostaria de ouvir a grande actriz apenas num daqueles papéis clássicos...em que ela atingia o sublime. A Berma...na “Fedra”, fazia parte daquelas coisas famosas que a minha imaginação tanto desejara.
...
O médico que me tratava...desaconselhou os meus pais a deixarem-me ir ao teatro; iria voltar doente...e no fim de contas teria mais sofrimento que prazer. Esse receio poderia ter-me detido se o que eu esperava daquela representação fosse apenas um prazer que ao fim e ao cabo, por compensação, pode ser anulado por um sofrimento posterior. Mas...o que eu pedia àquela matinée era uma coisa muito diferente de um prazer: verdades pertencentes a um mundo mais real que aquele em que vivia, e cuja aquisição, uma vez feita, me não poderia ser arrebatada por incidentes insignificantes, ainda que dolorosos para o meu corpo, da minha existência ociosa.
...
Dirigia súplicas aos meus pais, que , desde a visita do médico, já não queriam autorizar-me a ir à “Fedra”.
...
quando essa ida ao teatro, até aí proibida, passou a depender só de mim, então, pela primeira vez, já não tendo de tratar de que ela deixasse de ser impossível, perguntei a mim mesmo se seria desejável, se outras razões para além da proibição dos meus pais me não deveriam levar a renunciar a ela.
...
aquela obrigação de ter prazer parecia-me muito pesada.
...
Colocava num dos pratos da balança “sentir a minha mãe triste, arriscar-me a não ir aos Campos Elísios” e no outro “palidez jansenista, mito solar”
...
a pouco e pouco, as minhas hesitações tornavam-se tão dolorosas que, se tivesse agora optado pelo teatro, teria sido apenas para acabar com elas e delas me libertar de uma vez para sempre. Teria sido para abreviar o sofrimento, e já não na esperança de um proveito intectual...
...
Infelizmente aquela primeira matinée foi uma grande decepção...
...
Nem por isso deixei de sentir, depois de cair o pano, um desapontamento por aquele prazer que eu tanto desejara não ter sido maior...”


Este episódio da Berma mostra-nos de uma forma clara aspectos que Marcel Proust realça na sua personagem: a expectativa de exaltação dos sentidos, o conflito interior de ideias, a introspecção levada ao limite.


Troti
 
 


La tragédienne Sarah Bernhardt, modèle pour la Berma.


Troti
 
  Aforismos
III


As modas mudam, visto que elas próprias nascem da necessidade de mudança.


À Sombra das Raparigas em Flor, pp.9



Leitora
 
  Aforismos
II


Pode-se ser iletrado, ou fazer trocadilhos estúpidos, sem deixar de possuir um dom especial, que nenhuma cultura reral substitui, como é o dom do grande estratega ou do grande clínico.


À Sombra das Raparigas em Flor, pp.9



Leitora
 
  Aforismos
I


A ideia que durante muito tempo formámos de uma pessoa veda-nos os olhos e os ouvidos.


À Sombra das Raparigas em Flor, pp.9



Leitora
 
  como acreditava que o meu sofrimento não duraria para sempre, era obrigado a renová-lo incessantemente
J.M.
 
  a minha solidão era uma vida de salão mental
J.M.
 
  Eu nunca vou contar nada.
É a frase ritual da gente da sociedade, com a qual o maledicente é sempre enganosamente tranquilizado.
J.M.
 
  Três quartos do mal das pessoas inteligentes provêm da sua inteligência.
J.M.
 
  Bergotte
As longuíssimas considerações acerca de Bergotte são um verdadeiro suplício. Só apreciei o nariz em forma de caracol.

J.M.
 
 
Os príncipes sabem-se príncipes, não são snobs e julgam-se aliás tão acima do que não é do seu sangue que grandes senhores e burgueses, abaixo deles, lhes parecem quase ao mesmo nível.
J.M.
 
  Ser amigo do conde de Paris não quer dizer nada.
J.M.
 
  porque os homens, como não mudam de um dia para o outro, procuram num novo regime a continuação do antigo
J.M.
 
  Teaser
– É tio de uma pequena que frequentava o meu colégio, numa classe muito abaixo da minha, a famosa “Albertine”. De certeza que há-de vir a ser muito ‘fast’, mas por enquanto tem um aspecto engraçado.

nastenka-d
 
  Caleidoscópio, ou o implacável conservadorismo das modas
O que não impede que, de cada vez que a sociedade está momentaneamente imóvel, os que nela vivem imaginem que nunca mais terá lugar qualquer mudança, do mesmo modo que, tendo assistido aos começos do telefone, não querem acreditar no aeroplano.

nastenka-d
 
quinta-feira, maio 13, 2004
  As regras dos salões: segunda
Esforçar-se por considerar agradável qualquer pessoa incluída, mesmo que sem direito a tal, no círculo partilhado.

