Leitura Partilhada
sábado, janeiro 31, 2009
  o riso tornou-se impossível depois de Auschwitz
(foto de Rossrs: ruínas do campo Auschwitz-Birkenau, declarado Património da Humanidade pela UNESCO, em 2002)

Estaline matou indiscriminadamente e com métodos variados (fome e miséria, GULAG, execuções, deportações, barcos abandonados, escravidão,...*). Ainda que funcionando por fases, o seu periscópico instinto destruidor não poupava ninguém, pois todos eram potenciais inimigos do regime: anarquistas, mencheviques, brancos, camponeses (principalmente, os kulaques), intelectuais, agentes polacos, cossacos e ucranianos em geral, membros do Partido, homens da Tcheka, operários "culpados" pelos variados fracassos industriais, judeus (é verdade), militares,.. As duas armas que Estaline utilizou para roubar a alma a um povo não tinham a precisão cirúrgica do Zyklon B, mas foram igualmente eficazes: Fome e Terror. Contudo, as muitas, muitíssimas vítimas de Estaline são invisíveis (aliás, se os funcionários dos Censos não acertassem nos números que o ditador confabulava, eram fuzilados, o que chegou a acontecer).

* acresce uma indesculpável inépcia política e militar aquando da invasão nazi, produto da combinação do seu delírio, poder absoluto e impunidade que, embora de forma não premeditada, conduziu à chacina de milhões de russos

Por seu lado, o nazismo industrializou um método científico com o objectivo de exterminar um povo, e as suas vítimas são contabilizáveis: 6 milhões de seres humanos identificados. Assim, escreve Martin Amis: sempre foi possível gozar com a União Soviética, mas nunca foi possível gozar com a Alemanha Nazi (Hitler atrai a anedota, mas as suas acções repelem-na). Não é uma mera questão de pudor. No caso alemão, o riso ausenta-se automaticamente. Desculpa, Adorno, não foi a poesia que se tornou impossível depois de Auschwitz. O que se tornou impossível foi o riso.

azuki
 
sexta-feira, janeiro 30, 2009
 
uma rosa amarela floriu até aos limites

O que me prendeu neste livro foi o lado poético das palavras simples, dos episódios banais, da avidez literária rematada com as tarefas diárias básicas. Foi também a análise constante e despretensiosa que Etty fazia acerca do que vivia, física e interiormente. Como a rosa amarela, Etty significa o talento para atingir o limite. O limite das nossas capacidades. Que, se foi Deus quem nos criou, seguramente foi para isso.



clarinda

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  1000: Parabéns ao JL

 
quinta-feira, janeiro 29, 2009
  Festa do Livro estreia-se no Pavilhão Rosa Mota (Porto)
Evento arranca amanhã, com a presença de mais de 200 editoras portuguesas e internacionais. Até 28 de Fevereiro, há livros à venda a partir de 75 cêntimos.

fonte
 
  a banalidade do Mal
Adolf Eichmann, um dos maestros do Holocausto, foi julgado em Israel, em 1962, após a sua captura na Argentina. Eichmann foi considerado culpado de todas as acusações e condenado à morte por enforcamento. Tratou-se da única sentença do género na vida do Estado de Israel. A assistir ao julgamento, no meio de centenas de jornalistas, estava Hannah Arendt, da revista “New Yorker”. E passo a transcrever a notícia de José Pedro Castanheira (Jornal Expresso – 20/Nov/04): O livro acaba por ser um longo estudo sobre a maldade humana. Como acontece quase sempre, o criminoso alegou que nada tinha contra as suas vítimas. “Pessoalmente”, dizia, não nutria “qualquer ódio aos judeus.” E jamais se arrependeu. Mas não passaria este nazi de um louco? O procurador sustentou a tese de que o réu não passaria de um “sádico perverso” – o que foi rejeitado pelos juízes. Um dos psiquiatras que o observou disse que ele era “mais normal do que eu próprio depois de o ter examinado”. Outro clínico sublinhou que a sua estrutura psicológica, bem como a atitude em relação à família, eram “não só normais mas absolutamente recomendáveis”.

O problema, no caso de Eichmann, era que havia muitos como ele, e que estes muitos não eram nem perversos nem sádicos, pois eram, e ainda são, terrivelmente normais, assustadoramente normais. Do ponto de vista das nossas instituições e dos nossos valores morais, esta normalidade é muito mais aterradora do que todas as atrocidades juntas.
“Eichmann em Jerusalém – Uma reportagem sobre a Banalidade do Mal”, de Hannah Arendt


azuki

[dou alvíssaras a quem me disser onde poderei comprar este livro (novo ou usado)]
 
quarta-feira, janeiro 28, 2009
  conselhos da Etty para os sofredores crónicos (iii)
- Não podemos deixar-nos paralisar pela dor: repetir o exercício da auto-comiseração até à saciedade é uma atitude pouco inteligente. Em vez de alimentar uma postura que nos faz a vida negra e acaba por afastar os outros, tentemos assumir a realidade e retirar força do sofrimento.

A realidade é algo que uma pessoa precisa de assumir; todo o sofrimento que a acompanha, todas as dificuldades que uma pessoa tem de assumir e arcar, ao arcar já aumenta a capacidade de resistência. Mas o conceito de sofrimento (que não é realmente “sofrimento”, pois sofrer é em si frutuoso e pode tornar a vida em algo de precioso) deve ser desfeito.
**
E também isto: através da aprendizagem e aceitação das suas próprias fraquezas e imperfeições, uma pessoa aumenta a sua força.
**
o maior sofrimento do seu humano é o sofrimento que ele teme
**
Sou capaz de olhar de frente toda a espécie de sofrimento, não tenho medo disso.

