Leitura Partilhada
sábado, maio 31, 2008
 
o sermão que não li

Também não quero deixar passar o mês sem me despedir do Padre António Vieira e desta leitura partilhada.Quero cumprimentar todos os que nos acompanharam, saudar o Luís que se juntou a nós, que tem a coragem da palavra escrita com nome próprio, o amor pelos livros e a ânsia da descoberta e que isso, sem dúvida, é o que de melhor podemos fazer em prol da língua com que nascemos e com que nos iremos.
Tenho muita pena de não ter tratado o Sermão dos Bons Anos. Lembro-me que comecei com Antonio Vieira em Fernando Pessoa e que tinha o objectivo de terminar com o profetismo do V Império e tudo o que mais pudéssemos falar, uma vez que esse Sermão calhava mesmo bem com a actualidade. Termino, pois, com Fernando Pessoa em António Vieira, ambos príncipes da nossa amada língua.

NEVOEIRO

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer –
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quere.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a Hora!


Fernando Pessoa, Mensagem


Nota: a presente versão é a da 3ª edição (1945), tendo-se respeitado a ortografia adoptada pelo Poeta. aqui
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laerce

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  que se há-de fazer a esta terra? *
Santo António (Catedral do Rio de Janeiro)

Sendo graúdos ou miúdos, os peixes deveriam entender que o bem comum é o seu próprio bem. Vivemos, desde sempre, num ambiente de défice cultural e cívico, que estimula a depredação do património colectivo e protege as negociatas e os interesses das clientelas. Se cada cidadão contribuísse com a sua parte, sem mentiras, laxismos ou furtos, respeitando o que é público como se do privado se tratasse, tudo seria diferente. A primeira grande medida para mudar o triste estado deste País seria ensinar às nossas crianças a utilizar o que é de todos (e, já agora, o que é de outrém) como se utiliza o que é nosso, explicando que a fronteira entre a pessoa e a comunidade não é estanque, que cada um tem responsabilidades para com o seu País e os seus concidadãos, e que não é delapidando o que é de todos que viveremos melhor. Tal como não cuspimos dentro de casa, assim deveríamos proceder na rua.

* Sermão de Santo António aos Peixes

azuki

 
sexta-feira, maio 30, 2008
  Stº António (S.João) sem sardinhas?


Segundo as noticias de hoje, estamos com uma greve de pescadores em Portugal (e em outros países). É possivel que este ano nos festejos populares dos Santo António, São João e São Pedro, não se consiga encontrar e comer sardinhas em nenhum lugar.

Estamos numa situação complicada. Estamos mal, se já nem as nossas pequenas e deliciosas sardinhas podemos ter no prato.

A propósito de peixes e de sardinhas, era bom que muita gente lesse o Padre António Vieira e o Sermão aos Peixes. Para se lembrarem de algumas verdades tão antigas. E que parece que ninguém hoje se importa , ninguém quer saber.

Deitou-vos Deus a benção, que crescesseis e multiplicásseis; e para que o Senhor vos confirme essa benção, lembrai-vos de não faltar aos pobres com o seu remédio. Entendei que no sustento dos pobres tendes seguros os vossos aumentos. Tomai o exemplo nas irmãs sardinhas. Porque cuidais que as multiplica o Criador em número tão inumerável? Porque são sustento de pobres. Os solhos e os salmões são muito contados, porque servem à mesa dos reis e dos poderosos; mas o peixe que sustenta a fome dos pobres de Cristo, o mesmo Cristo o multiplica e aumenta. Aqueles dois peixes companheiros dos cinco pães do deserto, multiplicaram tanto, que deram de comer a cinco mil homens. Pois se peixes mortos, que sustentam a pobres, multiplicam tanto, quanto mais e melhor o farão os vivos! Crescei, peixes, Crescei e multiplicai, e Deus vos confirme a sua benção. *

* Sermão de Sto. António aos peixes

Luis Neves

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  "Os remédios do amor e o amor sem remédio"
imagem no site precioso depósito
No Sermão do Mandato, Padre Vieira faz um discurso que pretende louvar e idealizar o Amor de Cristo pelos homens. No inicio Vieira vai caracterizar este Amor divino como uma doença "incurável".

" Quem entrar hoje nesta casa — todo-poderoso e todo amoroso Senhor ...
— quem entrar, digo, a visitar-vos nela — com muito fundamento pode duvidar se viestes aqui por pródigo, se por enfermo. Destes o céu, destes a terra, destes-vos a vós mesmo, e quem tão prodigamente despendeu quanto era e quanto tinha, não é muito que viesse a parar em um hospital. ... Diz o vosso evangelista, Senhor, que a enfermidade vos trouxe a este lugar, e não a prodigalidade. Qual seja esta enfermidade, também o declara o Evangelista. Diz que é de amor, e de amor nosso, e de amor incurável. e de amor incurável e sem remédio."
Sermão do Mandato, parte I

PAV vai desenvolver a sua oratória em torno dos possíveis remédios , os contrários, para o Amor dos homens. Os quatro remédios que podem "sarar " o amor são; o tempo , a ausência , a ingratidão , e a mudança de objecto. Mas o Amor de cristo pelos homens , um amor que "é eterno", "é divino", "é amor perfeito" , para esse amor não há qualquer remédio!
No fim do sermão, Pde Vieira vai proclama o seu amor a Cristo.

" Ah! Senhor, que só o vosso amor, que não teve remédio, pode ser o remédio das loucuras do nosso. Remediai tantas cegueiras, remediai tantos desatinos, remediai tantas perdições."
" O legado que esperamos de vossa liberalidade, ..., é que nos deixeis, alguma parte do vosso amor. Amanhã vos hão de partir o coração: reparti dele conosco, para que de todo o coração vos amemos. Oh! quanto nos pesa nesta hora, e para sempre, de vos não ter amado como devíamos! Nunca mais, Senhor, nunca mais! Só a vós havemos de amar de hoje em diante, e posto que em vós concorram tantos motivos de amor, e tão soberanos, só a vós, e por serdes quem sois."
Sermão do Mandato, parte VII
Luis Neves

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amor, ausência, morte e todas as presenças

(sobre o Sermão do Mandato)

Situemo-nos no Horto, no momento em que Cristo se afasta dos discípulos; ou então quando Ele lhes diz : “ a vós vos convém que eu vá”; ou ainda diante do Sepulcro onde Madalena chora. Para António Vieira, ela chora pela ausência de Cristo e não pela sua morte. Soror Juana Inés de la Cruz contrapõe que o caminho argumentativo de PAV não conduz necessariamente a essa conclusão. Por outras palavras, o famoso pregador tira conclusões não como uma consequência lógica dos argumentos, mas porque simplesmente já as tinha tirado antecipadamente.