Claro que entre os Guermantes, ao contrário do que se passa com três quartos dos meios mundanos, havia gosto, um gosto requintado até, mas também havia snobismo, onde tinha origem a possibilidade de uma interrupção involuntária do gosto.

Esforçava-se por discernir e por gostar nelas das qualidades que todo o ser humano revela, se o examinarmos com uma prevenção favorável e não com o fastio da gente delicada.


nastenka-d
 
  As regras dos salões: primeira
Expressar-se sempre no sentido contrário ao dos desejos; ou pelo menos não os expressar de modo vivo.

... assim o senhor de Norpois, que sabia que nada era menos precioso nem mais fácil que ser recomendado à senhora Swann e apresentado em sua casa, e que viu que para mim, pelo contrário, isso tinha tanto valor, e por consequência, sem dúvida, grande dificuldade, pensou que o desejo, aparentemente normal, que eu exprimira devia ocultar algum pensamento diferente, algum objectivo suspeito, uma qualquer falta anterior, razão pela qual, com a certeza de desagradar à senhora Swann, ninguém tinha querido até então encarregar-se de lhe transmitir um recado da minha parte.

nastenka-d
 
quarta-feira, maio 12, 2004
  O amor (14)
Por só ter podido amar em tempos sucessivos tudo o que aquela sonata me trazia, nunca a possuí por inteiro: assemelhava-se à vida.

nastenka-d
 
  O amor (13)
Então ela, diante da qual passávamos todos os dias sem saber, e que se tinha resguardado, que exclusivamente pelo poder da sua beleza se tornara invisível e permanecera desconhecida, é a última a vir até nós. Mas também nós seremos os últimos a deixá-la. E iremos amá-la mais longamente do que os outros, porque teremos levado mais tempo a amá-la.

nastenka-d
 
  O amor (12)
Provavelmente o que falta, da primeira vez, não é a compreensão, mas a memória.

nastenka-d
 
  O amor (11)
... essas represálias já não lhe interessavam, com o amor desaparecera o desejo de mostrar que já não sentia amor.

nastenka-d
 
  O amor (10): o que o amor nos faz a nós
... essa angústia interpunha entre Swann e a mulher que amava um amontoado refractário de suspeitas anteriores, que tinham a sua causa em Odette, ou talvez noutra qualquer que antecedera Odette, e que já não permitiam que o envelhecido apaixonado conhecesse a sua amante de hoje a não ser através do fantasma antigo e colectivo da «mulher que despertava os seus ciúmes», no qual incarnava arbitrariamente o seu novo amor.

nastenka-d
 
  O amor (9)
... porque Swann amava outra mulher, uma mulher que não lhe dava motivos de ciúme, mas de quem contudo tinha ciúmes, porque já não era capaz de renovar a sua forma de amar e era a que usara para Odette que lhe servia ainda para outra.

nastenka-d
 
  O amor (8): o que o tempo faz ao amor
Depois, até essa curiosidade desaparecera, porque o seu eu antigo, chegado à extrema decrepitude, agia ainda mais maquinalmente, em conformidade com preocupações abolidas, a tal ponto que Swann já nem sequer conseguia imaginar aquela angústia, que porém era dantes tão forte que não era capaz de pensar então que alguma vez se libertaria dela, e que só a morte daquela que amava (...) lhe parecia capaz de abrir a estrada da sua vida, completamente barrada.

nastenka-d
 
  O amor (7)
Dir-se-ia que só aquele dia e aquela hora haviam fixado algumas últimas parcelas da personalidade amorosa que Swann tivera noutros tempos, e que só ali as reencontrava.

nastenka-d
 
  O amor (6)
Mas, justamente, o problema tão interessante que apenas esperava pelo fim dos seus ciúmes para ser elucidado perdera todo o seu interesse aos olhos de Swann quando deixara de ter ciúmes.

