Leitura Partilhada
sábado, dezembro 31, 2005
 

FELIZ 2006
 
 
“A Selva” é um romance que nunca mais esqueço. Não posso. Raramente li uma obra com um impacto físico tão evidente. A feroz veracidade contida no relato dos dias e na descoberta do horror, deixavam-me viscosa de suor, trémula de medo, ardente de calor, cega de verde. Acompanhar o pensamento de um rapaz, com a vida à flor da pele, cheio de ilusão e de esperança e febril de projectos, sentir a sua dor física num desempenho cruel e o seu desvario mental numa vivência claustrofóbica, foi uma experiência que me deixou completamente desorientada. Senti, de forma profunda, o estrangulamento emotivo que o protagonista sofria por conhecer a extrema precaridade da vida. Nos confins da terra, ele atingiu o limite da sobrevivência e, no limiar da vida, conheceu a realidade da morte. De olhos abertos, ele entrou directamente para a voragem do mundo. E eu, na placidez do meu sofá, vi o inferno.

Troti
 
sexta-feira, dezembro 30, 2005
 
"A natureza recusa-se a simpatizar com as nossas penas"

"A Natureza não quer saber para nada da lógica, da nossa lógica humana: tem a sua própria lógica, que nós não reconhecemos e pela qual nem sequer damos até sermos esmagados debaixo das suas rodas."

Thoreau

Em : Jornal das Letras- 3-16 de Agosto 2005- Artigo de Eugénio Lisboa

Troti
 
 
"It is its profound humanity, its truthfulness in the reporting of details of experience, its observation, its acute and unvarnished account of the life of the poor seringueros (rubber extractors); a total absence of commentary which lets the facts affect the reader directly, and an authenticity of speech so scrupulous that the least scrap of dialogue between these simple and primitive coloured people lost in the depths of the forest is touching and convincing."
Blaise Cendrars


Troti
 
 
Não cheguei a tempo de participar na leitura dessa fabulosa SELVA do Ferreira de Castro, mas talvez vá a tempo de participar com esta fotografia





Mário Ferreira
 
 
Estica (ele mesmo)


-Larga-me! Seu Juca era tão amigo dele… Que coisa miserável!
Humilde na sua serenidade, o olhar baixo, como alheio à cólera que o alvejava, Tiago murmurou:
- Eu também gostava muito do patrão. Ele me podia até matar que eu não fugia. Era mesmo amigo dele. Mas Seu Juca se desviou…Estava a escravizar os seringueiros. Tronco e peixe-boi no lombo, só nas senzalas. E já não há escravatura…
(pág. 246)
Sim, deixarei a Selva e guardarei na memória alguns dos momentos mais impressivos desta leitura. Prestarei uma homenagem ao Estica pela mensagem que transmite com a sua atitude. Parece estranho mas é importante que se saiba ‘já não há escravatura…’
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foto daqui
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laerce
 
  Deixar a Selva

Mas não há forma de a deixar completamente. O verde, a terra, os sons... passa tudo a fazer parte de nós.

leitora
 
 
”Tenho aprendido muito nos últimos tempos. Sobretudo desde que vim para aqui...
a Humanidade está longe ainda da elevação colectiva que eu sonho para ela. Mas a evolução é coisa tão lenta e a vida de cada um tão pequena, que eu, às vezes, penso que a sede de justiça que há por toda a parte acabará por marchar à frente...
Eu, hoje, sou diferente do que fui... Sinto que mudei bastante. Há muitas coisas que eu não dava por elas e agora dou. Penso que têm razão os que querem um mundo mais justo.”

(p.259)

Troti
 
 
“Era certo que os homens são bons ou maus conforme a posição em que se encontram perante nós e nós perante eles; e falso o indivíduo-bloco, o indivíduo sem nenhuma contradição, sempre, sempre igual no seu procedimento.”
(p.259)

Troti
 
quinta-feira, dezembro 29, 2005
 
Estica (por Alberto)

Era Tiago, que passava perto, em direitura ao igarapé. Levava cara alegre e ia trauteando, pastosamente, numa monótona canção. Alberto fixou-o. Também aquele!Vingava-se o sórdido fantoche, dos gracejos de Firmino, de Manduca, de Romualdo, de todos os outros, de todos os que lhe chamavam “Estica”! Ficou a segui-lo com a vista e nunca, como agora, o velho negro, com a sua perna coxa, a pele engelhada, a boca de sapo, lhe parecera tão grotesco e tão hediondo. Ah, não poder sair imediatamente, imediatamente dali!
(pág.238)


Por mim digo apenas: ‘as aparências iludem’. Acontece imensas vezes.
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Igarapé na seca
"Os rios são as artérias da Amazónia, os igarapés são as veias."
...
laerce
 
 
“Não havia dinheiro que pagasse os seus sacrifícios em Todos-os-Santos! Nenhum, nenhum dinheiro” Só ele sabia o que tinha sofrido”
(p.258)

Troti
 
 
“Ah, quando ele pudesse recordar, longe dali, o pesadelo! Que sensação teria quando pensasse naquilo em Lisboa, a uma mesa solitária de café, ou subindo sózinho a Avenida da Liberdade, como fazia outrora, ao cair da noite...Sim, a selva era bela, majestosa, mesmo deslumbrante. E era rica, havia de ser fantasticamente rica também, mas um dia – um dia que vinha ainda longe. Entretanto, toda a sua grandeza esmagaria, toda a sua deslumbrância seria volúpia do primeiro contacto, logo desvanecida pela monotonia; e os anónimos desbravadores iriam caindo, inexoravelemente, sob as febres palustres, trespassados pelas flechas envenenadas, desvairadas pela ausência do amor – escravos, pobres, miseráveis, ali onde a natureza erguia as suas mais fastigiosas pompas!"
(p.241)