“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008


azuki
 
segunda-feira, janeiro 26, 2009
  Koba
O século XX foi de tal maneira pródigo em atrocidades, que somos levados a pensar que a maldade já atingiu os seus limites (mas não, claro que não, lembremo-nos de Shakespeare: há mais entre o céu e a terra...). Transito de um regime ignóbil para outro e leio agora o impressionante e de difícil digestão "Koba, o Terrível", de Martin Amis (Teorema, 2003). Reconheço-me nas palavras do autor, pois também a mim sempre causou perplexidade a tolerância com que o regime soviético de 1917-1953 foi encarado até meados da década de setenta (talvez o grande responsável pela tomada de consciência seja um homem chamado Alexandre Soljenitsyne). E, de igual forma, me questiono porque é que não existe, à semelhança de “Holocausto”, um vocábulo certeiro para o processo com que Estaline vitimou milhões (“Estalinismo” parece-me bastante vago para um mix entre Colectivização forçada, Terror, Fome e Demência). E porque é que os bolcheviques tanto suscitam o riso, enquanto que quase não há anedotas sobre os nazis: Estaline, na sua saga psicótica de recusar a realidade e de se impor a ela, era ridículo; Hitler, a babar-se no estrado perante centenas de milhares de braço estendido, era ridículo (ao ver "O Triunfo da Vontade”, de Leni Riefenstahl, ficamos perturbados ao constatar como aquele povo estava ávido de pertença, ainda que o elemento aglutinador fosse uma máquina de tirania, belicismo e paranóia). Enfim, porque é que só o nazismo não tem desculpa?

azuki
 
 
Etty, de etérea

Se Etty pode ensinar alguma coisa nos dias que correm, ditos de crise sem precedentes; se pode sair do campo de trabalho, de concentração, de morte e lembrar-nos uma peste mental negra que marca de forma indelével a sociedade ocidental, é porque a forma como encarou a vida não se esgotou na sua própria experiência e pode despertar em qualquer um de nós.


No sábado, dia quatro de Junho de 42, escreve o seguinte: Cada camisa lavada que vestes é ainda uma espécie de festa. E cada vez que te lavas com um sabonete cheiroso numa casa de banho, que é só para ti durante meia hora, também. É como se eu estivesse continuamente a despedir-me de todas estas excelências da civilização.

clarinda

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domingo, janeiro 25, 2009
 
Palavras de Etty sobre o Inferno


E é este o maior sofrimento para muitos: a total falta de preparação interior, que faz com que eles pereçam desde já, mesmo antes de ter visto um campo de trabalho. Depois desta atitude, a nossa catástrofe é completa. Verdade, verdadinha, "O Inferno" de Dante é uma opereta em comparação...
p.259

clarinda

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sábado, janeiro 24, 2009
  meditai que isto aconteceu
XXXXX
Vós que viveis tranquilos
Nas vossas casas aquecidas,
Vós que encontrais regressando à noite
Comida quente e rostos amigos:
XXX Considerai se isto é um homem
XXX Quem trabalha na lama
XXX Quem não conhece paz
XXX Quem luta por meio pão
XXX Quem morre por um sim ou por um não.
XXX Considerai se isto é uma mulher,
XXX Sem cabelo e sem nome
XXX Sem mais força para recordar
XXX Vazios os olhos e frio o regaço
XXX Como uma rã no Inverno.
Meditai que isto aconteceu:
Recomendo-vos estas palavras.
Esculpi-as no vosso coração
Estando em casa andando pela rua,
Ao deitar-vos e ao levantar-vos;
Repeti-as aos vossos filhos.
XXX Ou então que desmorone a vossa casa,
XXX Que a doença vos entreve,
XXX Que os vossos filhos vos virem a cara.

Se Isto É Um Homem, de Primo Levi, Colecção Mil Folhas – Público (2002), tradução de Simonetta Cabrita Neto

azuki
 
quinta-feira, janeiro 22, 2009
 
tapar todos os rumores

Folheando o diário, não faltam exemplos da capacidade criativa de Etty e da alegria que punha em cada pequeno gesto. Pergunto-me se tinha a percepção da enormidade da tragédia que a envolvia, como a temos nós hoje, pelos relatos e dados históricos. Tinha sim, dirá quem lê o diário, Etty sabia muito bem o destino dos passageiros daquela viagem grátis. Pergunto-me se acreditava que podia, por alguma circunstância inesperada, sobreviver àquilo. Não, dirá quem lê o diário, Etty sabia o seu destino. Sentia-o.

E no entanto, a felicidade em que vivia parecia por vezes um sacrilégio perante tanto sofrimento. Como podia alguém ser feliz ali, naquele contexto?

Quem ler o diário, mais para o fim do livro, vai perceber os momentos de angústia com que Etty sente o tempo passar, o tempo que nunca mais voltará. Os dias em que podia andar de bicicleta, as horas em que podia ler, os minutos em que podia sorrir, os segundos em que podia respirar. Demasiado humano para ser só literatura.



clarinda

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quarta-feira, janeiro 21, 2009
  parabéns ao LP
Sei que andam a ler o "Diário" (que desconhecia por completo) e também fiquei muito curioso sobre a forma de encarar o futuro da Etty. Pelos posts que têm publicado, parece-me que todos temos alguma coisa a aprender com ela... o que é gratificante. Fiquei ainda curioso sobre o livro do Primo Levy ("Se isto é um homem"). Talvez estes exemplos nos ajudem a enfrentar as pequenas batalhas do dia-a-dia, sem medo dos nossos medos. Por isso, parabéns ao LP.

Carlos A.
 
  conselhos da Etty para os sofredores crónicos (ii)
- Vivemos rodeados de beleza e devemos exercitar a capacidade de a detectar, relativizando o que de negativo a existência contém.

Quero memorizar uma coisa para os meus momentos mais difíceis e também a quero ter sempre à mão: que Dostoiévski passou quatro anos em desterro na Sibéria, tendo a Bíblia por única leitura. Também nunca teve permissão para estar sozinho e a higiene não era igualmente famosa.

“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008


azuki
 
terça-feira, janeiro 20, 2009
 
e esta noite é outra vez um novo dia


O perfume do jasmim ainda não está proibido e o amor na vida de Etty também não. Assim como o jasmim radioso e puro, entalado entre o muro sem cor dos vizinhos das traseiras e a garagem, subsiste a qualquer entendimento, também o amor resistia ao ambiente asfixiante.