nastenka-d
 
  O amor (5): o(s) objecto(s)
Porque não era a beleza intrínseca das coisas que me tornava miraculoso o facto de estar no gabinete de Swann, era a aderência a essas mesmas coisas – que poderiam ser as mais feias do mundo – da sensação especial, triste e voluptuosa, que nele localizava havia tantos anos e que o impregnava ainda; do mesmo modo, a imensa quantidade dos espelhos, das escovas de prata, dos altares a Santo António de Pádua esculpidos e pintados pelos maiores artistas, seus amigos, nada tinha a ver com a sensação da minha indignidade e da sua benevolência régia que me era inspirada quando a senhora Swann me recebia por um momento no seu quarto, onde três belas e imponentes criaturas, a primeira, a segunda e a terceira criadas de quarto, lhe preparavam sorrindo toillettes maravilhosas – quarto para onde, cumprindo a ordem proferida pelo lacaio de calção de que a senhora me queria dar uma palavra, eu me dirigia pelo atalho sinuoso de um corredor todo perfumado a distância pelas essências preciosas que incessantemente exalavam do toucador os seus eflúvios odoríferos.

nastenka-d
 
  O amor (4)
... esses obstáculos permanecem misteriosos mas são temporários. Só que geralmente duram mais do que o amor. E como este não é uma paixão desinteressada, o apaixonado que deixa de amar não procura saber porque é que a mulher pobre e leviana que amava se recusou durante anos a que ele continuasse a sustentá-la.

nastenka-d
 
  J'accuse!
Alfred Dreyfus, né en 1859, officier juif d'origine alsacienne, accusé d'espionnage, condamné en 1894 et déporté; son procès sera annulé en 1899 et il sera recondamné puis grâcié la même année. Justice lui sera enfin rendue avec la cassation du jugement en 1906 et sa nomination au grade de Chevalier de la Légion d'honneur! Le célèbre article de Zola, de 1898, y fut pour beaucoup.



«Je n'ai pas voulu que mon pays restât dans le mensonge et dans l'injustice.»
«Un jour, la France me remerciera d'avoir aidé à sauver son honneur.»
(Déclarations d'Émile Zola au jury lors de son procès)



(http://pages.globetrotter.net/pcbcr/zola.html#dreyfus)

J.M.
 
  "Je n'ai qu'une passion, celle de la lumière"


Je n'ai qu'une passion, celle de la lumière, au nom de l'humanité
qui a tant souffert et qui a droit au bonheur.

J'accuse...J'accuse...J'accuse...J'accuse...J'accuse...


(La lettre d'Émile Zola à Félix Faure, Président de la République, le 13 janvier 1898)

J.M.
 
  O amor (3)
Também talvez essa actividade de todos os sentidos ao mesmo tempo, e que tenta conhecer só com os olhares o que está acima deles, seja demasiado indulgente para as mil e uma formas, para todos os sabores, para os movimentos da pessoa viva que habitualmente, quando não amamos, tornamos imóveis. O modelo amado, pelo contrário, mexe-se, dele temos sempre e apenas fotografias falhadas.

nastenka-d
 
  O amor (2)
E, além disso, a ela amava-a, e por consequência não podia vê-la sem aquela perturbação, sem aquele desejo de alguma coisa mais, que rouba, junto do ser amado, a sensação de amar.
Mas o que é o amor? O que é esta sensação de amar?
Hoje dedicarei o dia a compilar arbitrariamente expressões, descrições, fragmentos. Não constituirão nenhum tratado definitivo, nem qualquer espécie de código¸será um amor que elege diversos objectos, uma mulher, uma jovem, uma sonata. Amar é a eterna inocência/ e a única inocência é não pensar?
Veremos.
nastenka-d
 
terça-feira, maio 11, 2004
  Imaginação da alegria e do desespero
“O modo pesquisador, ansioso, exigente, como olhamos a pessoa que amamos, a nossa espera da palavra que nos dará ou nos tirará a esperança de um encontro no dia seguinte, e, até que tal palavra seja pronunciada, a nossa imaginação alternada, senão simultânea, da alegria e do desespero, tudo isso torna a nossa atenção perante o ser amado demasiado tremente para que possa obter dele uma imagem bem nítida.”

J.M.
 
  O amor
Marcel desarma-nos com a forma como descreve o seu amor por Gilberte, a forma como este o cega e paralisa face ao objecto das suas atenções. A maneira como se expõe aos olhares alheios, ainda que temperada pela distância, é a de alguém que não teme (ainda?) o juízo dos que o rodeiam, essa espécie de ridículo que o sentimento por vezes acarreta: ridículo invísivel e imperceptível para os que nele habitam e óbvio para todos os que dele estão excluídos, e que acaba por não ser mais do que uma entrega total e exclusiva ao que se sente - implicando nessa exclusão por vezes o próprio objecto do amor. As reflexões maduras que a memória desses dias lhe suscita são como que uma defesa face à consciência, mas não escondem aquilo que lhe é fundamental: um sentimento enorme, imenso, descomedido, irracional: sem pensamento.

nastenka-d
 
segunda-feira, maio 10, 2004
  A fruição, Barthes
Roland Barthes propõe a possibilidade de muitas leituras. Cada texto pode ser lido de diferentes maneiras, inclusive do modo como pretende o autor. Quem escreve está comprometido com as intenções de sua escrita . Para se fazer um texto de humor, por exemplo, o escritor tem que querer um texto de humor, tem que tentar encontrar, através de seu texto, o leitor de texto de humor.