Troti
 
 
“Não havia certamente limite algum para as baixesas a que um ser humano podia descer, se o escravizavam e privavam de tudo quanto era essencial à vida.”
(p.233)

Troti
 
 
“Em muitas das suas expressões, a vida rastejava ainda, em tanto mundo e ali mesmo, à altura dos pés humanos; e não era decerto com os velhos processos, já experimentados durante dezenas de séculos, que ela poderia ascender aos níveis que o cérebro entrevia. Não era, decerto, no que estava feito, era no que estava por fazer, que o homem viria a encontrar, talvez, o melhor de si próprio.”
(p.226)

Troti
 
quarta-feira, dezembro 28, 2005
 
“...buscando o equilíbrio que se lhe negava, discorria que naquela natureza o homem pertencia menos a si próprio do que em qualquer outra parte."
(p.201)

Troti
 
 
“O homem debatia-se no vácuo.”
(p.187)

Troti
 
 
“Morta a ilusão pelo contacto diário com a miséria...”(p.175)

Troti
 
terça-feira, dezembro 27, 2005
  A metamorfose
Alberto vai mudar de opinião, será uma verdadeira revelação; e nisto o romance é notável. No fundo será a renovação de uma ética pessoal. Não podemos esquecer que participou na revolta de Monsanto.
Irá deixar de defender a superioridade do Homem perante o seu semelhante.

“ E sorria, depreciativamente, ao pensar no apostolado da democracia, nos defensores da igualdade humana, que ele combatera e o haviam atirado para o exílio. “Retóricos perniciosos! Queria vê-los ali, ao seu lado, para lhes perguntar se era com aquela humanidade primária que pretendiam restaurar o mundo.
E para quê? Para quê? Possuíam alma essas gentes rudes e inexpressivas, que atravancavam o mundo com a sua ignorância, que tiravam à vida colectiva a beleza e a elevação que ela poderia ter...Ele e os seus, declarados inimigos da igualdade, defensores de elites, eram bem mais amigos dessa pobre gente do que os outros, os que ludibriavam com a ideia duma fraternidade e dum bem-estar que não lhe davam nem lhe podiam dar”.
A metamorfose será fruto da prática, do sentir na carne das agruras da desigualdade social e do despotismo do Homem que se sente superior perante o outro semelhante (são assim Juca, Balbino, Caetano, Macedo e o Alberto do início do romance).
Seria interessante colocar a trabalhar na Selva todos aqueles que defendem ideais de direita conservadora e anti-democata.
A todos os leitores do LP e respectivos colaboradores um óptimo Ano de 2006, com maravilhosas leituras.
Castela

Nota: Alberto vai mudar...mudar.
 
 
reflexo



Estamos quase a chegar ao fim do mês e a leitura de A Selva está concluída. Sem pretender ir além das minhas impressões de leitura, sem dúvida que a personagem principal é a selva misteriosa, cruel, maternal, humana, exagerava se dissesse demasiado humana? Da experiência vivida pelo autor/personagem Alberto, fica-nos a imagem de um inferno, magistralmente materializado no incêndio, de onde consegue sair para contar como foi. Há outra personagem sobre a qual me detenho com curiosidade, o Estica.
...
laerce
 
 
“Crescente indolência, sobre um fundo psíquico de irremediabilidade, lhes amortecia a fala. Era uma angústia densa, uma tristeza espessa ver a selva enervada pela invasão pluvial – toda a folha luzidia, pinga, pinga, marulha e estremece. ...A humidade furava da epiderme até às vísceras, imergindo em banho frio os próprios sentimentos....Sempre, sempre, os mesmos caules escorrentes, as mesmas frondes rumorejantes, o solo apardaçado, as goteiras aos milhões e, para além, o obstáculo multiforme que não deixava passar os olhos. Vinha de cima, de baixo, de todos os desvãos, de todos os rincões, a intensa melancolia que a tudo trespassava. Agora, a selva não fabricava terror; não tinha expectativa, não se encontrava em suspensão; desvanecera-se, por momentos, o seu mistério e não se interceptavam já estranhos conciliábulos. Era um monstro que estava ali, pesado, inofensivo, a bramir um sofrimento que não despertava piedade. E, contudo, nunca, como então, sugeria a vontade de morrer.
...
A tristeza brotava desse verde eterno e sempre igual, que oprimia, que sufocava com a sua pertinácia e exuberância."

(p.174)

Troti
 
 
“Na sua mudez, aquele mundo vegetal tinha cruéis egoísmos, ferocidades insuspeitadas e tiranias inconfessáveis. Viver! Viver, à sua custa ou à custa de outrém, era a ânsia de todo o ramo, de toda a folha, por mais despersonalizados que se apresentassem aos olhos de quem os via.”
(p.168)

Troti
 
segunda-feira, dezembro 26, 2005
 



boto cor-de-rosa



imagem daqui

Ao crepúsculo, o rio, encafuado o troço enorme entre duas curvas, parecia lago grandioso e deslizava com son^mbula lentidão. De quando em quando, os botos, em folgança ou aventura de amor, assomavam à superfície os lombos luzidios, num rápido corte de água, logo repetido mais além.
(pág. 163)
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Espero que Alberto me desculpe o desviar-me do seu drama, do drama dos seringueiros, da história da borracha. Ao ler a Selva, não posso deixar de a querer conhecer mesmo daqui, nesta rede imensa.
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laerce
 