Escreveu, na quarta-feira, 1 de Julho de 42, que ia ter com o seu amigo que fazia parte da vida dela há dezasseis meses, e que às vezes, parecia que o conhecia há mil anos e, outras vezes, tudo lhe parecia tão recente que deixava de respirar com o espanto.

clarinda

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segunda-feira, janeiro 19, 2009
  ainda sobre Leni Riefenstahl
In this creative work I look for dramatic tension. It is there. It will communicate itself to the nation once the filmic raw material has been so sifted that words and speeches, crowd scenes and close-ups, the marches and the music, pictures of Nuremberg’s dawn and dusk, form a symphonic climax which symbolises the meaning of Nuremberg.
The Führer himself coined the film’s title Triumph of the Will. In this way he showed the essential substance the film is to reveal.
And so, based on its victorious title, a film has been made which shows today’s Germany on its triumphant march forward, confident in her knowledge, power and determination to do battle and win through for our German people.
This is a heroic film of fact, for in the Führer’s will his people have triumphed.
Leni Riefenstahl, “Behind the Scenes of the Reich’s Party Rally”, 1935


Leni Riefenstahl (LR) poderia ter sido unanimemente reconhecida como uma pessoa notável. Dotada de uma compleição física invulgar e de elevados conhecimentos técnicos, determinação, criatividade, espírito de liderança e sensibilidade artística, ainda por cima mulher de sucesso num mundo de homens, a bailarina-actriz-argumentista-produtora-realizadora teve todas as condições para granjear o lugar na História que só aos grandes pertence. Mas tal nunca acontecerá, pois o mundo não lhe perdoa. De forma consciente ou não, LR pôs a sua arte ao serviço do Mal e não há genialidade que o possa branquear.

Nenhum artista pode reclamar-se inocente da mensagem que a sua obra veicula, sobretudo quando ela é óbvia. “Triumph of the Will” não é descrição, mas exaltação. Não, não se trata de um registo factual isento, mas de uma obra de propaganda onde uma deslumbrada LR utiliza todas as técnicas e imagens de que dispõe para fazer a apologia do Partido Nazi, de Hitler e da “Nova Alemanha”. São 61 metros de filme editados com esmero, a bem do Triunfo da Vontade: o País, em uníssono, a glorificar uma trapalhada doutrinária feita de repressão e de racismo e um conjunto de pessoas a que o mundo veio a chamar de criminosas.

Tudo aquilo aconteceu? Sim. Foram poucas as sequências planeadas? Pode ser. Mas...e o outro lado? Mostrar Hitler a ser efusivamente aplaudido pela multidão ou Hitler a assoar-se é uma escolha; filmar uma sequência idílica, em que grupos de homens em postura militar se mostram desejosos de trabalhar pela Pátria, mulheres felizes atiram flores ao Führer, crianças louras e saudáveis saltitam alegremente, enfim, em que todo um povo de braço direito em riste grita “Sieg, Heil”, é uma opção; uma opção que a cineasta tomou livremente (LR afirmava que nunca ninguém lhe deu ordens) e de que é inteiramente responsável. Não tinha interesse pela política, pois era só uma artista? Não sabia que manipular a imagem em prol de um fim, esconder, distorcer, são atitudes condenáveis? Não achava que o filme se destinava a moldar a opinião das massas? Ora, uma artista não é uma inimputável e LR não era tolinha nem frívola. A edição de imagens daquele teor é um acto ideológico.

LR não sabia quem eram os nazis? O “Mein Kampf” foi publicado em 1926. Ao longo dos anos 20 e 30, os nacionais-socialistas foram “eliminando” opositores, principalmente sociais-democratas e comunistas, bem como vozes dissonantes dentro do próprio partido e restantes “anti-sociais”. O Estado totalitarista toma forma e a ideologia nazi vai-se insinuando na religião, na educação, na justiça. As liberdades individuais vão sendo destruídas, a democracia extinguida. Em 1933, o Parlamento concede plenos poderes a Hitler, são dissolvidos todos os restantes partidos e proibida a constituição de novos, são abolidos os sindicatos, a comunicação social e a cultura ficam sob o jugo de Goebbels. Em 1934, é suprimida a representação popular nos governos dos Länder e, na “Noite das Facas Longas”, executam-se os membros proeminentes das SA, incluindo o seu líder, Ernst Röhm (é impossível que LR não se tenha questionado quando, no dia seguinte à matança, Hitler mandou destruir todas as cópias de “Victory of Faith”, o trabalho da cineasta sobre o Congresso Anual do Partido Nazi em Nuremberga no ano de 1933, onde Röhm aparece em lugar de destaque).

Na Grécia clássica, bastava que alguém lançasse um miasma sobre a comunidade, ainda que sem intenção, para ter que pagar por isso. Nas sociedades modernas, o conceito de culpa surge associado à consciência e, se se provar que não houve dolo ou negligência, a pessoa não é culpada. Mas, existindo ou não consciência no momento em que se pratica um acto que causa dano a outrem, subsiste algo chamado arrependimento. LR, que viveu até ao fim da guerra e soube o que todos sabemos, pelo que teve imensas oportunidades para repudiar a sua "arte", sempre recusou qualquer responsabilidade moral no advento do nazismo. Ora, para além da Lei (que ela não violou) e da opinião pública (com razões para a julgar), há uma coisa chamada consciência individual: uma pessoa de bem não teria dito “mas eu não me interesso por política”, uma pessoa de bem diria apenas “arrependo-me de o ter feito”. Desconheço a qualidade das noites de sono dos seus 101 anos de vida, mas muito estranharia se me dissessem que foram tranquilas.

azuki
 
domingo, janeiro 18, 2009
 
a ilusão do cinema



À semelhança da azuki, também quero saber como tudo se passou. As origens, os intervenientes, os processos, os métodos e as consequências imediatas e futuras. Por isso, chamo à colação uma personagem real (se é que posso dizer isto) que viveu estigmatizada pela suástica até aos 101 anos, idade com que faleceu, e até à eternidade no que à sétima arte diz respeito. Refiro-me a Leni Riefenstahl.