A leitura de cada texto está relacionada aos vínculos que se estabelece entre significado e significante. É somente na medida em que podemos perceber essa relação é que podemos compreender as possibilidades de leituras. Produção e leitura são dois lados da mesma moeda, são faces que se completam.

Também é possível relacionar a noção de produção de sentido com a noção de fruição, de espaço de fruição . A produção de sentido é o processo de investimento de sentido nas matérias significantes com a intenção de realização textual, isto é, de disponibilizar uma mensagem. A relação entre produção e recepção textual contém, ela mesma, a fruição de texto. Em outras palavras, a fruição é a possibilidade de interpretação (entendimento e gozo) de um texto, sendo que essa possibilidade está no texto, articulada a partir do processo de produção de sentido, de produção do potencial de fruição . Os processos de produção e recepção discursivos tratam de revelar, através de marcas textuais, quais as possibilidades de articulações das matérias significantes no texto.

Nesse processo dual de produção e leitura, há sempre as duas possibilidades de análise: a análise do processo de produção e a análise das possibilidades de leitura.


Adriana Kowarick, COMUNICAÇÃO PUBLICITÁRIA: PRODUÇÃO DE SENTIDO, LINGUAGEM E CRIAÇÃO

http://www.intexto.ufrgs.br/n8/a-n8a3.html

nastenka-d
 
  O prazer, o gozo, Barthes
União. Sonho de total união com o ser amado.

1. Nominação da total união: é o "prazer simples e único", "a alegria sem mácula e sem mistura, a perfeição dos sonhos, a realização de todas as esperanças", "a magnificência divina", é: o repouso comum. Ou ainda a plena satisfação da propriedade; eu sonho que gozamos um do outro segundo uma apropriação absoluta; é a união fruitiva, a fruição do amor (palavra pedante? com sua fricção inicial e seu burburinho de vogais, o gozo falado assim fica acrescido de uma volúpia oral; ao dizer, gozo essa união na boca).

Extraído de Roland Barthes, Fragmentos de um discurso amoroso, Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1981, 2ª edição, traduzido do francês por Hortênsia dos Santos.


http://www1.uol.com.br/bienal/24bienal/nuh/frag_barthes.htm

nastenka-d
 
domingo, maio 09, 2004
  O prazer e o gozo
Mas – tal como à viagem a Balbec ou à viagem da Veneza que tanto desejara – o que eu pedia àquela matinée era coisa muito diferente de um prazer: verdades pertencentes a um mundo mais real que aquele em que vivia, e cuja aquisição, uma vez feita, me não poderia ser arrebatada porincidentes insignificantes, ainda que dolororos para o meu corpo, da minha existência ociosa. Quando muito, o prazer que teria durante o espectáculo surgia-me como a forma porventura necessária da percepção de tais verdades; e era o suficiente para eu desejar que as maleitas vaticinadas apenas começassem depois de terminada a representação, para que esse prazer não fosse comprometido e falseado por elas.
Aqui Marcel parece distinguir entre estas duas formas de prazer: uma mais superficial (mais sensível, dir-se-ia), outra profunda, como que se aproximando de uma espécie de êxtase místico. Poderá tratar-se de um exagero da minha parte, mas parece-me que a natureza de Marcel se inclina para tais expectativas. Desejar a verdade, o eterno – e não a efemeridade; procurar no Belo, na Arte (assim mesmo, com maiúscula), aquilo que lhe escapa no quotidiano (em Gilberte?). E, se logo que lhe é permitido assistir à representação, ele se pergunta se seria desejável, se outras razões para além da proibição dos meus pais me não deveriam levar a renunciar a ela, é talvez porque receia que o prazer realizado – o prazer sensível – não possa de alguma forma competir com a Beleza imaginada, com a antecipação do êxtase – porque esse depende de cada um de nós.
nastenka-d
 
sexta-feira, maio 07, 2004
  Caderneta de Cromos
Lembram-se de coleccionar cromos? Era uma emoção, apreciar os mais raros e melhores espécimens…

Pois este livro parece reunir um conjunto extraordinário de cromos, onde eu destaco a delícia que é a Françoise, que “só via por toda a parte “ciúmes” e “bisbilhotices” que desempenhavam na sua imaginação o mesmo papel permanente e funesto que, para outras pessoas, era desempenhado pelas intrigas dos jesuítas ou dos judeus.”