Perante a argumentação de Vieira a partir da frase “ a vós vos convém que eu vá”, não deixa de ser extraordinária a força argumentativa da freira mexicana:

É verdade que vai embora, mas é
falso que se ausenta. Não percamos tempo. Já sabemos a infinidade de
presenças”.

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laerce


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quinta-feira, maio 29, 2008
 
questões à volta da morte, da ausência e do amor

Independentemente das versões que possam existir do Sermão do Mandato, do quando e onde foram pronunciados, uma coisa lhes é comum: o tema do amor de Cristo pelos homens, concentrado nos momentos finais da Sua Experiência Humana, ou seja, na Paixão e Morte.

As três versões que li, duas parcialmente na internet e uma em suporte papel, edição em livro de bolso, mostram o que é comum nos sermões de PAV, a minúcia e o pormenor da argumentação a favor do verdadeiro amor, o amor de Deus pelos homens. Deixo-vos um mandamento novo: amai-vos uns aos outros, como eu vos amei, ( penso ser assim o mandamento).

E é justamente para refutar essa argumentação que Soror Juana Inês da la Cruz escreveu a Carta Atenagórica que tanta polémica causou na época e que vem trazer à colação o papel da mulher no século XVII. Leia-se, a mulher instruída, culta e rica, que prefere a vida do mosteiro onde exerce a sua liberdade intelectual, aparentemente sem sujeições de espécie alguma, a não ser a sua própria consciência moral, afectiva ou religiosa.
Na verdade, não se pense que Soror Juana pretendia minar a fama que o Padre António Vieira, já naquela altura, usufruía nos círculos intelectuais da Europa e do Novo Mundo; ou que pretendia atacar a própria Fé católica. Soror concordava totalmente com o princípio e o fim do Sermão, o que a levava a reflectir era o caminho que Padre António Vieira seguiu para atingir esse mesmo fim. Digamos que viu nele brechas e artíficios retóricos invisíveis a quem bebia o Sermão com o deleite das palavras belas.

Vou tentar ainda apresentar algum exemplo dessas “ brechas”, mas só isto já chega para despertar a curiosidade pelas estratégias de convencimento usadas pelos jesuítas, na Europa, na América e Oriente.


foto: Vale de los Caídos, Espanha

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laerce

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quarta-feira, maio 28, 2008
  ainda sobre o Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra as de Holanda
Padre António Vieira, Theodoro Braga

Falando com Deus, num fecundo registo de emoções que vai desde a zanga à súplica, PAV usa todas as tácticas e recorre a todos os trunfos: começa em tom de censura, depois exorta-O ao arrependimento, termina rogando-Lhe perdão e misericórdia. Devo dizer que não aprecio a lógica argumentativa deste sermão, tão na linha de raciocínio da época. Eu, que sinto e penso com um coração e uma mente que pertencem ao sec XXI, queria que PAV fosse sempre maior do que o seu tempo e talvez esteja a ser injusta.

azuki
 
terça-feira, maio 27, 2008
 
Aqui está uma boa noticia, para quem pesquisa , precisa de estudar e obter informação sobre livros e autores. Esta semana li em artigo do jornal público de Isabel Coutinho ( site ciberescritas ) , que a Fundação Gulbenkian disponibiliza on-line, a revista "Colóquio Letras".
Ver o site aqui
Fiz uma pequena experiência para encontrar artigos publicados nesta revista sobre Pde António Vieira, e obtive 12 resultados.
2 deles eram sobre Sermões de Vieira, que temos lido aqui no Leitura Partilhada este mês.
Para quem queira ler artigos mais aprofundados, deixo aqui as ligações aos artigos.

"Ortodoxia e heterodoxia nos sermões de Vieira" / Francisco Maciel Silveira. In: Revista Colóquio/Letras. Ensaio.
"«Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra as de Holanda» : o futuro do passado" / Francisco Maciel Silveira. In: Revista Colóquio/Letras. Ensaio.

Luis Neves

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  Se esta havia de ser a paga e o fruto de nossos trabalhos, para que foi o trabalhar, para que foi o servir *
Torre de Belém, pormenor

Neste riquíssimo sermão, PAV atravessa inúmeros estados emocionais (em gradação crescente ou decrescente, conforme o ponto de vista): confronta Deus (Se esta havia de ser a paga e o fruto de nossos trabalhos, para que foi o trabalhar, para que foi o servir, para que foi o derrama tanto e tão ilustre sangue nestas conquistas?), apela ao Seu orgulho (colocando o enfoque no desfalque que irá sofrer a fé católica), arregimenta aliados (E se para isto não bastam os merecimentos da causa, suprirão os da Virgem Santíssima, em cuja ajuda principalmente confio), alude ao rol de atrocidades possíveis (Entrarão por esta cidade com fúria de vencedores e de hereges; não perdoarão a estado, a sexo, nem a idade), repreende-O, indo ao ponto de ser sarcástico (Abrasai, destruí, consumi-nos a todos; mas pode ser que algum dia queirais Espanhóis e Portugueses e que não os acheis. Holanda vos dará os apostólicos conquistadores que levem pelo mundo os estandartes da cruz; Holanda vos dará os pregadores evangélicos que semeiem nas terras dos bárbaros a doutrina católica e a reguem com o próprio sangue; Holanda defenderá a verdade de vossos Sacramentos e a autoridade da Igreja Romana; Holanda edificará templos, Holanda levantará altares, Holanda consagrará sacerdotes e oferecerá o sacrifício de vosso Santíssimo Corpo; Holanda, enfim, vos servirá e venerará tão religiosamente, como em Amsterdão, Meldeburgo e Flisinga e em todas as outras colónias daquele frio e alagado inferno que se está fazendo todos os dias.), confessa-se pecador e suplica (O em que se manifesta a majestade, a grandeza e a glória de vossa infinita omnipotência é em perdoar e usar de misericórdia).

* Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda

azuki
 
segunda-feira, maio 26, 2008
  Vede, peixes, quão grande bem é estar longe dos homens!*
na Guatemala

Precursor do multiculturalismo, a base humanista e cristã de PAV são as responsáveis pelas suas posições a favor dos negros e dos índios (não defendia, contudo, a abolição da escravatura, mas o tratamento condigno desses seres humanos). Contestando o poder e os modos dos colonos, dos governadores e das outras ordens religiosas, PAV luta pela sua convicção (e a da sua Ordem) de uma Nova Igreja no Novo Mundo, através da formação de comunidades religiosas de índios livres (mais tarde, como é sabido, os jesuítas acabaram por ter que ceder o seu poder a esses mesmos interesses). Os índios eram integrados nas Missões, onde estariam protegidos da exploração dos colonos, em troca da imposição de comportamentos que lhes eram estranhos: tinham que andar vestidos, praticar a monogamia e rezar a outro Deus. Esta imagem, que captei numa igreja da Guatemala, é muito dura e profundamente esclarecedora da intervenção branca na América Central e do Sul. Não deixo de me arrepiar quando assisto a índios ajoelhados perante um Deus com uma cor que não é a sua.