Aquando das filmagens de Tiefland, Leni usou figurantes ciganos dos campos de detenção de Salzburgo e de Berlim, conforme reza a legenda da foto inserida no livro de Steven Bach sobre a biografia da artista colaborante. Acusada e julgada pelos tribunais, conseguiu ser ilibada devido a um preciosismo semântico: não se tratava de figurantes vindos de campos de concentração mas sim de campos de recolha. Diz-se que misturava mentiras e verdades e era uma pessoa prodigiosamente criativa e de enorme ambição.
A imagem no topo é do filme Luz Azul, o seu primeiro filme como realizadora, em 1932. Nesse tempo, uma outra figura fazia-lhe sombra azul: Marlene Dietrich.


imagem da net



clarinda

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sábado, janeiro 17, 2009
  A 30 de Novembro de 1943, a Cruz Vermelha comunicou a morte de Etty em Auschwitz

Tudo me remete para o campo. O que quer que faça, o que quer que veja, o meu espírito volta sempre ao mesmo sítio. É como se o “trabalho” que tinha de fazer lá nunca tivesse saído verdadeiramente da minha cabeça...
Nunca se sai verdadeiramente do Crematório.
“Sonderkommando”, de Shlomo Venezia (e Béatrice Prasquier), A Esfera dos Livros, Set/08


Agora, já sei. Já sei como funciona. A chegada dos comboios, a triagem (80% para o gás, os restantes 20% para o campo, com uma longevidade média de 3 meses), as salas onde se despiam uns e se desinfectavam outros, os gaseamentos (desengane-se, quem pensa tratar-se de morte rápida e indolor), todo o complexo processo de tratamento dos cadáveres (dentes, cabelo, valas, fornos, ossos, cinzas). Lembro-me de ter estado em Auschwitz-Birkenau, a olhar para um dos crematórios e a achar impossível que o serviço de extermínio de um comboio pudesse durar apenas 3 dias, sem deixar rasto. Agora, já sei. Foi um permanentemente torturado Shlomo Venezia quem me contou. Tenho os mapas e os esquemas na mente, ordenados, explicados, minuciosamente descritos. Perguntam-me, amigos intrigados, a que propósito quis ler tal relato. Eu respondo: porque queria saber, eu queria saber.

azuki
 
sexta-feira, janeiro 16, 2009
 
hierarquias





Na quarta-feira, dez de Junho de 1942, às sete e meia da manhã – é importante a hora - Etty escreve o seguinte: É tão arrebatador e entusiasmante o meu Santo Agostinho-em-jejum. Uma constipação já não me faz perder completamente o equilíbrio, mas não tem graça nenhuma. Bom dia minha secretária desarrumada. O pano do pó dança em curvas negligentes à volta dos meus tenros botões de rosa e o ‘Sobre Deus’ de Rilke está meio esmagado pelo peso do ’Russo para Comerciantes’.
A importância dos livros assume dimensões de tal ordem na vida de Etty, que a pirâmide de Maslow, aplicada à sua experiência de vida, transforma-se num círculo em que nada separa o topo e a base.
E isso surge-nos tão levemente tratado, tão simples, tão natural perante a monstruosa situação de insegurança, que chega a doer.


imagem da net


clarinda

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quinta-feira, janeiro 15, 2009
  conselhos de Etty para os sofredores crónicos
Acredito que qualquer pessoa ganharia com a leitura deste Diário. Particularmente, aqueles que se lamentam de forma constante e cuja expressão facial denota um sofrimento intenso: por muito obstinado que seja o seu exercício de auto-comiseração, não poderiam evitar reflectir sobre a forma como esta mulher corajosa enfrentou os últimos anos da sua vida. Por isso, aqui deixo alguns dos sábios conselhos de Etty para os sofredores crónicos.

- Uma postura de incessante sofrimento é uma manifestação de egoísmo, pois quem vive atormentado pela dor tem o dever de proteger aqueles que ama. Por outro lado, ao tentar ser leve para os outros, o sofredor estará a assimilar um mecanismo que tem características virtuosas: fazendo um esforço para desanuviar o ambiente, minimiza a sua dor e ajuda-se a si próprio.

As pessoas não se devem contaminar mutuamente com as suas más disposições.
**
Uma pessoa também deve ter a coragem de sofrer sozinha e não sobrecarregar os outros com os seus medos e incómodos.
**
Mas uma pessoa também deve ser boa para os outros e não os sobrecarregar continuamente com um peso que podemos carregar muito bem sozinhos, não é assim?

“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008
azuki
 
 
as palavras deveriam servir somente para dar forma e delineação ao silêncio.

p. 190

clarinda

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quarta-feira, janeiro 14, 2009
  sobre a positividade
Na realidade, esta é a nossa única obrigação moral: desbravar dentro de nós grandes planícies de tranquilidade, cada vez mais tranquilidade, para a poder irradiar sobre os outros. E quanto mais tranquilidade houver nas pessoas, mais tranquilidade haverá neste mundo agitado.
“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008

Não me parece que tal raciocínio possa ser aplicável a este caso, que foge a todos os trâmites e é incompreensível, indescritível, impossível de assimilar, mas, em circunstâncias de vida ditas normais, o grande desígnio do indivíduo (depois de se ter provido de bens de primeira necessidade) é a procura incessante da felicidade. A capacidade para se ser feliz é produto da conjugação de factores tão diversos como o código genético, o ambiente social e a vontade, e consiste, em última análise, no bem-estar que somos susceptíveis de assimilar da nossa própria existência. Com a ajuda de uma enorme força interior transformada em coragem serenidade gratidão, Etty conseguiu ser feliz, num contexto de inenarrável hostilidade.

No capítulo da vontade, há teorias que se baseiam na neuroplasticidade do cérebro para defender que estaremos a aumentar a potencialidade de sermos felizes se investirmos nas emoções positivas, atribuindo, em simultâneo, menos importância às negativas (aumentando/reduzindo, assim, a actividade cerebral que lhe está associada). A leitura deste Diário reforça a minha convicção de que a positividade é um motor que impele à realização, que nos torna mais felizes, mais motivados, mais atentos e mais abertos ao mundo e é, por isso, a mais poderosa arma contra o infortúnio.

azuki
 
terça-feira, janeiro 13, 2009
  um outro diário de uma jovem judia na Holanda da 2ª GM (ii)
O texto que Anne Franke escreve em Março de 1944 (já após a morte de Etty), sustentado nos relatos que ouve na rádio e nas conversas que ainda tem com as poucas pessoas do exterior com quem convive, ajuda-me a imaginar essa Holanda transfigurada pela guerra:

(...) bombardeamentos como os do Domingo passado, em que trezentos e cinquenta aviões ingleses lançaram meio milhão de quilos de dinamite sobre Ijmuiden e as casas estremeceram como as folhas com o vento. E o terror das epidemias que grassam no país! (....) A população forma bichas para comprar hortaliças ou seja o que for. Os médicos não podem visitar os seus doentes, porque lhes roubaram o automóvel ou a bicicleta. Ouve-se falar de pequenos furtos e de roubos em grande escala, e eu pergunto a cada passo o que foi feito da honestidade dos holandeses, quase proverbial? Crianças dos oito aos onze anos partem os vidros das habitações alheias e tiram tudo o que lhes vem parar às mãos. Ninguém tem coragem de deixar ficar a sua casa abandonada durante cinco minutos, pois, ao voltar, pode muito bem encontrá-la vazia. Todos os dias se lêem nos jornais anúncios em que se prometem gratificações pela entrega de coisas roubadas, máquinas de escrever, tapetes persas, relógios eléctricos, tecidos, etc, etc. Os relógios das ruas são desmontados, e até se tiram os telefones das cabinas sem deixar ficar um pedaço de fio sequer.
Evidentemente, não pode haver bom ambiente entre a população. O racionamento não chega. A invasão faz-se esperar, os homens têm de ir para a Alemanha. As crianças estão subalimentadas e doentes. Quase toda a gente usa roupa e calçado de má qualidade. Umas solas “negras” custam cinquenta florins. Mas os sapateiros raras vezes aceitam freguesia ou então levam quatro meses a compor os sapatos se estes, entretanto, não forem roubados.
Uma coisa boa: as sabotagens contra a ocupação aumentam à medida que a alimentação piora e as condições se tornam mais severas. Os funcionários da distribuição de víveres e de outras repartições ajudam, em grande parte, a população, mas também há traidores que levam gente às prisões. Contudo, felizmente, são poucos os holandeses que estão do lado mau.
“Diário”, de Anne Frank, Edição “Livros do Brasil”


azuki
 
segunda-feira, janeiro 12, 2009
 
sentido prático

A vivacidade do diário está também no corte abrupto com que Etty talha as divagações, os medos, as certezas e as dúvidas que pontuam os dias. No dia 12 de Dezembro de 41, de manhã, depois de tantas ideias, calma, tempestade, Deus, promessas, harmonia, humildade, está na hora de levantar a mesa do pequeno-almoço… e pintar um bocadinho a fuça. p.154
Pois.


clarinda

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  um outro diário de uma jovem judia na Holanda da 2ª GM
Não parecerá inconcebível ao Mundo, depois da guerra – digamos dez anos depois -, o que nós, os judeus, contarmos sobre a nossa vida aqui, as nossas conversas e as nossas refeições?
“Diário”, de Anne Frank, Edição “Livros do Brasil”


Esta é uma das leituras da adolescência a que não imaginava regressar, mas apeteceu-me, e ainda bem que o fiz. Anne é bem mais nova do que Etty (tem entre 13 e 15 anos) e vive as crises interiores próprias da adolescência, mas possui uma maturidade elevada, que nos prende ao seu belo testemunho, e que é fruto de sensibilidade e inteligência raras, bem como das condições de enorme adversidade que enfrentou nos 2 anos em que viveu “mergulhada”. Não se refugia em Deus como Etty, mas também é grata pela existência, apesar de a realidade da guerra e da perseguição aos judeus não lhe serem de todo estranhas. Sim, Anne estava bem ciente do perigo que corriam os 8 habitantes do “anexo” (Anne, sua irmã e pais, mais 4 pessoas) e os seus “queridos protectores”. Ela é viva, esperta, alegre apesar de tudo, trabalhadora, ávida de conhecimento, as suas palavras são pródigas de interrogações, mas também de dignidade e de planos para o futuro. Neste diário, introspectivo como todos os diários serão, as referências ao exterior estão mais presentes do que nos textos de Etty, e consistem na descrição das condições de vida no anexo, da situação do País e dos avanços dos aliados. No dia 4 de Agosto de 1944, a polícia nazi assaltou o anexo e prendeu todos os seus habitantes. Anne morreu em Março de 1945, em Bergen-Belsen, dois meses antes da libertação da Holanda.

azuki
 
domingo, janeiro 11, 2009
 
uma aprendizagem ou o livro dos prazeres*

Claro que a escrita de um diário deixa apenas fragmentos em que nós, leitores, acreditamos até prova em contrário. Ler esses fragmentos datados - ano, mês, dia, hora e por vezes local - é apropriar-se do caminho que o autor vai trilhando na sua luta interior; é sentir a pedra que lhe rasga a pele; é apreciar a flor que lhe aquece a alma e acalma a mente. Como esta:


Faz o que a tua mão e o teu espírito acham que deves fazer, mergulha na hora que passa e não te ponhas a remexer as próximas horas com o teu pensamento, os teus medos e as tuas preocupações. p.128


O Porto encheu-se de sol, bom domingo!

* Clarice Lispector



clarinda

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sábado, janeiro 10, 2009
  se nos transformarmos em cães selvagens como eles, então já não faz diferença nenhuma
“Ainda temos de passar por muito. Havemos de ficar paupérrimos, e se este processo continuar, arruinados, e diariamente dá-se um decréscimo de energias, não só devido aos medos e incertezas, mas também a coisinhas mesquinhas como o ficar cada vez mais excluído de comprar em lojas e percorrer distâncias a pé, o que para muitos que eu conheço é já um sacrifício enorme. A nossa aniquilação aproxima-se furtivamente por todos os lados, e dentro em breve o círculo cerrar-se-á à nossa volta, o que fará com que a ajuda de gente bem-intencionada deixe de ser possível. Ainda existem muitos buracos, mas hão-de ser tapados.
6 de Julho de 1942

Domingo de manhã, o corretor da Bolsa na esplanada do Leo Krijn: “Temos de rezar com todo o coração para que venha uma coisa melhor, enquanto temos mente para desejar uma coisa melhor. Porque, se por causa do nosso ódio, nos transformarmos em cães selvagens como eles, então já não faz diferença nenhuma.”
7 de Julho de 1942

“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008


Chamam-se “O Terror Nazi”. São quatro livros vermelhos, com capa de suástica grande e brilhante e um mapa dos campos de concentração na contracapa, inteiramente dedicados a'Os Médicos da Morte. É lá que, entre muitas informações relevantes (p.e., argumentações e veredictos de Nuremberga), aprendo coisas sem interesse nenhum, porque de enumerar, quantificar, escalpelizar a barbárie dessa gente se trata, as múltiplas indizíveis experiências com que os médicos nazis torturaram os “voluntários” judeus, mas também ciganos, prisioneiros políticos, homossexuais,…. Confesso a censura, que não posso nem quero contrariar: nesta casa, as suásticas nunca ficam à vista.

azuki
 
sexta-feira, janeiro 09, 2009
  sobre o sofrimento
Penso que há pessoas que se comprazem com o choradinho incessante e que, ou se dão bem sozinhas, ou dispõem de qualidades extraordinárias, ou têm a sorte de possuir bons amigos e uma família decente. Para os companheiros de quem sofre, não é fácil saber distinguir entre o momento em que devemos oferecer o ombro e deixar chorar, da altura em que é nosso dever repreender, contrariar e estimular na direcção da positividade, retirando-os da concha dolorosa em que se aninharam (no meio de tudo isto, ajuda imensamente ter a carga genética certa, a produzir endorfinas nas quantidades desejáveis, tal como o poderá constatar quem conhece a acção dos anti-depressivos).