Não consigo ficar insensível à enorme capacidade que Proust revela para a observação do ser humano. A minúcia das descrições deste rol de cromos proustianos é, para mim, tudo menos entediante.

J.M.
 
  Banda Desenhada
EXTRAIT : DE A LA RECHERCHE DU TEMPS PERDU Du côté de chez Swann Adaptation et dessins de Stéphane Heuet Editions Delcourt










Et tout d'un coup le souvenir m'est apparu.


Leitora
 
quinta-feira, maio 06, 2004
  La Maison de tante Léonie-Musée Marcel Proust
qui a été aménagée en 1954 par Ph.-L. Larcher, a pour cadre la maison de Jules et Elisabeth Amiot, oncle et tante paternelle du futur écrivain. L'enfant y passait ses vacances, entre six et neuf ans, et il dut y renoncer à cause de ses crises d'asthme. Dans le roman, c'est là que tante Léonie offre rituellement au héros la Petite Madeleine qui bien des années après, fait renaître tout Combray. La maison, avec son jardin fleuri, sa pittoresque cuisine, son salon oriental, les chambres de Marcel et de tante Léonie, les chambres Weil, ainsi que le musée et la salle Nadar, rassemble tous les souvenirs liés à l'écrivain. Sa visite est à compléter par celle du Pré Catelan, jardin exotique créé par Jules Amiot, et devenu, sous la plume de l'écrivain, le parc de Tansonville.


Chambre de Marcel Proust, maison de Tante Léonie, à Illiers-Combray


Jardin de la maison de Tante Léonie, à Illiers-Combray



Leitora
 
  Société des Amis de Marcel Proust et des Amis de Combray
La Société des Amis de Marcel Proust et des Amis de Combray, créée en 1947, a pour but de réunir les lecteurs de Proust et de promouvoir l'œuvre de ce dernier. Elle a pour président Jean-Pierre Angremy, de l'Académie française, et pour secrétaire générale Mireille Naturel, maître de conférences à Paris 3-Sorbonne nouvelle. Son siège est la Maison de tante Léonie, à Illiers-Combray, et ses services administratifs sont installés au 6, rue du Docteur Proust, grâce au Conseil général d'Eure-et-Loir. C'est au rez-de-chaussée de cette Maison de Combray que s'aménagent progressivement une bibliothèque proustienne et une salle de travail destinée aux scolaires et à tous ceux qui veulent se documenter sur place.


Leitora
 
  “… aquela Odette que amara apaixonadamente – apesar de não lhe ter agradado à primeira vista – e que desposara quando deixara de a amar.”
J.M.
 
  O que se passa com o Tempo na vida
“Teoricamente sabe-se que a Terra gira, mas de facto não damos por isso, o chão que pisamos parece que não se mexe e vivemos tranquilos. É o que se passa com o Tempo na vida.”

Excepto quando olhamos para o espelho, e quando a roupa já não serve, e quando os cabelos brancos dão um ar da sua (des)graça, e quando os bebés já são rapagões, e quando aparece aquela dorzita, e todos os dias de Ano Novo, e todos os dias de aniversário, e todos os verões, e sempre que acharmos que o tempo a passar na vida é motivo de intranquilidade.

J.M.
 
  Cartas de amor
“A tristeza dos homens que envelheceram está em nem sequer pensarem em escrever tais cartas, cuja ineficácia já conhecem.”

J.M.
 
quarta-feira, maio 05, 2004
  Balbec
Marcel Proust séjourne pour la première fois à Cabourg en 1881 puis régulièrement tous les étés de 1907 à 1914 au Grand-Hôtel où il écrivit "A la recherche du temps perdu".




Quelques citations de Marcel Proust...

"Je n'avais pas de plus grand désir que de voir une tempète sur la mer, moins comme un beau spectacle que comme un moment dévoilé de la vie réelle de la nature".
Du coté de chez Swann

"Parfois, l'océanemplissait presque toute ma fenêtre, surélevée qu'elle était par une bande de ciel bordée en haut seulement d'une ligne qui était du même bleu que celui de la mer, mais qu'à cause de cela je croyais être la mer encore et ne devant sa couleur différente qu'à un effet d'éclairage".
A l'ombre des jeunes filles en fleurs

"En somme, j'avais bien peu profité de Balbec, ce qui ne me donnait que davantage le désir d'y revenir".
A l'ombre des jeunes filles en fleurs


Le Grand Hôtel de Cabourg vous propose sa chambre "Marcel Proust" et de retrouver l'ambiance des jeunes filles en fleurs





(não, este blogue ainda não tem patrocínios. Mas revisitar o ambiente em que Proust escreveu a sua Recherche não me parecia nada mal...)