 
"Para além da barraca não havia o recurso duma excursão desanuviadora, uma boca compreensível que ludibriasse as horas. As “estradas” lançavam a sua curva a oito ou dez quilómetros e do que estava mais adiante nada se conhecia. Era a selva virgem e infindável..."
(p.162)

Troti
 
 
“Alberto relera todos os livros que trouxera, escrevinhara as suas emoções de desesperado em todo o papel em branco que encontrara e conhecia já, pelas costas, todas as cartas do baralho com que enchia algumas horas de solidão....Desleixara-se...Não valia a pena! Não valia a pena!.
(p.158/159)

Troti
 
domingo, dezembro 25, 2005
 
"Nenhuma árvore alguma daquelas lhe dera uma sugestão de beleza, levando-lhe ao espírito as grandes volúpias íntimas.. Ali não existia mesmo a árvore. Existia o emaranhado vegetal, louco, desorientado, voraz, com alma e garras de fera esfomeada. Estava de sentinela, silencioso, encapotado, a vedar-lhe todos os passos, a fechar-lhe todos os caminhos, a subjugá-lo no cativeiro. ...A selva não aceitava nenhuma clareira que lhe abrissem e só descansaria quando a fechasse novamente...Seria pelo esgotamento das seringueiras, seria pela intervenção dos selvagens, chacinando os desbravadores, seria por outro motivo – mas seria! A ameaça andava no ar que se respirava, na terra que se pisava, na água que se bebia, porque ali somente a selva tinha vontade e imperava despoticamente. Os homens eram títeres manejados por aquela força oculta, que eles julgavam, ilusoriamente, ter vencido com a sua actividade, o seu sacrifício e a sua ambição.”
(p.158)

Troti
 
sábado, dezembro 24, 2005
  Feliz Natal!!
azuki
 
 
“Alberto pensava na sua conta, no que podia acontecer, no que não aconteceria jamais –fila de hipóteses tão interminável como aqueles troncos de todos os tamanhos que o farol ia arrancando à negridão da selva. “Dez quilos por semana, trinta mil-réis...Cento e vinte no fim do mês. Mas as despesas? As despesas...E o Inverno, em que não se fazia quase nada? Quantos anos, quantos, para pagar a dívida, mesmo que tivesse sorte e saúde!”
(p.154)

...
Alberto tinha a sensação de se encontrar num cárcere, sem pena fixada, sem dia marcado para a abertura da porta. Eram as cifras seu tormento, elos da corrente que ali o prendia ao tempo e o levava a íntimas inquirições: “Um conto, setecentos e quarenta mil réis...Dois anos? Cinco anos? Ou toda a vida?”
Essa falta de prazo tornava-se obsessiva. Não se adaptava. Sentia-se sempre provisório, desejoso de partir e desesperava-se ao verificar que ainda há pouco chegara...Era outro o meio, outra a terra e outros os seres...Era um mundo à parte, terra embrionária, geradora de assombros e tirânica, tirânica!”
(p.157/158)

Troti
 
sexta-feira, dezembro 23, 2005
 
parintintins





-( …) Antigamente era costume organizar um grupo de homens bem armados e mandá-los em perseguição dos parintintins. Mas o Rondon escreveu a pedir que não se tornasse a fazer isso.. E eu acho que o seu pedido é justo. Está provados que estes índios não têm medo e serão precisos muitos anos e muitos sacrifícios para civilizá-los. Mandar quatro ou cinco homens persegui-los só lhes acirra o ódio e mais nada.(…)
- A tribo dos parintintins é grande? (pág. 204)


A questão das nações indígenas brasileiras continua actual no Brasil de hoje.


foto daqui



...
laerce
 
 
“ A selva era, agora, um jogo fantástico e espectaculoso de sombras e claridades. O sol, onde encontava furo, derramava-se em cataratas por entre o arvoredo, a branquear irregularmente os troncos, galhos e folhas e dando transparência aos rincões obscuros. No próprio chão, ao longe, vislumbravam-se, por esta e aquela fresta, grandes toalhas de luz, sobre as quais se banqueteavam asas multicolores. À esquerda e à direita, surgiam constantemente galerias, salões e criptas, de colunas e cúpulas arbitrárias, que não se assinalavam a outras horas do dia, quando a floresta parecia una sob o domínio da sombra.. Assim iluminada, causava menos terror, perdendo grande parte do mistério, denso e mórbido, que exalava ao cair da tarde."
(p111/112)

Troti
 
quinta-feira, dezembro 22, 2005
 
"- Mas, então, os tais índios existem?
...
- E onde é que moram os índios?
...
- Mas como é que eles vêm aqui, se moram tão longe?
...
- Mas os índios vêm cá todos os anos?
...
Quando não têm cabeça de civilizado para dançar, vêm buscar uma...
Quando não há cabeça de homem, levam de criança, de cachorro e de gato, de tudo que aparece...Não podem ver um civilizado...
Desejando ocultar o seu medo, Alberto hesitava em formular perguntas, mas não conseguia dominar-se:
- E porquê? Não sabe?
- Porque os homens civilizados tomaram conta da terra deles... Isto aqui...era dos parintintins...Nunca um homem está desansado, porque os parintintins são traiçoeiros...
- Mas nunca procuraram amansá-los?
-...Aquilo é bicho que só deixará de ser ruim quando desaparecer. Eu, se encontro algum, mato-o logo!
...
Alberto tinha o cérebro a escaldar, o coração em palpitações desordenadas. Já por mais de uma vez julgara ver o rosto do inimigo assomando entre a folhagem e, a cada nova sapopema, o seu receio aumentava: “Se eles estivessem ali?”