* Sermão de Santo António aos Peixes

azuki
 
sexta-feira, maio 23, 2008
  A maldade é comerem-se os homens uns aos outros, e os que a cometem são os maiores, que comem os pequenos
em Salvador, Baía

E que maldade é esta, à qual Deus singularmente chama a maldade, como se não houvera outra no mundo? E quem são aqueles que a cometem? A maldade é comerem-se os homens uns aos outros, e os que a cometem são os maiores, que comem os pequenos.*

Todo o trabalho de conversão levado a cabo pelos jesuítas na América era destruído pelas autoridades civis e pelos colonos, que mantinham os índios em cativeiro. Antes de vir a Portugal, solicitar a protecção da Coroa, PAV fez um dos seus mais célebres sermões, este monumento de ironia chamado Sermão de Santo António aos Peixes, no qual, após elogiar os peixes, lhes aponta os defeitos. Num registo desiludido, PAV invectiva do seu púlpito os corruptos, os prepotentes, os medíocres, os parasitas; aponta o dedo aos poderosos que abusam do poder; levanta a voz contra os seres humanos que exploram seres humanos. Estas palavras fortes de censura, que os Homens não percebem ou não querem perceber, não poderiam ser mais actuais.

* Sermão de Santo António aos Peixes

azuki

 
quinta-feira, maio 22, 2008
  Entre os semeadores do Evangelho, há uns que saem a semear, há outros que semeiam sem sair.*
ao fundo, a Igreja do Colégio dos Jesuítas da Baía (hoje catedral),
em Salvador, onde PAV pregou

Semeadores do Evangelho, eis aqui o que devemos pretender nos nossos sermões: não que os homens saiam contentes de nós, senão que saiam muito descontentes de si; não que lhes pareçam bem os nossos conceitos, mas que lhes pareçam mal os seus costumes, as suas vidas, os seus passatempos, as suas ambições e, enfim, todos os seus pecados.*

Li, já não sei bem onde, que...naquela época, o púlpito era o meio privilegiado de comunicação: não havia televisão ou rádio, nem jornais ou revistas; não existiam clubes ou associações, nem cafés ou restaurantes; as pessoas não falavam ao telefone, nem se juntavam aos domingos; tão-pouco se havia descoberto a internet. Cada indivíduo vivia em isolamento e focado na sobrevivência, sem capacidade ou estímulo para pensar muito além das aflições do dia-a-dia. A hora da missa e as festas religiosas seriam, talvez, a única oportunidade de convívio e troca de ideias. Os padres, sempre presentes, eram considerados, temidos e respeitados. Da sua boca, nada mais saía do que a verdade e a justiça, e o seu poder era infinito. É pena que, muitas vezes, a Igreja não tenha transmitido a mensagem certa: nem com os mais correctos métodos, nem para os mais acertados fins.

Olhando para PAV (que, embora criticando os maus pregadores, não pretende excluir-se do rol dos que levantam falsos testemunhos ao Senhor), vemos um homem profundamente empenhado em grandes causas, que criticou o statu quo (incluindo os Dominicanos, os tais que "semeiam sem sair") e sempre defendeu os mais desfavorecidos, numa luta de que dificilmente poderia sair vitorioso. A sua melhor qualidade como pregador foi a circunstância de todos os actos e todas as palavras da sua longa vida terem estado imbuídos de respeito pela dignidade humana.

* Sermão da Sexagésima

azuki

 
quarta-feira, maio 21, 2008
 
fineza


Porque é de finezas que se trata, convém deixar claro o sentido da palavra que se repete ao longo deste Sermão:
Fineza: ... 3 fig. agudeza de espírito; finura, perspicácia, sagacidade ...

Confesso que gosto da palavra no sentido de delicadeza e sabe bem ouvir:faça a fineza.




O amor deixará de variar, se for firme, mas não deixará de tresvariar, se é amor.

Sermão do Mandato, 2ªparte



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laerce
 
  A estrutura do Sermão da Sexagésima (2)
Para o Padre António Vieira a sociedade não estava a escutar a palavra de Deus, não haviam conversões, e a razão seria a forma errada de apresentar a palavra de Deus, a culpa seria dos pregadores.


As razões que PAV vai desenvolver ao longo do sermão para que os pregadores não estejam a cumprir a sua missão evangélica, são referidas no seguinte parágrafo:



" Mas como num pregador há tantas qualidades, e numa pregação tantas leis, e os pregadores podem ser culpados em todas, em qual consistirá esta culpa? No pregador podem-se considerar cinco circunstâncias: a pessoa, a ciência, a matéria, o estilo, a voz. A pessoa que é, e ciência que tem, a matéria que trata, o estilo que segue, a voz com que fala." (IV parte, sermão sexagésima)


Depois de explicitar cada uma destas cinco circunstâncias, PAV não as considera a verdadeira causa para o problema ...
" Pois se nenhuma destas razões que discorremos, nem todas elas juntas são a causa principal nem bastante do pouco fruto que hoje faz a palavra de Deus, qual diremos finalmente que é a verdadeira causa? " (VIII parte, sermão sexagésima)


Em conclusão do sermão, PAV defende que a mensagem da Igreja não está a ser escutada, e isso deve-se a que os pregadores transmitem a mensagem de Deus no seu próprio sentido, no sentido que os pregadores as interpretam e lhes interessam, e não no sentido que Deus lhes deu na realidade.


" Se os pregadores semeiam vento, se o que se prega é vaidade, se não se prega a palavra de Deus, como não há a Igreja de Deus de correr tormenta, em vez de colher fruto? ...
Pois como não pregam a palavra de Deus? Esse é o mal. Pregam palavras de Deus, mas não pregam a palavra de Deus: ...
As palavras de Deus, pregadas no sentido em que Deus as disse, são palavras de Deus; mas pregadas no sentido que nós queremos, não são palavras de Deus, antes podem ser palavras do Demónio." (IX parte, sermão sexagésima)


E há uma enorme tentação em pegar nas palavras e nos discursos de Vieira, e interpretá-los pelos nossos critérios, como auxiliar dos nossos pensamentos e das nossas ideias, pois é um discurso tão bem pensado, com imagens e com exemplos tão próximos, que o tornam tão universal e intemporal.