Leitora
 
  Monumento de Júlio II - um Moisés com chifres? Aqui está ele…
The Church of San Pietro in Vincoli (St. Peter in chains) owes its name to the precious relic it hosts: the chains used to fetter St. Peter in his prisons in Jerusalem and in Rome.



The original church was dedicated to the Apostles and was built in the 4th century. Cardinal Giuliano della Rovere, the future Julius II, completely modified the church in the 15th century, which was further modified during the following century.



(…) yet all these masterpieces are eclipsed by the TOMB OF JULIUS II, by Michelangelo, notwistanding the initial grandiose conception was never completed.



Pope Julius II summoned Michelangelo in 1505 to build a sunctuose mausoleum for St. Peter, which would have included 40 statues. The work was suspended many times, first by quarrels between the Pope and Michelangelo, then by the decoration by the artist of the Sistine Chapel, and finally by the death of the Pope.

The master entrusted the main part of the work to his pupils, who executed them in accordance to his designs. Michelangelo was though totally responsible for the Moses, and was largely responsible for the figures next to him.



The monument was only completed in 1545, "a tragedy", as Michelangelo put it. Nevertheless, Michelangelo was so impressed of the result of his work that it is said he threw his hammer against the statue crying "why won't you speak?".

(http://www.romanhomes.com/monti-quarter-churches.htm)

J.M.
 
  O segredo dos salões
“…lhe permitiriam a ela ter aquilo que em casa dos Verdurin aprendera a pôr em cima de tudo: um salão.”

Preparados?? Depois da ensaboadela que vamos apanhar, já não haverá desculpas para não sabermos montar um chiquérrimo salão…

J.M.
 
 
Pietro Citati explica que o título "À Sombra das Raparigas em Flor" veio substituir o de "A Pomba Apunhalada", espécie de ave com o peito vermelho, muito apreciada pelos amigos de Proust: Reynaldo Hahn vê-as um dia no Jardin d'Acclimation e diz "Dir-se-iam ninfas que se suicidaram por amor". Para Citai, que veio a escrever uma biografia-ensaio, publicada pela Cotovia, com o título que Proust não utilizou, o escritor era essa pomba com um destino de sofrimento.
Susana Neves, Mil Folhas de 15 de Novembro de 2003.

nastenka-d
 
terça-feira, maio 04, 2004
  Manuscritos
A l'ombre des jeunes filles en fleurs


Placards corrigés. Reliure maroquin brun, Imprimerie "La Semeuse", étampes, 1917-1918, 28,5 x 25 cm.
Paris, BnF, Réserve des Livres rares, Rés. m. Y2. 824.


Ces placards découpés, numérotés de 37 à 54, très corrigés et augmentés de 16 feuillets dactylographiés postérieurement, ne représentent que le dernier tiers du roman. Les autres placards ainsi que des fragments de cahiers de mise au net furent en effet ajoutés ultérieurement à l'édition de luxe de 1920. Ces épreuves constituent néanmoins le seul témoin du texte définitif avant l'édition originale.


Fonte: BNF


Leitora
 
  Cronologia da Recherche
Entro no segundo volume, em busca de raparigas em flor.

No site americano tempsperdu é apresentada a cronologia da obra. Assim, no primeiro volume acompanhamos os primeiros anos da vida de Marcel:

Overture: after 1925
"Combray I": 1883-1892
Episode of the madeleine: 1904
"Combray II": 1883-1892
"Swann in Love": 1877-78
[Births of the Narrator and Gilberte: 1878]
"Place-Names: The Name": 1892-1895
Bois de Boulogne episode: 1903


Agora esperam-nos mais alguns anos de juventude:

"Madame Swann at Home": 1892-1895
"Place-Names: The Place": 1897


São de facto muitas as memórias provocadas pela madalena. O tempo flui lentamente, alonga-se, perdura.


Leitora
 
  "... discerni que repetir o que toda a gente pensava
não era em política um sinal de inferioridade, mas de superioridade."

J.M.
 
  "O meu pai tinha pelo meu género de inteligência um desprezo suficientemente corrigido pela ternura.."
J.M.
 