(p.107/111)

Troti
 
quarta-feira, dezembro 21, 2005
 
outras leituras



imagem daqui

Dava-se, então, o êxodo, mais trágico e numeroso do que o dos antigos hebreus nos domínios da cristandade. Iam caravanas sem fim ao longo da terra em fogo. O sertão ficava abandonado, com planuras ígneas e lombas a arderem também. (pág.136)

Ao ler esta passagem, veio-me à memória um dos livros que mais me marcaram: Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Não posso esquecer aquela aridez, aquelas imagens imensas de vazio, de fome e miséria. Muitos dos seringueiros são os retirantes do nordeste. Não posso esquecer a cadela Baleia nem todo o amor que esteve presente naquele gesto de misericórdia de Fabiano.

Os livros também falam uns com os outros.
...
laerce
 
 
Estavam perante uma árvore com alto saiote de ferimentos e cicatrizes. De tão martirizada, a sua casca desenvolvera-se mais na parte inferior do que em cima, como para se defender; e dir-se-ia postiço esse revestimento de rugas negras e de golpes ainda mal sarados, de onde brotavam filamentos de “sernambi”.
- Isto é que é a seringueira?
- É, é."

(p.108)

Troti
 
 
"A selva dominava tudo. Não era o segundo reino, era o primeiro em força e categoria, tudo abandonando a um plano secundário. E o homem, simples transeunte no flanco do enigma, vias-se obrigado e entregar o seu destino àquele despotismo.
...
Vista uma légua parecia ter-se visto tudo....E, contudo, havia ali uma variedade vegetal assombrosa, com milhentos indivíduos diferentes a confundirem-se e a engalfinharem-se mutuamente, como numa raiva surda, eviterna, mas quase sempre com a mesma expressão. Daquela bárbara grandiosidade e da sua estranha beleza, uma só forte impressão ficava: a inicial, que nunca mais se esquecia e nunca mais se voltava a sentir plenamente."

(p.107)

Troti
 
terça-feira, dezembro 20, 2005
 
vitórias-régias




Soltas na vasta superfície líquida, flutuavam as vitórias- régias, de que Alberto tanto ouvira falar: enormes ninfáceas redondas, de fundo plano e rebordos, pareciam verdes pandeiretas, com uma exuberante flor ao centro; e pela sua estranha forma sugeriam bandejas rituais deixadas por um cortejo de oferendas a um remoto deus aquático. (pág.125)

São lindas, não são?

...

laerce


 
  Natureza. Conseguir vê-la.
A todo o momento, em qualquer lugar, lá estão os seus detalhes extraordinários; nós, demasiado ocupados a aturdirmo-nos com coisas sem importância, só reparamos quando ela reage em estrondo… Tal como nos textos da Antiguidade Clássica, em que os sábios eram cegos, há alturas em que só olhando para dentro se consegue realmente ver; discrição, recato, introspecção, um certo isolamento, são formas privilegiadas de visão. Respeito, porque nos sentimos tão pequenos. Reverência, em breve inclinação perante a maravilha. Silêncio, silêncio. A natureza pede a nossa silenciosa admiração.

Bom dia!!
azuki
 
 
“A barraca tinha duas divisões: uma, onde Alberto dormira, alardeava no chão, por baixo das redes, uma esteira e, ao canto, um baú. A segunda, de mais estreiteza, era sala de estágio e recepções: outra esteira, dois caixotes vazios, para assento, e, dependurados na parede, os rifles. “
(p.104)

Troti
 
 
“Andaram mais uma hora, mais duas, zape-zape, no caminho intérmino...
Alberto...resistia sem queixa, como se o amor-próprio houvesse de tirar, da rude lição, uma íntima desforra....
O seu pensamento não tinha continuidade, fragmentava-se, tudo atraía e tudo abandonava à fadiga mental...
- Já estamos perto...Só falta meia hora...Só falta um quarto de hora...estamos a chegar mesmo...É aqui...”

(p.101)

Troti
 
segunda-feira, dezembro 19, 2005
 
“A selva escurecia rapidamente. O entrançado inferior diluía-se, perdia contornos e volumes na negridão que sobrevinha. Os recantos onde residia eterna sombra ampliavam-se, envolvendo e tragando os caules grossos e centenários. O verde rasteiro fora já absorvido; cá em baixo só pardejava a folhagem que a morte desprendera. A luz beijava agora apenas as franças mais altas, que se mostravam, finalmente, em toda a fantasia do seu recorte, sob um céu de azul morno e baço.
O silêncio tinha, enfim, uma síncope. A sela começava a falar no olvido da noite. Surgiam, por toda a parte, rumores estranhos e imprecisos...
Não dava melancolia o lusco-fusco; abafava apenas, como se fosse um cobertor imensurável estendido sobre a mata."

(p.98)

Troti
 
domingo, dezembro 18, 2005
  Os mortos de Manaus
"Febre tifóide, 6; difteria, 2; coqueluche, 2; sarampo, 1...lia automaticamente um folheto jogado sobre a mesa da redação.

Febre tifóide, 6; difteria, 2; coqueluche, 2...Pensei num pequeno grupo de engraxates que quase toda a noite se reúne na esquina da Avenida São João e Anhagabaú e canta sambas, fazendo a marcação com as escovas e as latas de graxa. São uns quatro ou cinco pretos que cantam assim pela madrugada, fazendo de seus instrumentos de trabalho instrumentos de música. Mas que poderia escrever sobre eles? Pensei também numa fita de cinema, num livro, numa determinada pessoa. Os assuntos passavam pela cabeça e iam-se embora sem querer ficar no papel. Febre tifóide, 6; difteria, 2; coqueluche, 2; sarampo, 2. São os mortos de Manaus. Apanhei o folheto e vi que era o Boletim Estatístico do Amazonas. Uma nota de estatística demógrafo-sanitária; as pessoas que faleceram em Manaus durante o primeiro trimestre do corrente ano. Larguei o folheto e continuei a procurar assunto.