Se não há vida sem sofrimento, há certamente formas sábias de o encarar:

- e sabes, Ru, além do mais ainda tenho uma característica infantil que faz com que eu ache constantemente a vida bela e que talvez seja a razão por que consigo suportar tudo tão bem.
“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008


azuki
 
 
sobre o amor ou sobre spier

“Todas as raparigas e mulheres em seu redor são doidas por ele, mas sou eu, a que ele conhece há menos tempo, a única a ser tão íntima com ele”. p.89




clarinda

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quinta-feira, janeiro 08, 2009
 
revelações

Escrever um diário é estabelecer um compromisso com a verdade. De que vale um diário se o que lá estiver não corresponder ao que sentimos? Como quando fomos àquela entrevista e saímos um trapo, ou quando o nosso melhor amigo nos desiludiu, ou um sabor exótico nos encheu o dia, ou sentimos um enjoo pela conversa vomitada pela televisão, ou um olhar nos prendeu nas ameias de um castelo imaginário, ou apenas porque sofremos, ou amamos, ou somos.
Sim, é preciso perder a vergonha, ter coragem e começar.

Domingo, 9 de Março, 1941

Ora vamos a isto!


clarinda

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  Claro, é o extermínio total, mas suportemo-lo sobretudo com graciosidade.
Ah, ao fim e ao cabo temos tudo em nós: Deus e céu e inferno e terra e vida e morte e séculos, muitos séculos. Um cenário que muda e acções de acordo com as circunstâncias exteriores. Mas transportamos tudo connosco e as circunstâncias não são o factor decisivo, nunca o serão porque há-de haver sempre circunstâncias, boas e más, e é preciso aceitar o facto de haver circunstâncias: as boas e as más. O que não significa que uma pessoa não dedique a sua vida a tentar melhorar as más. Mas uma pessoa deve saber quais são os motivos que estão na origem da sua luta e deve começar por ela própria, cada dia de novo, por si mesma.
“Diário 1941-1943”, de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008


Etty conseguiu ser feliz num mundo dilacerado pelo horror e pelo medo, retirava prazer e beleza dos seus dias, aceitou serenamente o que não é aceitável. O seu exemplo de vida reforça a ideia de que podemos ser o nosso paraíso, ou o nosso inferno. Acho mesmo que este livro nos ajuda a ser felizes.

azuki
 
quarta-feira, janeiro 07, 2009
  utiliza cada minuto deste dia e transforma-o num dia frutuoso
(…) o modo como a pessoa lida interiormente com os acontecimentos da vida é o que determina o seu destino. Essa é a tua vida. Uma pessoa não conhece a vida de outra conhecendo só os factos exteriores. Os factos exteriores, oh, não são muito diferentes nas vidas de cada um. Para conhecer a vida de alguém é preciso conhecer os seus sonhos, os seus estados de espírito, saber que tipo de relação há entre ele e a mulher e a morte e as suas desilusões e as suas doenças.
27 de Fevereiro de 1942
“Diário 1941-1943” (pag 171), de Etty Hillesum; Assírio & Alvim, 2008

A forma como esta mulher resolveu, não digo construir o seu destino (que foi semelhante ao de milhões de judeus), mas viver a sua circunstância, enfrentando-a, é notável. Estivesse ou não imbuída de misticismos exagerados ou de ilusões pueris, Etty conseguiu injectar-se uma calma e um sentimento de gratidão pela existência que lhe permitiram aceitar o que lhe estava reservado. Com hesitações, claro, e momentos de desalento, mas sem descontrolo, sem gritos, sem medos, sem confusões mentais, sem desistências, sem auto-comiseração, sem fugas. A coragem e a serenidade com que ela encarou a perspectiva do extermínio (da qual, estranhamente, estava convicta), a presença de espírito com que olhava para a morte, a intensidade com que vivia cada dia que passava e o prazer com que se despedia das pequenas “excelências da civilização”, a abnegação com que dispensou o abrigo do Conselho Judaico e se ofereceu como voluntária para o campo de trânsito Westerbork, as palavras de conforto que ainda lhe sobravam para os mais frágeis, não podem deixar de constituir um ensinamento e uma inspiração.

azuki
 
 
e o segundo rosto

Mestre, seu mestre, Julius Spier foi-o sempre. Tudo começou por uma necessidade de que alguém lhe pegasse pela mão e se ocupasse dela. E quem lhe pegou pela mão foi ele. Dizia ser a mão o segundo rosto.
Etty era, no entanto, uma aluna muito autónoma, defensora do seu próprio espaço. De tal forma que a determinada altura recusa a abordagem espiritual ligada à psicoquirologia.

Mas ensinar a pronunciar com naturalidade o nome de Deus, como ele lhe ensinou, é muito belo.


clarinda

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terça-feira, janeiro 06, 2009
 
a segunda pátria

Se fosse viva, Etty deveria gostar do Leitura Partilhada. Aqui também vivemos a literatura como uma segunda pátria. Diz José Tolentino Mendonça, no prefácio da obra, que um dos aspectos mais comoventes é perceber o lugar da Literatura na viagem imensa que Etty realiza e que este diário está cheio de referências às horas de leitura compulsiva... horas de explicitado prazer.
Compreendemos.
Os autores que lia?... Bem, o prefaciador grafa literatura com maiúscula.


clarinda

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  outra dúvida
Quem é a Simone Weil que morreu num hospício inglês em 1943?

azuki
 
segunda-feira, janeiro 05, 2009
 
o céu está sempre aberto?