Luis Neves

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  A estrutura do Sermão da Sexagésima (1)
No início, Padre António Vieira revela qual o seu objectivo para o sermão:

" Pois se a palavra de Deus é tão poderosa, se a palavra de Deus tem hoje tantos pregadores; Porque não vemos hoje nenhum fruto da palavra de Deus? Esta tão grande, e tão importante dúvida será a matéria do sermão. Quero começar pregando-me a mim. A mim será, e também a vós: a mim para aprender a pregar: a vós, para que aprendais a ouvir."

(II parte, sermão da sexagésima)



Prosseguindo o sermão, para tentar encontrar uma explicação para estes insucessos, PAV coloca três hipóteses:

" A conversão das almas por meio da pregação depende destes três concursos: de Deus, do pregador, e do ouvinte; Por qual deles havemos entender que falta? por parte do ouvinte, ou por parte do pregador, ou por parte de Deus?"

Por motivos de Fé, para PAV esta falta não pode ser da parte de Deus. Para PAV a culpa também não pode ser atribuida aos ouvintes, pois para ele a palavra de Deus floresce em todos os locais.

" Se a palavra de Deus até nas pedras, até nos espinhos nasce; não triunfar dos alvedrios* hoje a palavra de Deus, não nascer nos corações, não é por culpa, nem por indisposição dos ouvintes."

Para PAV a responsabilidade cabe únicamente aos pregadores e à sua forma de pregar.

" E assim é. Sabeis Cristãos porque não faz fruto a palavra de Deus? Por culpa dos pregadores. Sabeis pregadores, porque não faz fruto a palavra de Deus? Por culpa nossa."

(III parte, sermão da sexagésima)


*alvedrios - livres escolhas, livre arbitrio.

Luis Neves

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terça-feira, maio 20, 2008
  Vieira numa pregação inflamada e demolidora
No Sermão de Sexagésima, Padre António Vieira ao chegar ao fim faz violentas críticas ao modo como os colegas, os que têm por ofício a pregação da palavra de Deus, fazem os seus sermões.

" Miseráveis de nós, e miseráveis dos nossos tempos! pois neles se veio a cumprir a profecia de S. Paulo: Virá o tempo, diz S. Paulo, em que os homens não sofrerão a doutrina sã: Mas para seu apetite terão grande número de pregadores feitos a montão, e sem escolha, os quais não façam mais que adular-lhes as orelhas: Fecharão os ouvidos à verdade, e abri-los-ão às fábulas. Fábula tem duas significações: quer dizer fingimento, e quer dizer comédia; e tudo são muitas pregações deste tempo. São fingimento, porque são sutilezas, e pensamentos aérios sem fundamento de verdade: são comédia, porque os ouvintes vêm à pregação, como à comédia; e há pregadores, que vêm ao púlpito como comediantes. Uma das felicidades que se contava entre as do tempo presente, era acabarem-se as comédias em Portugal; mas não foi assim. Não se acabaram, mudaram-se: passaram do teatro ao púlpito.
... Pouco disse S. Paulo em lhes chamar comédia; porque muitos sermões há, que não são comédia, são farsa."

Este é um tipo de oratória violenta, em que se acentuam ao máximo os piores defeitos, se elevam ao extremo as críticas, e se "pinta" um quadro de tons muito negros, que serve ao orador como forma de impressionar e atemorizar os ouvintes.
Acho que Vieira utiliza um estilo corrente para a época ligada ao periodo Barroco.
Pode ser considerado um discurso demasiado radical e excessivo, e mesmo provocador de conflitos. As convicções absolutas, as verdades que provinham da sua fé, davam-lhe uma personalidade muito moralista e de profeta.
Pode ser uma opinião minha, que não seja muito correcta. Mas não acho o fim do sermão da sexagésima interessante, acho moralista demais e um pouco irritante.
Mas também não me importaria nada de copiar este pequeno excerto para criticar a nossa sociadade actual com o mesmo vigor e a mesma irreverência de Pde. António Vieira.

Luis Neves

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segunda-feira, maio 19, 2008
 
amor sábio e amor ignorante

Sem dúvida que o Sermão do Mandato é um dos textos mais interessantes acerca desse sentimento que rege a vida do ser humano: o amor. Não só pelo conteúdo do discurso, mas pela polémica que causou naquela época. Refiro-me à não menos extraordinária refutação de Soror Juana Inés de la Cruz. Vale bem a pena comentarmos este sermão e conhecermos a freira mexicana.


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laerce
 
 
azuki
 
sábado, maio 17, 2008
 
o pintor, o padre e o autocarro intruso





Perdoem-me esta desafinação de estilos. Saber o que o Barroco e o Simbolismo têm em comum não caberá aqui por várias ordens de razões, como dizem alguns dos nossos retóricos políticos da actualidade. Trata-se somente de uma associação livre, quem sabe ao jeito do divã freudiano, agora que a Áustria anda por aí a ser falada. E não por alguém ter a brilhante ideia de colocar uma multidão de figurantes a empurrar um belo autocarro da selecção portuguesa, sem gasóleo naturalmente, ensinando aos portugueses como devem deslocar-se perante esta escalada dos combustíveis. Eu explico.

A um determinado passo do Sermão da Sexagésima, Padre António Vieira fala de uma árvore, uma árvore da palavra. E, se a palavra é vida e princípio, que árvore melhor poderia estar aqui que não esta do famoso pintor austríaco?


Ora vede. Uma árvore tem raízes, tem tronco, tem ramos, tem folhas, tem varas, tem flores, tem frutos. Assim há-de ser o sermão: há-de ter raízes fortes e sólidas, porque há-de ser fundado no Evangelho; há-de ter um tronco, porque há-de ter um só assunto e tratar uma só matéria; deste tronco hão-de nascer diversos ramos, que são diversos discursos, mas nascidos da mesma matéria e continuados nela; estes ramos hão-de ser secos, senão cobertos de folhas, porque os discursos hão-de ser vestidos e ornados de palavras. Há-de ter esta árvore varas, que são a repreensão dos vícios; há-de ter flores, que são as sentenças; e por remate de tudo, há-de ter frutos, que é o fruto e o fim a que se há-de ordenar o sermão. De maneira que há-de haver frutos, há-de haver flores, há-de haver varas, há-de haver folhas, há-de haver ramos; mas tudo nascido e fundado em um só tronco, que é uma só matéria.
Sermão da Sexagésima (parte VI)

Imagem: Gustav Klimt, Tree of Life

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laerce

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sexta-feira, maio 16, 2008
  As dificuldades de pregação no Maranhão

Porque como os Apóstolos iam pregar a todas as nações do mundo, muitas delas bárbaras e incultas, haviam de achar os homens degenerados em todas as espécies de creaturas: haviam de achar os homens homens, haviam de achar homens brutos, haviam de achar homens troncos, haviam de achar homens pedras. *

Com uma pequena mudança de género, haviam de achar igualmente:
mulheres mulheres
mulheres brutas
mulheres troncos
mulheres pedras

A terra boa são os corações bons, ou os homens de bom coração; e nestes prende e frutifica a palavra divina com tanta fecundidade e abundância, que se colhe por cento por um.
Os caminhos são os corações inquietos, e perturbados com a passagem, e torpel das cousas do mundo, umas que vão, outras que vêm, outras que atravessam, e todas passam; e nestes é pisada a palavra de Deus, porque ou a desatendem, ou a desprezam.
Os espinhos são os corações embaraçados com cuidados, com riquezas, com delicias; e nestes afoga-se a palavra de Deus.
As pedras são os corações duros, e obstinados; e nestes seca-se a palavra de Deus, e se nasce, não cria raízes. *

Como exemplo de mulher pedra dos dias de hoje fiz um Link (o mais óbvio),
se alguém quiser dar sugestões para as outras creaturas mulheres.