Aquela notícia dos mortos de Manaus e fez lembrar um poema de Mário de Andrade sobre o seringueiro; Mário de Andrade me fez pensar em uma outra pessoa que também vi várias vezes no bar da Glória e essa outra pessoa me fez pensar em uma tarde de chuva; isso me lembrou a necessidade de comprar um chapéu, o chapéu me fez pensar no lugar onde o deixei e, logo depois, numa canção negra cantada por Marian Anderson: 'Eu tenho sapatos, tu tens sapatos...' Nessa altura a preocupação de encontrar um assunto fez voltar meus pensamentos para os engraxates da Avenida São João; mas logo rejeitei essa idéia.

E na minha frente continuava o folheto sobre a mesa: Febre tifóide, 6; difteria, 2; coqueluche, 2...Sim, eu voltava aos mortos de Manaus. Ou melhor, os mortos de Manaus voltavam a mim, rígidos, contados pela estatística, transformados apenas em números e nomes de doenças. Ao todo 428 pessoas mortas em Manaus durante o primeiro trimestre do ano de 1940. Que doença matou mais gente? Senti curiosidade de saber isso. O número mais alto que encontrei foi 73; diarréia e enterite. Com certeza na maior parte crianças. Morrem muitas crianças dessas coisas de intestinos no Brasil. Dizem os médicos que é por causa da alimentação pouca ou errada, pobreza ou ignorância das mães. Eis uma coisa que não chega a me dar pena porque me irrita: o número de crianças que morre no Brasil.

Lembro-me que certa vez juntei uma porção de artigos médicos sobre o assunto e escrevi uma crônica a respeito. Mas já nem sei exatamente o que os médicos diziam. O que me irrita é o trabalho penoso das mulheres, o sacrifício inútil de dar vida a tantas crianças que morrem logo. Agora me lembro de um trecho da tal crônica: eu dizia que a indústria nacional que nunca foi protegida é a indústria humana, de fazer gente. Preferimos importar o produto em vez de melhorar a fabricação dele aqui. Não se toma providência para aproveitar o produto nem para que ele seja lançado em boas condições no mercado. A lei só cuida de que ele não deixe de ser fabricado. Fabricação de anjinhos em grande escala! Que morram aos montes as crianças: mas que nasçam aos montões! É brutal.

Mas afinal seriam mesmo crianças, na maior parte, aquelas 73 pessoas? Nem disso tenho certeza. Vamos ver qual é a outra doença que mata mais gente. Passo os olhos pela lista. É impaludismo: 60. Depois, tuberculose, 51. Depois nefrites, 32. Noto que houve dois suicidas e dois assassinados. E 19 mortos por 'debilidade congênita'. É a tal fabricação a grosso de gente. Fico pensando nesses débeis congênitos de Manaus. Tenho o desejo cruel de assistir a um filme em que os visse morrer: um filme feito em janeiro, fevereiro e março de 1940 em Manaus. Muito calor, chuvas. 19 crianças imobilizando seus corpinhos magros nos bairros pobres. Vejo esses corpinhos que não possuem força para crescer, para viver: vejo esses pequeninos olhos que ficam parados. 19 enterros: 'debilidade congênita'. Se nos cinemas aparecessem uns complementos nacionais feitos assim, cruelmente, o povo que à noite vai aos cinemas se divertir ficaria horrorizado e amargurado. Que pensamento de mau-gosto!

Penso nesses 60 mortos de impaludismo, nesses 51 mortos de tuberculose e tenho uma visão de seus corpos magros, enfim cansados de tremer, enfim cansados de tossir, sendo levados para o cemitério em dias de chuva, um após o outro. Sem febre mais: frios, frios, amarelados, brancos, míseros corpos de tuberculosos, de impaludados.

Lepra, 18; câncer e outros tumores malignos, 10; tumores não malignos, 2. Esse negócio de medicina tem lá seus humorismos: que estranhos rumores são esses não malignos porém assassinos! Broncopneumonia, 24; doenças do fígado e das vias biliares, 24; disenteria bacilar, 5; doenças do parto, 5; gripe, 6; sífilis, 3; apendicite, 1...A lista é grande. Das 428 pessoas falecidas 235 eram do sexo masculino e 193 do sexo feminino. Ainda bem que os homens morrem mais: 235 homens mortos, 193 mulheres mortas no primeiro trimestre de 1940 em Manaus.

De um modo geral não há nisso nada demais: está visto que as pessoas têm mesmo de morrer. Que morram. Se a gente começa a pensar muito nessas coisas, passa a vida não pensando em mais nada. Então por que esses mortos de Manaus vêm se instalar na minha mesa, sub-repeticiamente, esses mortos de Manaus sem nomes, numerados de acordos com suas doenças, na última página de um boletim de estatística? Enquanto eu procurava assunto e ouvia o samba dos engraxates e via o bar da Glória, e pensava em comprar um chapéu, esses mortos de Manaus me espreitavam certamente, esses 428 mortos absurdos de uma distante Manaus, esses impiedosos desconhecidos mortos me olhavam e expunham no boletim suas mazelas fatais e sabiam que eu não lhes poderia fugir.

Viajaram longamente no seio desse boletim, cada um com o nome e sua doença - o nome de sua morte - pregado na testa; esperaram meses até que eu os visse; o acaso os trouxe para cima de minha mesa; e eles se postaram ali, inflexíveis, reclamando atenção, anônimos, frios, mas impressionantes e duros.