Ainda não percebi como a leitura deste Diário me marcou. Penso que foi algo muito subtil, frases por onde se passa sem se dar conta e que ficam ali a fermentar. E de repente o nosso mundo cinzento ou colorido, conforme as vivências, encontra-a brilhante e essencial à vida. Por exemplo, quando lemos Ovídio aqui há uns meses, gostei particularmente de um verso do livro VIII: Ao menos o céu está sempre aberto. Iremos por aí! Este verso, ligeiramente modificado, ouvi-o da boca de Elisabete I, rainha de Inglaterra, incluído num tenso diálogo com o seu conselheiro espiritual aquando da invasão da Invencível Armada de Filipe I de Espanha, no filme Elisabeth-The Golden Age. Este mesmo céu que serviu a Ícaro e a Elisabete, serve também a Etty para conservar o seu direito absoluto e inexpugnável à liberdade, apesar de tudo.

Junho de 1942,

Esta manhã passei de bicicleta pelo Stadionkade e desfrutei do vasto céu ali nos limites da cidade e inspirei o ar fresco e não racionado.


clarinda

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  uma dúvida
Porque se chama de 1941-1943, um diário cuja última entrada data de Out/42…?

azuki
 
domingo, janeiro 04, 2009
 
no país das tupilas




A Rua Gabriël Metsu (…) tem alguma coisa da atmosfera delicada e impávida que nessas imagens nos surpreende: «a copa das árvores, achei-as ao acordar… Os botões de tulipas, o vermelho e o branco, inclinados um para o outro… os ramos negros contrastando com o ar luminoso e, mais longe, o Rijksmuseum».


nota: imagem da net, texto ainda do site indicado mais abaixo.


clarinda

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sábado, janeiro 03, 2009
 
a rapariga de amesterdão - sublinhados


A 9 de Março de 1941, quando Esther (Etty) Hillesum começou a escrever, no primeiro dos oito cadernos de papel quadriculado, o texto que viria a ser o seu Diário, estava-se longe de pensar que começava aí uma das aventuras literárias e espirituais mais significativas do século. Ela tinha vinte e sete anos.

Nesse domingo de Março, em que principia a sua narrativa, ela vive no número 6 da Rua Gabriël Metsu, já independente dos pais.


A Rua Gabriël Metsu contorna a esplanada verde do Rijksmuseum, onde estão as pinturas de Vermeer, de Pieter de Hooch, de Rembrandt.

É impossível não aproximar o percurso que faz Etty Hillesum daquele vivido também por Simone Weil. São contemporâneas, ambas judias, debatendo-se por salvaguardar o sol interior num século de horas sombrias, ambas escritoras.

Mas há uma diferença na iconografia. Simone de Beauvoir conta que Weil se vestia como quem traja uma farda, cancelando, numa opção moral implacável, os sinais que a pudessem distinguir a ela, filha de uma Paris burguesa, da mais humilde operária fabril (coisa que, aliás, ela não sossegou enquanto não foi). As imagens de Etty são as de uma mulher bem diferente: elegante, feminina, com um toque de mundaneidade, e uma inteligência também física.

texto completo aqui

clarinda

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sexta-feira, janeiro 02, 2009
 



The Etty Hillesum research Centre is named after Etty Hillesum (Middelburg 1914-Auschwitz 1943). As a young Jewish woman midway WWII, Hillesum had the ambition to become a writer. She was uncertain, however, about her own talents to do so. On request of her "psychotherapist" Julius Spier (Frankfurt a/M 1887 - Amsterdam 1942) she started to keep a diary from March, 8 1941 onwards.

Besides exercises to order her chaotic life, this diary became for her a place of writing. When she left her home in Amsterdam for an insecure future, she gave her writings to a female friend who lived with her. She in turn gave them to the writer Klaas Smelik (Den Helder 1897- Amsterdam 1986). He would try to publish the Diaries if she would not return from her imprisonment.

fonte: EHOC


Actualmente, Etty Hillesum dá nome a uma Fundação em Amesterdão, e a um Centro de Pesquisa na Universidade de Haia, que estuda a obra e os contributos da escritora.



belém

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quinta-feira, janeiro 01, 2009
 
Antes de mais Bom Ano a todos que aqui aportam! Umas poucas palavras neste dia feriado mundial da paz. Ainda mal nos despedimos de Knut Hamsun e já entramos num outro mundo surpreendente e medonho: o Holocausto. Saibamos nós tudo ou nada desse momento recente da história da humanidade, Etty Hillesum deixa-nos um testemunho a que não podemos ficar indiferentes. Se, por um lado, nos relata os horrores que a iam sufocando; por outro, deixa-nos uma extraordinária mensagem de amor à vida. Que mais podemos desejar que não seja perceber como o consegue?

Nota: deixo aqui um
link para quem ainda não conhece nada de Etty (diminutivo de Esther).


clarinda

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O QUE ESTAMOS A LER

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PROXIMAS LEITURAS

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LEITURAS NO ARQUIVO

"ULISSES", de James Joyce (17 de Julho de 2003 a 7 de Fevereiro de 2004)

"OS PAPEIS DE K.", de Manuel António Pina (1 a 3 de Outubro de 2003)

"AS ONDAS", de Virginia Woolf (13 a 20 de Outubro de 2003)

"AS HORAS", de Michael Cunningham (27 a 30 de Outubro de 2003)

"A CIDADE E AS SERRAS", de Eça de Queirós (30 de Outubro a 2 de Novembro de 2003)

"OBRA POÉTICA", de Ferreira Gullar (10 a 12 de Novembro de 2003)

"A VOLTA NO PARAFUSO", de Henry James (13 a 16 de Novembro de 2003)

"DESGRAÇA", de J. M. Coetzee (24 a 27 de Novembro de 2003)

"PEQUENO TRATADO SOBRE AS ILUSÕES", de Paulinho Assunção (22 a 28 de Dezembro de 2003)

"O SOM E A FÚRIA", de William Faulkner (8 a 29 de Fevereiro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. I - Do lado de Swann)", de Marcel Proust (1 a 31 de Março de 2004)

"O COMPLEXO DE PORTNOY", de Philip Roth (1 a 15 de Abril de 2004)

"O TEATRO DE SABBATH", de Philip Roth (16 a 22 de Abril de 2004)

"A MANCHA HUMANA", de Philip Roth (23 de Abril a 1 de Maio de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. II - À Sombra das Raparigas em Flor)", de Marcel Proust (1 a 31 de Maio de 2004)

"A MULHER DE TRINTA ANOS", de Honoré de Balzac (1 a 15 de Junho de 2004)

"A QUEDA DUM ANJO", de Camilo Castelo Branco (19 a 30 de Junho de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. III - O Lado de Guermantes)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2004)