* Sermão da Sexagésima

Luis Neves

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quinta-feira, maio 15, 2008
 
eles falam falam...

O Sermão da Sexagésima faz parte do programa da disciplina da Literatura Portuguesa do Ensino Secundário. Excertos desse Sermão são lidos e comentados tendo em conta o enquadramento histórico e cultural da época. Estamos em pleno Barroco. Considerado um estilo exuberante e túrgido que a decoração douradamente rica das igrejas tratava de popularizar, foi também um tempo de muitas heresias.
Consolidada a Reforma Católica, como se explica o aparecimento de Miguel de Molinos e o molinismo em todas as suas variantes? Que tipo de sociedade defende António Vieira? Para quem prega, quem o ouve, quem se deixa influenciar pelas suas palavras? No fundo, quem as leva a sério no sentido de uma mudança de atitudes e comportamentos? Esta questão do público ouvinte é de grande importância no tenso contexto do século dezassete.
O Barroco foi também a falência da Retórica. Um discurso que serve só para deleitar não cumpre a sua verdadeira função que é actuar sobre um comportamento e produzir a necessária alteração. O Sermão da Sexagésima é uma crítica mordaz a essa oratória cheia de conceitos e imagens engenhosas que visavam a volúpia da liturgia. Curiosamente, António Vieira viria a ser acusado do mesmo mal.
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laerce

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e como venho a requerer por parte de vossa honra e glória, e pelo crédito de vosso nome (...), razão é que peça só razão, justo é que peça só justiça *

Analisado à luz da missão de que se sentia imbuído, PAV estava a defender aquilo em que acreditava, mas nem sempre a convicção justifica o discurso. As razões invocadas não são as de que se vai ser atacado por um exército hostil, mas a circunstância de se ser detentor da verdadeira fé. O que é perigoso é a argumentação de que se está do lado da verdade e da justiça (na sua sede de conquista, os holandeses seriam destruidores, mas nós também; nada nos diferenciava, a não ser a legitimidade do Deus único). PAV sente-se no direito de protestar, pois esta é a licença e liberdade que tem quem não pede favor, senão justiça* e porque o pedido nem é por ele, é por Deus, pela sua honra e glória, pelo crédito de seu nome: Olhai, Senhor, que já dizem. Já dizem os hereges, insolentes com os sucessos prósperos, que vós lhe dais ou permitis; já dizem que porque a sua, que eles chamam religião, é a verdadeira, por isso Deus os ajuda e vencem; e porque a nossa é errada e falsa, por isso nos desfavorece e somos vencidos.* Como se pode censurar quem pede pelo bem de outros?...

*Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra as de Holanda

azuki
 
terça-feira, maio 13, 2008
  "Como é possível que se ponha Vossa Majestade irada contra estes fidelíssimos servos e favoreça a parte dos infiéis, dos excomungados, dos ímpios?"*
São muito interessantes, o registo de autenticidade e a energia neste discurso, a profunda convicção, o desespero e os pungentes apelos do Padre António Vieira. E também o seu à-vontade a conversar com o Senhor, como se de um amigo próximo se tratasse. Não era desrespeito, mas sim intimidade e confiança, ao ponto de se sentir no direito de estabelecer contratos com Deus. Sinal de que acreditava plenamente na sua existência e na sua clemência.

*Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra as de Holanda

azuki
 
segunda-feira, maio 12, 2008
  A entrevista com Deus
Acabo de ler o "Sermão de Sto António aos peixes". Na última parte do sermão (peroração ou epilogo) Padre António Vieira coloca uma pergunta que nunca me tinha ocorrido. Quando tivermos que partir do mundo (maneira suavezinha de dizer morrer),
Qual será a cara com que vamos encarar Deus ?
Toda a gente tem diferentes máscaras que utiliza em diferntes contextos, mas quando estivermos em frente de Deus não vai ser possível utilizá-las.
Estamos em dia de peregrinações e de aparições, costume medieval. Podemos colocar o mesmo tipo de questão em relação a uma aparição,
Qual a cara que vamos apresentar se nos ocorrer uma aparição ?
(Incrédulos? Hipnotizados? Aterrorizados?)

O que se interroga Pde.Vieira de forma muito acutilante é,

" eu espero que o hei de ver, mas com que rosto hei de aparecer diante do seu divino acatamento, se não cesso de o ofender ? .... pois os que nascemos homens, respondemos tão mal às obrigações de nosso nascimento."

Claro que para quem não é crente e não tem convicções religiosas católicas , não vai ter este tipo de dores de consciência. podemos encontrar-nos com Deus com grande tranquilidade, tal como Pde Vieira se refere aos peixes,

" Vós (peixes) não haveis de ver a Deus, e podereis aparecer diante dele muito confiadamente, porque não o ofendestes."

Luis Neves

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domingo, maio 11, 2008
  O olhar de Pde António Vieira sobre a Sociedade dos Homens
No "Sermão de S. António aos peixes" Padre António Vieira pede aos peixes que se voltem para terra , e descreve-lhes a sociedade humana pelos seus olhos.

"Olhai, peixes lá do mar para a terra. Não, não: não é isso o que vos digo. Vós virais os olhos para os matos, e para o Sertão? Para cá, para cá, para a cidade é que haveis de olhar. Cuidais que só os Tapuias se comem uns aos outros, muito maior açougue é o de cá, muito mais se comem os brancos. Vedes vós todo aquele bulir, vedes todo aquele andar, vedes aquele concorrer às praças: e cruzar as ruas, vedes aquele subir, e descer as calçadas, vedes aquele entrar, e sair sem quietação, nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os homens como hão de comer, e como se hão de comer."

"Diz Deus, que comem os homens não só o seu povo, senão declaradamente a sua plebe: porque a plebe, e os plebeus, que são os mais pequenos, os que menos podem, e os que menos avultam na República, estes são os comidos. E não só diz, que os comem de qualquer modo, senão que os engolem, e os devoram. Porque os grandes , que têm o mando das Cidades e das Províncias, não se contenta a sua fome de comer os pequenos um por um, ou poucos a poucos, senão que devoram, e engolem os povos inteiros."