Eu não tenho nada a ver com os mortos de Manaus! Tu nada tens a ver com os mortos de Manaus! Não importa: os mortos de Manaus estão mortos e existem mortos, devidamente registrados, com suas doenças expostas, impressos em boletim, contados e catalogados! Os mortos de Manaus existem: são 428 mortos que morreram em janeiro, que morreram em fevereiro, que morreram em março do ano de 1940.

Eles existem, eles não estão apenas jogados sobre a minha mesa, mas dentro de mim, mortos, peremptórios, em número de 428. Há dois que morreram por causas 'não especificadas', mas nem por isso estão menos mortos que os outros, certamente. Os mortos de Manaus! Eles estão jogados sobre a mesa, e a mesa é vasta e fria como a tristeza do mundo, e eu me debruço, e eles projetam sobre minha alma suas 428 sombras acusativas. Sim, eu percebo que estão me acusando de qualquer coisa. Um deles - talvez um daqueles amargos e cínicos assassinados ou, espantosamente, apenas uma criança congenitamente débil -, um deles não está tão grave como os outros e ri para mim de modo tranqüilo mas terrível. E murmura:

'Pobre indivíduo, nós aqui te estamos a servir de assunto, e nós o sabemos. À nossa custa escreves uma coisa qualquer e ganhas em troca uma cédula. Talvez a nossa lembrança te atormente um pouco, mas sairás para a rua com esta cédula, e com ela comprarás cigarros ou chopes, com ela te movimentarás na tua cidade, na tua mesquinha vida de todo o dia. E o rumor dessa vida, e o mofino prazer que à nossa custa podes comprar te ajudará a esquecer a nossa ridícula morte!'

Assim fala um deles, mas sem muita amargura. São 428, e agora todos guardam silêncio. Mas esse silêncio de 428 mortos de verão em Manaus é tão pesado e tenso que eu percebo acima desses intranqüilos ruídos do tráfego das ruas da cidade por onde daqui a pouco andarei, acima de algumas palavras que me disserem, ou de ternura, ou de aborrecimento, acima dos diurnos ou noturnos sons da vida, e do samba dos engraxates, e das músicas dos rádios do café onde entrarei, e das palavras de estranhos perdidas nas esquinas, e do telefone e de minha própria voz, acima de tudo estará esse silêncio pesado. Estará sobre tudo como pesada nuvem pardo-escura tapando o céu de horizonte a horizonte, grossa, opressora, transformando o sol em um pesado mormaço. Os sons e as vozes da vida adquirem um eco sob essa tampa de nuvem grossa, pois essa nuvem é morta e está sobre todas as coisas.

Arredai, mortos de Manaus! Seja o que for, que tiverdes a dizer, tudo o que me disserdes será tremendo, mas inútil. Eu me sentia em vossa frente inquieto e piedoso, mas sinto que não quereis a minha piedade: os vossos olhos, os vossos 428 pares de olhos foscos me olham imóveis, acusadores, obstinados. Pois bem! A mais débil de todas as brisas do mundo, a mais tímida aragem da vida dentro em pouco vos afastará, pesada nuvem de mortos! Sereis varridos como por encanto para longe de minha vida e de minha absurda aflição. A força da vida - sabei, oh mortos - a força de vida mais mesquinha é um milagre de todo dia. Eu não tenho culpa nenhuma, e nada tenho a ver convosco. Arredai, arredai. Eu não tenho culpa de nada, eu não tenho culpa nenhuma!"

São Paulo, setembro, 1940
Rubem Braga


2005 foi o ano em que até os rios da Amazônia secaram.

Gabriel
 
 
sua anta!

Se se come! É da melhor carne que tem o Amazonas. Há quem goste mais de paca e de cotia. Mas, para mim, não há nada como a anta e veado. Você vê este lugar de ferida que eu tenho aqui na barriga da perna? Foi por gostar de anta. Eu tinha posto uma armadilha, porque ela, quando vai comer à fruteira ou focinhar no barreiro, faz sempre o mesmo caminho. Pus o rifle no pau rachado e um barbante do gatilho a outro pau, para quando o bicho passasse a bala lhe dar mesmo no peito. Mas a anta, nessa noite , não veio e eu, de manhã, fui ver se ela estava estendida. Já não me lembrava bem do sítio da armadilha e rocei a perna no barbante. Pum! A bala me levou a carne que falta aqui…
(pág. 94)
Pois, Firmino, acontece.
...
laerce
 
  O medo, novamente
“...o silêncio volvia. E, com ele, uma longa, uma indecifrável expectativa. Dir-se-ia que a selva, como uma fera, aguardava há muitos milhares de anos a chegada de maravilhosa e incognoscível presa.
...
-Isto faz medo! – confessou Alberto.”

(p.96)

Troti
 
 


Troti
 
  A selva
“Dum lado e outro, a selva. Até esse instante Alberto vira apenas as suas linhas marginais; surgia, agora, o coração.
Surgia com um aglomerado exuberante, arbitrário e louco, de troncos e hastes, ramaria pegada e multiforme, por onde serpenteava, em curvas imprevistas, em balanços largos, em anéis repetidos e fatais, todo um mundo de lianas e parasitas verdes, que faziam de alguns trechos uma rede intransponível. Não havia caule que subisse limpo de tentáculos a expor a crista ao sol; a luz descia muito dificilmente e vinha, esfarrapando-se entre folhas, galhos e palmas, morrer na densa multidão de arbustos, cujo verde intenso e fresco nunca esmorecia com os ardores do Estio. ...Crescia a mata até à altura de homens, posto um sobre o outro, e só então os olhos podiam encontrar algum espaço em branco, riscado, ainda assim, pelos coleios dos cipós que iam de tronco a tronco, dando ponte a capijubas e demais macacaria pequena...
De longe a longe, uma palmeira muito esguia e clara subia, em arranco de foguete, para olhar a selva por cima do ondeado em que terminava todo o arvoredo...
A princípio, ainda os olhos fixavam o revestimento deste e daquele tronco e de outro, e outro, e outro, mas depois abandonavam-se ao conjunto, porque não havia memória nem pupila que pudesse recolher tão grande variedade....Somente a colectividade imperava ali: o indivíduo vegetal despersonalizava-se e era amesquinhado pelos vizinhos, tantos, tantos...”