"O LEITOR", de Bernhard Schlink (1 a 31 de Agosto de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. IV - Sodoma e Gomorra)", de Marcel Proust (1 a 30 de Setembro de 2004)

"UMA APRENDIZAGEM OU O LIVRO DOS PRAZERES" e outros, de Clarice Lispector (1 a 31 de Outubro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. V - A Prisioneira)", de Marcel Proust (1 a 30 de Novembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA", de José Saramago (1 a 21 de Dezembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A LUCIDEZ", de José Saramago (21 a 31 de Dezembro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VI - A Fugitiva)", de Marcel Proust (1 a 31 de Janeiro de 2005)

"A CRIAÇÃO DO MUNDO", de Miguel Torga (1 de Fevereiro a 31 de Março de 2005)

"A GRANDE ARTE", de Rubem Fonseca (1 a 30 de Abril de 2005)

"D. QUIXOTE DE LA MANCHA", de Miguel de Cervantes (de 1 de Maio a 30 de Junho de 2005)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VII - O Tempo Reencontrado)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2005)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2005)

UMA SELECÇÃO DE CONTOS LP (1 a 3O de Setembro de 2005)

"À ESPERA NO CENTEIO", de JD Salinger (1 a 31 de Outubro de 2005)(link)

"NOVE CONTOS", de JD Salinger (21 a 29 de Outubro de 2005)(link)

Van Gogh, o suicidado da sociedade; Heliogabalo ou o Anarquista Coroado; Tarahumaras; O Teatro e o seu Duplo, de Antonin Artaud (1 a 30 de Novembro de 2005)

"A SELVA", de Ferreira de Castro (1 a 31 de Dezembro de 2005)

"RICARDO III" e "HAMLET", de William Shakespeare (1 a 31 de Janeiro de 2006)

"SE NUMA NOITE DE INVERNO UM VIAJANTE" e "PALOMAR", de Italo Calvino (1 a 28 de Fevereiro de 2006)

"OTELO" e "MACBETH", de William Shakespeare (1 a 31 de Março de 2006)

"VALE ABRAÃO", de Agustina Bessa-Luis (1 a 30 de Abril de 2006)

"O REI LEAR" e "TEMPESTADE", de William Shakespeare (1 a 31 de Maio de 2006)

"MEMÓRIAS DE ADRIANO", de Marguerite Yourcenar (1 a 30 de Junho de 2006)

"ILÍADA", de Homero (1 a 31 de Julho de 2006)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2006)

POESIA DE ALBERTO CAEIRO (1 a 30 de Setembro de 2006)

"O ALEPH", de Jorge Luis Borges (1 a 31 de Outubro de 2006) (link)

POESIA DE ÁLVARO DE CAMPOS (1 a 30 de Novembro de 2006)

"DOM CASMURRO", de Machado de Assis (1 a 31 de Dezembro de 2006)(link)

POESIA DE RICARDO REIS E DE FERNANDO PESSOA (1 a 31 de Janeiro de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 28 de Fevereiro de 2007)

"O VERMELHO E O NEGRO" e "A CARTUXA DE PARMA", de Stendhal (1 a 31 de Março de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 30 de Abril de 2007)

"A RELÍQUIA", de Eça de Queirós (1 a 31 de Maio de 2007)

"CÂNDIDO", de Voltaire (1 a 30 de Junho de 2007)

"MOBY DICK", de Herman Melville (1 a 31 de Julho de 2007)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2007)

"PARAÍSO PERDIDO", de John Milton (1 a 30 de Setembro de 2007)

"AS FLORES DO MAL", de Charles Baudelaire (1 a 31 de Outubro de 2007)

"O NOME DA ROSA", de Umberto Eco (1 a 30 de Novembro de 2007)

POESIA DE EUGÉNIO DE ANDRADE (1 a 31 de Dezembro de 2007)

"MERIDIANO DE SANGUE", de Cormac McCarthy (1 a 31 de Janeiro de 2008)

"METAMORFOSES", de Ovídio (1 a 29 de Fevereiro de 2008)

POESIA DE AL BERTO (1 a 31 de Março de 2008)

"O MANUAL DOS INQUISIDORES", de António Lobo Antunes (1 a 30 de Abril de 2008)

SERMÕES DE PADRE ANTÓNIO VIEIRA (1 a 31 de Maio de 2008)

"MAU TEMPO NO CANAL", de Vitorino Nemésio (1 a 30 de Junho de 2008)

"CHORA, TERRA BEM-AMADA", de Alan Paton (1 a 31 de Julho de 2008)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2008)

"MENSAGEM", de Fernando Pessoa (1 a 30 de Setembro de 2008)

"LAVOURA ARCAICA" e "UM COPO DE CÓLERA" de Raduan Nassar (1 a 31 de Outubro de 2008)

POESIA de Sophia de Mello Breyner Andresen (1 a 30 de Novembro de 2008)

"FOME", de Knut Hamsun (1 a 31 de Dezembro de 2008)

"DIÁRIO 1941-1943", de Etty Hillesum (1 a 31 de Janeiro de 2009)

"NA PATAGÓNIA", de Bruce Chatwin (1 a 28 de Fevereiro de 2009)

"O DEUS DAS MOSCAS", de William Golding (1 a 31 de Março de 2009)

"O CÉU É DOS VIOLENTOS", de Flannery O´Connor (1 a 15 de Abril de 2009)

"O NÓ DO PROBLEMA", de Graham Greene (16 a 30 de Abril de 2009)

"APARIÇÃO", de Vergílio Ferreira (1 a 31 de Maio de 2009)

"AS VINHAS DA IRA", de John Steinbeck (1 a 30 de Junho de 2009)

"DEBAIXO DO VULCÃO", de Malcolm Lowry (1 a 31 de Julho de 2009)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2009)

POEMAS E CONTOS, de Edgar Allan Poe (1 a 30 de Setembro de 2009)

"POR FAVOR, NÃO MATEM A COTOVIA", de Harper Lee (1 a 31 de Outubro de 2009)

"A ORIGEM DAS ESPÉCIES", de Charles Darwin (1 a 30 de Novembro de 2009)

Primeira Viagem Temática BLOOMSDAY 2004

Primeira Saí­da de Campo TORMES 2004

Primeira Tertúlia Casa de 3 2005

Segundo Aniversário LP

Os nossos marcadores

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