  "... os "emboras" são sempre desconhecidos "porquês"..."
J.M.
 
  ".. a natureza que revelamos na segunda parte da nossa vida é, por vezes, uma natureza inversa, uma verdadeira peça de roupa virada do avesso."
J.M.
 
  A locomotiva do prestígio
"À Sombra das Raparigas em Flor" conquistou o Prémio Goncourt 1919, novas críticas da imprensa e o desagrado do público. Após a 1ª Guerra Mundial esperava-se que fosse o livro "Croix de Bois", de Dorgèles, um jovem ex-combatente, de poucos recursos, o vencedor, e não a obra de "um autor demasiado velho" e burguês, que narra "a história de um personagem preguiçoso e mundano". O prémio de 5 mil francos [é] rapidamente gasto em jantares no Ritz (...). A distinção literária é em boa parte conseguida pela primeira campanha de marketing movida por uma editora francesa. "Gaston Gallimard lançou mão dos seus conhecimentos e pediu a Proust para fazer o mesmo".
Susana Neves, Mil Folhas de 15 de Novembro de 2003.

nastenka-d
 
  O tempo aproveitado
"À Sombra das Raparigas em Flor", um longo "intermezzo lânguido", que Proust acreditava não vir a ter sucesso, acabou por beneficiar do interregno provocado pela 1ª Guerra Mundial. Insatisfeito por ter sido obrigado, a pedido de Grasset, a cortar a última parte de "Do Lado de Swann", o escritor acaba por aceitar o convite para fazer parte dos autores da NRF. Mais, o tempo de espera permite-lhe desenvolver aquele que era um simples capítulo de "O Tempo Reencontrado" num novo volume, onde introduz Balbec, a zona balnear preferida pela sociedade do faubourg Saint-Germain, inspirada em Cabourg onde Proust ia de férias desde 1907 e onde, nessa mesma data, conhece Alfred Agostinelli, o motorista nas viagens de automóvel pela Normandia. sua grande paixão e modelo de Albertine, introduzida neste segundo volume.
Susana Neves, Mil Folhas de 15 de Novembro de 2003.

nastenka-d
 
segunda-feira, maio 03, 2004
  O reconhecimento
"Condena-se a falta de construção do romance, o tédio que dele se desprende e o snobismo do autor", são algumas das críticas dirigidas ao livro "Do Lado de Swann", publicado em 1913 pela jovem editora Grasset às expensas do escritor, porque o reconhecimento de "Em Busca do Tempo Perdido" como obra maior da História da Literatura Francesa data apenas dos anos 50. Depois dos contemporâneos, serão Georges Bernanos, os surrealistas, Sartre e Malraux os seus grandes opositores. Acusam-no de fazer uma "terrível introspecção que não leva a lado nenhum", de ser um "autor burguês" incapaz de "encontrar Deus" e "conceber o amor universal"
Susana Neves, Mil Folhas de 15 de Novembro de 2003.

nastenka-d
 
  Tempo
Ao contrário dos escritores sem fortuna, como Zola e Daudet, Marcel Proust pôde consagrar todo o seu tempo à escrita e é o luxo do tempo que esta obra reclama do leitor. Em Abril de 1942, Jean Genet defendia mesmo que o lugar ideal para ler Proust é a prisão ou o hospital. Preso por crime recorrente de furto de livros, foi na cela que leu "À Sombra das Raparigas em Flor". Lamentava apenas não ter sido condenado por roubar a obra de Proust mas a de um autor menos interessante.
Susana Neves, Mil Folhas de 15 de Novembro de 2003.

Como não temos o luxo do tempo - embora haja ainda quem leia a Recherche numa cela - o tempo em que lemos é roubado ao quotidiano. É uma outra forma de transgressão.
nastenka-d
 
sábado, maio 01, 2004
 
"Nada dura e, todavia, nada acaba, também. E nada acaba precisamente porque nada dura."