"E isto é o que padecem os pequenos. São o pão cotideano dos grandes: e assim como o pão se come com tudo, assim com tudo, e em tudo são comidos os miseraveis pequenos, não tendo nem fazendo ofício, em que os não carreguem, em que os não multem, em que os não defraudem, em que os não comam, traguem, e devorem. "

É fácil perceber porque foi expulso do Brasil, e depois foi perseguido em Portugal pela Inquisição.
Mas, e se fosse hoje? O nosso Padre Vieira também não iria ter uma vida muito fácil! Hoje, com os poderes que vingaram dentro da Igreja e nos Governos das nossas cidades, não ia ser muito bem aceite, nem bem visto.

Tapuias: Tribo de Indios Brasileiros
Luis Neves
 
sexta-feira, maio 09, 2008
  porque gosto do Padre António Vieira
Padre António Vieira pregando aos índios no Brasil
(autor n/d)

Este orador excelente, que sempre falava na maravilha e na catástrofe, que foi diplomata e conselheiro real, mestre nas letras, pensador profético, missionário, filósofo e teólogo, sonhava com um mundo melhor. Impermeável ao fanatismo corrente, foi favorável a uma aproximação aos cristãos-novos e aos judeus (ainda que motivado por algum espírito prático, do foro financeiro); superior ao espírito da época, censurou a escravatura (muito embora, de forma mitigada); crente numa sociedade mais justa, defendeu os direitos dos ameríndios, contra a exploração dos colonos (porventura, em troca de uma outra forma de escravatura); visionário, acreditou até ao fim da vida na quimera do Quinto Império e na construção de um Reino de Deus na terra; lutador feroz contra os interesses instalados e mesquinhos, apontou o dedo aos arrogantes, aos predadores, aos corruptos; extravagante, foi combatido e incompreendido.

azuki
 
quinta-feira, maio 08, 2008
 
exórdio

Os Sermões do Padre António Vieira são divididos em vários grupos: os panegíricos,os congratulatórios, os apologéticos, os políticos, os bélicos, os funerários e os ascéticos. Mas todos, desde que a matéria o permita, são morais.

A estrutura de Sermão obedece sempre ao mesmo tipo de construção. A primeira parte chama-se Exórdio. Rege-se pelas leis da Retórica. Nesta parte, o orador dirige-se ao público ouvinte e tenta cativar a sua atenção.



laerce

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terça-feira, maio 06, 2008
  SERMÃO PELO BOM SUCESSO DAS ARMAS DE PORTUGAL CONTRA AS DE HOLANDA
Assim se hão-de lograr os hereges e inimigos da Fé dos trabalhos dos portugueses e dos suores católicos? (...) Eis aqui para quem trabalhamos há tantos anos!
Mas pois vós, Senhor, o quereis e ordenais assim, fazei o que fores servido. Entregai aos Holandeses o Brasil, entregai-lhe as Indias, entregai-lhe as Espanhas (...), entregai-lhe quanto temos e possuímos (como já lhe entregastes tanta parte), pondo em suas mãos o mundo; e a nós, aos Portugueses e Espanhóis, deixai-nos, repudiai-nos, desfazei-nos, acabai-nos. Mas só digo e lembro a Vossa Majestade, Senhor, que estes mesmos que agora desfavoreceis e lançais de vós, pode ser que os queirais algum dia e que os não tenhais.


Começo pelo primeiro contacto que tive com a obra do Padre António Vieira e que veio a revelar-se experiência pouco gratificante. A imagem que eu então tinha construído era a de um homem diferente, muito para além do seu tempo, superior aos constrangimentos do contexto histórico. Confesso que fiquei desiludida.

É certo que se trata de um discurso inflamado, enérgico, profundamente galvanizador, de uma forma diferente de falar com Deus, inusitada, atrevida, por vezes refrescante. Não deixa, contudo, de ser um produto da época: demonização do inimigo e apelo à intolerância religiosa, quiçá carecendo de maior honestidade intelectual, porque manipulador e de argumentação fácil. Tudo estaria bem, não fosse este padre estar a falar em justiça, verdade e paz.

Os velhos, as mulheres, os meninos, que não têm forças nem armas com que se defender, morrem como ovelhas inocentes às mãos da crueldade herética.

azuki
 
 
Vieira, para além de fabuloso prosador, é um notável pensador, mas estes factos não o impedem de ser um homem prático, porque... " as acções de cada um são a sua essência". (S, 1, 212).
Castela
 
segunda-feira, maio 05, 2008
 
sermões e igrejas




A Igreja de S. Roque foi mandada edificar pelos Jesuítas, em 1553, no lugar da ermida com o mesmo nome. A confraria só aceitou vender a ermida à Companhia de Jesus na condição de ficarem com uma capela dentro da nova igreja.
Após vários riscos, o que acabou por ser concretizado foi o do arquitecto régio Afonso Álvares, plano de nave única com capelas laterais comunicantes, austera e com luz seguindo as recomendações saídas da Contra-Reforma, que pretendiam criar espaços para cativar toda a atenção dos fiéis.
A igreja, construída na época maneirista, mostra no seu interior as paredes laterais divididas em dois sectores: o térreo, composto por capelas interligadas, e o superior, rasgado por janelas de rectangulares balaustradas, intercaladas nos vãos por telas pintadas.
A capela-mor, com pouca profundidade, ostenta belíssimo retábulo maneirista, bem adaptado na arquitectura, ladeado por dois nichos que albergam pequenos altares e são encimados por quatro janelas (duas de cada lado). Do excelente efeito plástico resultante dos contrastes provocados pelo branco do cálcario, dos elementos estruturais e dos revestimentos de talha e pinturas, ressalta a graciosidade e harmonia do interior do templo. Ainda na nave existem dois púlpitos em pedra, num dos quais pregou o Pe. António Vieira, com escultura reforçando a beleza deste templo.

fonte


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laerce

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domingo, maio 04, 2008
 
Para se ler a Mensagem de Fernando Pessoa, já sabemos, precisamos de entender os símbolos, os que estão nesse livrinho que teve direito a um segundo lugar num concurso literário cujo nome não me recordo. Para chegar ao entendimento desses símbolos precisamos também de algumas qualidades: a simpatia, a intuição, a inteligência, a compreensão e... a graça.

Na verdade pelo mesmo livrinho só circulam aqueles seres 'iluminados', os que deixaram a marca definitiva nisto que vamos chamando ser português, mesmo que não saibamos o que isso seja. António Vieira está lá na limpidez total da língua. Porque não nos enganemos, com Vieira é sobretudo uma questão de língua e do papel social da literatura.