(p.94/95)

Troti
 
sábado, dezembro 17, 2005
 
índios


Cândido Rondon



Desadaptado ainda da realidade da selva, Alberto ouve as explicações de Firmino sobre os habitantes daquele reino misterioso.
Ao mesmo tempo que vai fazendo o seu trabalho, Firmino fala dos índios:


- Você precisa também de um rifle, seu Alberto, para quando andar sozinho. Um homem não pode andar por aqui sem bala. Se mata o chefe do batalhão os índios fogem. Há três anos, matou-se um. Tinha quase o dobro da minha grossura e era vermelho como uma malagueta. Aquilo é que são homens fortes!

Mais adiante, Alberto lança a pergunta:

- Mas nunca procuraram amansá-los?
- Ui! Houve um coronel- o coronel Rondon ou lá o que é- que mandou outro militar com gramofones e espelhos, mas ele não pode fazer nada. Aquilo é bicho que só deixará de ser ruim quando desaparecer. (pág. 92)



Este livro é de facto um excelente ponto de partida para conhecer a Amazónia e com ela a realidade do Brasil, um país que precisamos de redescobrir. Só neste excerto, temos a questão das nações índias e o trabalho de Cândido Rondon ( que está na origem do nome de estado de Rondônia). E também o conhecido Projecto Rondon.

Isto para não falar em António Vieira, é claro.



laerce
 
 
“Todos riam agora: os novos perdendo a estranheza; os antigos deleitados com o cavaqueio. Alberto não compreendia a sensibilidade dos que encontravam horas normais naquele tempo que para ele decorria com sentido provisório e alvoroçado. Tudo aquilo tinha já o invólucro do que se recorda para toda a vida com tristeza e mal-estar...
sentiu-se ridículo, assim de gravata e sapatos de verniz, com aquele alforge a dançar-lhe nas costas."

(p.93)

Troti
 
 
“O seringal desvendava-se agora totalmente: em linha recta erguiam-se três barracas, logo dois casarões de madeira e telha. Um, resvés à terra, que devia ser pasto das águas em ano de enchente grande; o outro, muito comprido, ladeado por uma varanda, fixava-se em paliçada, para se libertar das inundações.
(p.82)
...

“Alberto pensava...nos navios negreiros de outrora, ao desembarcarem os escravos em plagas longínquas, quando a voz rude do pastor lhe recordou que também ele fazia parte do rebanho.
...
os desembarcados encolhiam-se, sempre humildes e submissos, entre os velhos seringueiros que surgiam, naquele primeiro contacto, não como homens nascidos na mesma terra e trilhando a mesma via dolorosa, mas como inimigos a quem nada comovia. De sério, só o que lhes interessava: a notícia, veementemente esperada, do último preço da borracha.
...
- Desceu, desceu...
...
os seringueiros fecharam o seu grupo, num grande desalento.
Havia ruído o sonho que os trouxera ali. A goma-elástica, em sucessivas desvalorizações, mal dava agora para a farinha de mandioca e o quilo de jabá que eles adquiriam ao domingo..."

(p.85/86)

Troti
 
sexta-feira, dezembro 16, 2005
 
(what about us)


What about sunrise
What about rain
What about all the things
That you said we were to gain.. .
What about killing fields I
s there a time
What about all the things
That you said was yours and mine...
Did you ever stop to notice
All the blood we've shed before
Did you ever stop to notice
The crying Earth the weeping shores?

Aaaaaaaaaah Aaaaaaaaaah

What have we done to the world
Look what we've done
What about all the peace
That you pledge your only son...
What about flowering fields
Is there a time
What about all the dreams
That you said was yours and mine...
Did you ever stop to notice
All the children dead from war
Did you ever stop to notice
The crying Earth the weeping shores

Aaaaaaaaaaah Aaaaaaaaaaah

I used to dream
I used to glance beyond the stars
Now I don't know where we are
Although I know we've drifted far

(...)

Earth Song, Michael Jackson



...
laerce
 
  selva, selva, selva?
Não, não é só selva. Apeteceu-me passar uns dias alheia a outras personagens que não a selva. Até porque só a descrição desta envolvente-personagem faz muito do livro (e pelo livro). Muitas vezes me deu a impressão que Ferreira de Castro utilizou a Selva como eufemismo para as maldades humanas, como se a Selva escondesse ou justificasse parte dessa maldade - e boa parte do fracasso humano que a habita.

leitora
 
 
Como seria? Que iria suceder?”A curiosidade e a emoção enovelavam-se perante a ideia de que ele se acercava, enfim, do único desvão que a vida lhe oferecera na imensa vastitude do Mundo."
(p.82)

Troti
 
  O medo
“Evocado dali, Portugal era uma quimera, não existia talvez. Pequeno e lá longe, os que o levavam na memória não estavam certos se viviam em realidade ou se sonhavam com as narrações dos que tinham voltado das descobertas. Vendo os contrastes que se agigantavam de dia para dia, a própria personalidade deles entrava em dúvida e todo o passado se esfumava momentaneamente, tudo lhes parecia ilusório. Eles seriam, porventura, uma alucinação sobrevivente de alguém que morrera pensando em fábulas bíblicas, em mundos pré-históricos, e, quando menos o esperassem, desvanecer-se-iam totalmente, como espectros de pesadelo. Só o perigo, mais temido do que em outra parte, por usar máscaras desconhecidas, os reconduzia à realidade, humanizando-os ante eles próprios.”
(p.79)

O medo, espectro da morte, pavor do nosso quotidiano, sinónimo de vida no extremo da vivência.