Troti
 
  A gralha
A gralha – um macho – estava na gaiola do meio...
...
Quando a gaiola se abriu, a gralha saltou do poleiro para o cimo da porta, onde ficou a inclinar a cabeça de um lado para o outro.
...
sei a história toda do Príncipe...Costumava roubar os ganchos de cabelo das meninas pequenas. Descia a pique sobre tudo o que era brilhante ou colorido. Era famoso por isso. Dantes havia recortes de notícias de jornal a seu respeito...Onde estão?
- Ele arrancou-os.
- Ele arrancou-os?
- Com o bico. Rasgou-os
- Não queria que ninguém conhecesse os seus antecedentes! Tinha vergonha do seu próprio passado.
...
- No domingo...o Príncipe saiu e voou por aí...foi directo à porta e saiu para as árvores. Passados minutos, tinham chegado três ou quatro gralhas que o cercaram na árvore. Pareciam doidas. Perseguiam-no. Batiam-lhe nas costas. Guinchavam. Atiravam-se a ele... Ele não tem a voz adequada. Não conhece a linguagem das gralhas. Lá fora não gostam dele.
...
- É o resultado de ter sido criado entre nós...É o resultado de passar toda a vida com pessoas como nós.
...
- Sim, acho que é essa a tragédia de seres humanos criarem gralhas...-Elas não reconhecem a sua própria espécie. Ele, o Príncipe, não reconhece. E devia reconhecer. Chama-se marca. Ele é na realidade uma gralha que não sabe ser uma gralha.”



Coleman Silk não sabe ser quem é. A sua luta por uma singularidade que o tornaria autêntico foi infrutífera. Cada um é o que nasce.

A “Mancha Humana” é um romance admirável na apresentação de personagens complexas. Seres humanos com marcas profundas debatem-se numa teia de problemas existenciais e becos sem saída. Roth faz-nos sentir o que é a angústia, a fraqueza, a repulsa, a intolerância, a revolta, a extrema dor que cada um carrega dentro de si no caminho da vida. É um livro que deixa uma forte impressão de incómodo. Faz-nos pensar em quem somos, faz-nos mergulhar no nosso eu mais profundo e íntimo, faz-nos meditar sobre a nossa própria condição e sobre a inevitabilidade do nosso destino. E não nos dá conforto nem solução. Porque, de alguma maneira, sentimos que a nossa realidade e a nossa verdade se situam num espaço que não alcançamos.

Troti
 
  A mancha
“...as defesas mais fortes estão crivadas de pontos fracos...”

“...a liberdade é perigosa. A liberdade é muito perigosa.”


“...ele tinha conseguido. Sem um sinal do seu segredo em nenhum dos seus filhos, era como se ele tivesse sido libertado desse segredo.

...

Como se fosse possível renunciar, fosse como fosse, ao combate que é o combate singular de cada pessoa, como se alguém pudesse, por opção e voluntariamente, deixar de ser a pessoa que é, o ser característico e imutável em cujo nome o combate é, afinal, travado.

...


As coisas são como são – ...nós deixamos uma mancha, diexamos um rasto, deixamos a nossa marca. Impurezas, crueldade, mau trato, erro, excremento, sémen. Não há outra maneira de estar aqui...Está em todos. Sopro interior. Inerente. Determinante. A mancha que existe antes da sua marca. Sem o sinal que lá está. A mancha que é tão intrínseca que não precisa de uma marca.

...Tudo quanto estava a dizer acerca da mancha era que ela é inelutável.




Troti
 
  Se tiverem oportunidade
consultem a Poesia Completa de António Nobre (1867-1900), da Publicações Dom Quixote (2000), em cujo prefácio Mário Cláudio faz uma análise comparativa de algumas poesias de Nobre com passagens de À Procura do Tempo Perdido.

J.M.
 

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"OS PAPEIS DE K.", de Manuel António Pina (1 a 3 de Outubro de 2003)

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"AS HORAS", de Michael Cunningham (27 a 30 de Outubro de 2003)

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"OBRA POÉTICA", de Ferreira Gullar (10 a 12 de Novembro de 2003)

"A VOLTA NO PARAFUSO", de Henry James (13 a 16 de Novembro de 2003)

"DESGRAÇA", de J. M. Coetzee (24 a 27 de Novembro de 2003)

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"O SOM E A FÚRIA", de William Faulkner (8 a 29 de Fevereiro de 2004)

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"O COMPLEXO DE PORTNOY", de Philip Roth (1 a 15 de Abril de 2004)

"O TEATRO DE SABBATH", de Philip Roth (16 a 22 de Abril de 2004)

"A MANCHA HUMANA", de Philip Roth (23 de Abril a 1 de Maio de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. II - À Sombra das Raparigas em Flor)", de Marcel Proust (1 a 31 de Maio de 2004)

"A MULHER DE TRINTA ANOS", de Honoré de Balzac (1 a 15 de Junho de 2004)

"A QUEDA DUM ANJO", de Camilo Castelo Branco (19 a 30 de Junho de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. III - O Lado de Guermantes)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2004)

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"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. IV - Sodoma e Gomorra)", de Marcel Proust (1 a 30 de Setembro de 2004)

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