O céu 'strela o azul e tem grandeza.
Este, que teve a fama e à glória tem,
Imperador da língua portuguesa,
Foi-nos um céu também.

No imenso espaço seu de meditar,
Constelado de forma e de visão,
Surge, prenúncio claro do luar,
El-Rei D. Sebastião.

Mas não, não é luar: é luz do etéreo.
É um dia, e, no céu amplo de desejo,
A madrugada irreal do Quinto Império
Doira as margens do Tejo.

Fernando Pessoa, Mensagem, Os Avisos

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laerce

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sábado, maio 03, 2008
  Sermão aos peixes
O incontornável Sermão aos Peixes é (também) para mim o ponto de partida.

Contextualizado, foi proferido aos fiéis do Maranhão, antes da sua ida (oculta) para Portugal, que visava intervir no estabelecimento de legislação em defesa dos indígenas brasileiros. Voltaria com as leis concretizadas, mas seria expulso do Brasil por tentar que fossem aplicadas.

As coisas não mudaram muito, pois não?

E já agora, um momento de lazer. Um pequeno excerto musical inspirado no Sermão aos Peixes.








cristina_pt

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sexta-feira, maio 02, 2008
  Sermão de Stº António aos Peixes - O inicio "Corrupção"
O Sermão de "Santo António aos peixes" foi proferido no maranhão em 1654.
A palavra Corrupção a que Padre António Vieira se refere no inicio deste sermão (no sec XVII) não tem própriamente o mesmo significado que tem hoje em pleno sec XXI. Mas podemos pegar no inicio do sermão e ler com o conceito que temos hoje: crimes essencialmente económicos "apropriação de bens alheios em proveito próprio", "embuste", "tráfico de influências".
Deixo o primeiro paragrafo deste sermão, e com facilidade se pode fazer um paralelismo com a realidade actual do nosso país.

" Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando com os Pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhe sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção , mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela, que têm o ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção?
Ou é porque o sal não salga, ou porquê a terra se não deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os Pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina, que lhes dão, a não querem receber:
Ou é porque o sal não salga, e os Pregadores dizem uã cousa, e fazem outra , ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem:
Ou é porque o sal não salga, e os Pregadores se pregam a si, e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal."

As mentalidades em Portugal teimam em evoluir muito devagar, ou continuam muito parecidas.

Um pouco mais à frente,
"E à terra, que se não deixa salgar, que se lhe há de fazer? Este ponto não resolveu Cristo Senhor nosso no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande Português S.António"

E agora, podem continuar a descobrir o que nos diz o Padre Vieira.

Luis Neves

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  um homem genial com uma existência fascinante
Padre António Vieira, Portinari

Defensor dos injustiçados, voz severa contra os abusos de toda a espécie, corajoso a enfrentar os poderosos, despreocupado com o sucesso material, o Padre António Vieira foi um raro exemplo de quem vive como prega. Incansável, atravessou sete vezes o Atlântico, fez milhares de quilómetros a pé ou de piroga através do Brasil, viajou por vários países da Europa, viveu o desconforto e a doença, foi perseguido pela sua heterodoxia. Talvez a minha seja uma visão romanceada, mas vejo-o como um homem audaz, inteligente e sensível, um patriota e um humanista (ao mesmo tempo, teimoso e incauto, talvez até um pouco alucinado), merecedor de figurar por entre os seres humanos exemplares que nos servem de referência.

Padre António Vieira foi um homem genial que teve uma existência fascinante. Vale a pena tentar conhecê-lo um pouco melhor.

azuki
 
  uma carta
Sugiro-vos a leitura de uma carta a Padre António Vieira, aqui.



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  Alguns links
(se fosse vivo, teria um blog e certamente passaria por aqui)



Fundação Biblioteca Nacional (Brasil)



Página pessoal de Luís Filipe Silvério Lima



Vida Lusófonas



Enciclopédia Universal Digital



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quinta-feira, maio 01, 2008
  Notas biograficas e obra

No site do Ano Vieirinho pode encontrar-se uma página com uma interessante lista de notas biográficas e correspondentes obras associadas.

Além das notas biográficas, surgem algumas contextualizações históricas que certamente auxiliarão a leitura.

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E eu digo...presente!

E eu estudei ( e de certa maneira ainda estudo) onde ele esteve desterrado a partir de 1663, no Colégio de Jesus, e que é agora o Departamento de Ciências da Terra da universidade de Coimbra. Em 1665 esteve encarcerado na Inquisição de Coimbra num espaço, que é também um pátio do meu agrado.

"Os portugueses têm um pequeno país para berço e o mundo todo para morrerem."

C. Castela
 
  O mês de Maio, no Leitura Partilhada
Retrato do Padre António Vieira, de autor desconhecido do início do sec. XVIII

No passado dia 6 de Fevereiro, completaram-se 400 anos sobre o nascimento do Padre António Vieira, missionário jesuíta do sec. XVII, figura maior das Letras e da História portuguesas. Ao longo de 90 anos de vida, o Padre António Vieira constrói uma obra monumental, na qual sobressaem, entre outros, 200 sermões e 700 cartas. 2008 É ANO VIEIRINO e o Leitura Partilhada associa-se às comemorações.
sobre o Ano Vieirino
 

O QUE ESTAMOS A LER

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PROXIMAS LEITURAS

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LEITURAS NO ARQUIVO

"ULISSES", de James Joyce (17 de Julho de 2003 a 7 de Fevereiro de 2004)

"OS PAPEIS DE K.", de Manuel António Pina (1 a 3 de Outubro de 2003)

"AS ONDAS", de Virginia Woolf (13 a 20 de Outubro de 2003)

"AS HORAS", de Michael Cunningham (27 a 30 de Outubro de 2003)

"A CIDADE E AS SERRAS", de Eça de Queirós (30 de Outubro a 2 de Novembro de 2003)

"OBRA POÉTICA", de Ferreira Gullar (10 a 12 de Novembro de 2003)

"A VOLTA NO PARAFUSO", de Henry James (13 a 16 de Novembro de 2003)

"DESGRAÇA", de J. M. Coetzee (24 a 27 de Novembro de 2003)

"PEQUENO TRATADO SOBRE AS ILUSÕES", de Paulinho Assunção (22 a 28 de Dezembro de 2003)

"O SOM E A FÚRIA", de William Faulkner (8 a 29 de Fevereiro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. I - Do lado de Swann)", de Marcel Proust (1 a 31 de Março de 2004)

"O COMPLEXO DE PORTNOY", de Philip Roth (1 a 15 de Abril de 2004)

"O TEATRO DE SABBATH", de Philip Roth (16 a 22 de Abril de 2004)

"A MANCHA HUMANA", de Philip Roth (23 de Abril a 1 de Maio de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. II - À Sombra das Raparigas em Flor)", de Marcel Proust (1 a 31 de Maio de 2004)

"A MULHER DE TRINTA ANOS", de Honoré de Balzac (1 a 15 de Junho de 2004)

"A QUEDA DUM ANJO", de Camilo Castelo Branco (19 a 30 de Junho de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. III - O Lado de Guermantes)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2004)

"O LEITOR", de Bernhard Schlink (1 a 31 de Agosto de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. IV - Sodoma e Gomorra)", de Marcel Proust (1 a 30 de Setembro de 2004)

"UMA APRENDIZAGEM OU O LIVRO DOS PRAZERES" e outros, de Clarice Lispector (1 a 31 de Outubro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. V - A Prisioneira)", de Marcel Proust (1 a 30 de Novembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA", de José Saramago (1 a 21 de Dezembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A LUCIDEZ", de José Saramago (21 a 31 de Dezembro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VI - A Fugitiva)", de Marcel Proust (1 a 31 de Janeiro de 2005)

"A CRIAÇÃO DO MUNDO", de Miguel Torga (1 de Fevereiro a 31 de Março de 2005)

"A GRANDE ARTE", de Rubem Fonseca (1 a 30 de Abril de 2005)

"D. QUIXOTE DE LA MANCHA", de Miguel de Cervantes (de 1 de Maio a 30 de Junho de 2005)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VII - O Tempo Reencontrado)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2005)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2005)

UMA SELECÇÃO DE CONTOS LP (1 a 3O de Setembro de 2005)

"À ESPERA NO CENTEIO", de JD Salinger (1 a 31 de Outubro de 2005)(link)

"NOVE CONTOS", de JD Salinger (21 a 29 de Outubro de 2005)(link)

Van Gogh, o suicidado da sociedade; Heliogabalo ou o Anarquista Coroado; Tarahumaras; O Teatro e o seu Duplo, de Antonin Artaud (1 a 30 de Novembro de 2005)

"A SELVA", de Ferreira de Castro (1 a 31 de Dezembro de 2005)

"RICARDO III" e "HAMLET", de William Shakespeare (1 a 31 de Janeiro de 2006)

"SE NUMA NOITE DE INVERNO UM VIAJANTE" e "PALOMAR", de Italo Calvino (1 a 28 de Fevereiro de 2006)

"OTELO" e "MACBETH", de William Shakespeare (1 a 31 de Março de 2006)

"VALE ABRAÃO", de Agustina Bessa-Luis (1 a 30 de Abril de 2006)

"O REI LEAR" e "TEMPESTADE", de William Shakespeare (1 a 31 de Maio de 2006)

"MEMÓRIAS DE ADRIANO", de Marguerite Yourcenar (1 a 30 de Junho de 2006)

"ILÍADA", de Homero (1 a 31 de Julho de 2006)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2006)

POESIA DE ALBERTO CAEIRO (1 a 30 de Setembro de 2006)

"O ALEPH", de Jorge Luis Borges (1 a 31 de Outubro de 2006) (link)

POESIA DE ÁLVARO DE CAMPOS (1 a 30 de Novembro de 2006)

"DOM CASMURRO", de Machado de Assis (1 a 31 de Dezembro de 2006)(link)

POESIA DE RICARDO REIS E DE FERNANDO PESSOA (1 a 31 de Janeiro de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 28 de Fevereiro de 2007)

"O VERMELHO E O NEGRO" e "A CARTUXA DE PARMA", de Stendhal (1 a 31 de Março de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 30 de Abril de 2007)

"A RELÍQUIA", de Eça de Queirós (1 a 31 de Maio de 2007)

"CÂNDIDO", de Voltaire (1 a 30 de Junho de 2007)

"MOBY DICK", de Herman Melville (1 a 31 de Julho de 2007)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2007)

"PARAÍSO PERDIDO", de John Milton (1 a 30 de Setembro de 2007)

"AS FLORES DO MAL", de Charles Baudelaire (1 a 31 de Outubro de 2007)

"O NOME DA ROSA", de Umberto Eco (1 a 30 de Novembro de 2007)

POESIA DE EUGÉNIO DE ANDRADE (1 a 31 de Dezembro de 2007)

"MERIDIANO DE SANGUE", de Cormac McCarthy (1 a 31 de Janeiro de 2008)

"METAMORFOSES", de Ovídio (1 a 29 de Fevereiro de 2008)

POESIA DE AL BERTO (1 a 31 de Março de 2008)

"O MANUAL DOS INQUISIDORES", de António Lobo Antunes (1 a 30 de Abril de 2008)

SERMÕES DE PADRE ANTÓNIO VIEIRA (1 a 31 de Maio de 2008)

"MAU TEMPO NO CANAL", de Vitorino Nemésio (1 a 30 de Junho de 2008)

"CHORA, TERRA BEM-AMADA", de Alan Paton (1 a 31 de Julho de 2008)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2008)

"MENSAGEM", de Fernando Pessoa (1 a 30 de Setembro de 2008)

"LAVOURA ARCAICA" e "UM COPO DE CÓLERA" de Raduan Nassar (1 a 31 de Outubro de 2008)

POESIA de Sophia de Mello Breyner Andresen (1 a 30 de Novembro de 2008)

"FOME", de Knut Hamsun (1 a 31 de Dezembro de 2008)

"DIÁRIO 1941-1943", de Etty Hillesum (1 a 31 de Janeiro de 2009)

"NA PATAGÓNIA", de Bruce Chatwin (1 a 28 de Fevereiro de 2009)

"O DEUS DAS MOSCAS", de William Golding (1 a 31 de Março de 2009)

"O CÉU É DOS VIOLENTOS", de Flannery O´Connor (1 a 15 de Abril de 2009)

"O NÓ DO PROBLEMA", de Graham Greene (16 a 30 de Abril de 2009)

"APARIÇÃO", de Vergílio Ferreira (1 a 31 de Maio de 2009)

"AS VINHAS DA IRA", de John Steinbeck (1 a 30 de Junho de 2009)

"DEBAIXO DO VULCÃO", de Malcolm Lowry (1 a 31 de Julho de 2009)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2009)

POEMAS E CONTOS, de Edgar Allan Poe (1 a 30 de Setembro de 2009)

"POR FAVOR, NÃO MATEM A COTOVIA", de Harper Lee (1 a 31 de Outubro de 2009)

"A ORIGEM DAS ESPÉCIES", de Charles Darwin (1 a 30 de Novembro de 2009)

Primeira Viagem Temática BLOOMSDAY 2004

Primeira Saí­da de Campo TORMES 2004

Primeira Tertúlia Casa de 3 2005

Segundo Aniversário LP

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