Troti
 
quinta-feira, dezembro 15, 2005
  Seringal, Seringueiro







leitora
 
 
"A terra ia crescendo e a mata fechando-se cada vez mais. Já não se viam, como nos arredores de Marajó, os troncos das árvores a penetrarem na vasa que as correntes e as marés traziam e alimentavam, nem longos períodos de calvície, aproveitados para a indústria pastoril. Terra livre que se encontrasse, fora limpa a ferro e fogo pelo braço humano, no seu primeiro contacto com a selva dominadora.
As margens ofereciam agora, no meado do Verão, uma altura enorme e eram barro gretado, desvendando raízes e caindo aos bocados. As águas iam corroendo tudo aquilo, assoreia aqui, draga acolá, numa faina silenciosa e constante."

(p.76)

Troti
 
 
"Nem a sua subalternidade de afluente, de simples braço do gigante, tirava ao Madeira grandeza e imponência
...
Os grandes rios de Portugal, o Tejo e o Douro, comparados com aquele, faziam sorrir Alberto. Cada pequeno "igaparé" que desaguava no Madeira, cujo nome ninguém lhe sabia dizer, tinha mais largueza do que o Vouga, o Cávado, o Ave ou o Guadiana
...
Ali tudo perdia as proporcões normais. Olhos que enfiassem, pela primeira vez, no vasto panorama, recuavam logo sob a sensação pesada do absoluto, que dir-se-ia haver presidido à formação daquele mundo estranho."

(p.75)

É este absoluto que nos domina quando temos a sorte de presenciar as extrordinárias imagens que a natureza nos oferece.

Troti
 
quarta-feira, dezembro 14, 2005
 
"A baía continuava a ser, para todos eles, uma miragem deslumbradora, onde estremeciam fantásticos mundos de luminosidades e sombras: ao espelharem-se na água, as vigias pareciam dar acesso a oníricas profundidades e as linhas dos barcos adquiriam expressões de palácios orientais. "
...
Alberto deitou-se, sentindo-se provisório, agora mais do que nunca, no entrançado das redes, onde todos dialogavam, esgotando o tempo, como se essa noite fosse realmente excepcional, ao mesmo tempo reprimida e acrescentada à vida deles."
(p.65)

Troti
 
 
"Tudo parecia voluptuoso e cheio de cálido mistério: a terra ignorada, a cidade a visitar, a rameira apetecida, um gelado ao ar livre - a juventude desejando o que existia e o que inventava para sua fascinação e tormento."
(p.65)

Troti
 
 
"Manaus era um clarão radioso na noite amazonense."
(p.65)

Troti
 
 
«Sim, a selva era bela, majestosa, mesmo deslumbrante. Era rica, havia de ser fantasticamente rica também, mas um dia - um dia que vinha ainda longe. Entretanto, toda a sua grandeza esmagaria, toda a sua deslumbrância seria volúpia do primeiro contacto, logo desvanecida pela monotonia; e dos anónimos desbravadores iriam caindo, inexoravelmente, sob as febres palustres, trespassados pelas flechas envenenadas, desvairados pela ausência do amor - escravos, pobres, miseráveis, ali onde a natureza erguia as suas mais fastigiosas pombas.»
(p. 185)

Fiz esta primeira leitura de "A Selva" seguindo de perto a evolução da relação com a Amazónia ao longo do livro. Por ser apaixonada por essa temática. Mas também por ter gostado muito do papel que esta relação representa na evolução da personagem, acompanhando abrir e fechar de perspectivas de futuro por entre o verde luxuriante - e densa cortina - da ramagem interminável.

A selva é, romance fora, uma personagem que evolui, que mostra as suas manhas e as suas armas, reinventada pela paixão - ou falta dela - das pessoas que nela habitam.

leitora
 
terça-feira, dezembro 13, 2005
 
«Metade da selva vivia da outra metade, como se a terra não bastasse para o império vegetal e fosse necessário sugar as árvores sugar as árvores que chegaram primeiro. Não havia ramagem que não alimentasse, com o próprio sangue, o seu parasita - as grinaldas estranhas que a envolviam. O apuizeiro, de vasta bobliografia, levava mais longe o despotismo: a princípio, era semente anónima caída sobre uma forquilha; depois, raiz bamboleante e humilde, procurando a medo o chão distante; e por fim devorava toda a árvore, até ficar sozinho. Na sua mudez, aquele mundo vegetal tinha crueis egoísmos, ferocidades insuspeitadase tiranias inconfessáveis. Viver! Viver, à sua custa ou à custa de outrem, era a ânsia de todo o ramo, de toda a folha, por mais despersonalizados que se apresentassem aos olhos de quem os via.»
(pp. 130-131)

Esta passagem não é nada inocente, nem neste livro nem na obra de Ferreira de Castro. Seja como for, talvez os homens não tenham inventado nada - limitaram-se, apenas, a seguir os melhores e os piores exemplos. A natureza é a súmula de todas as nossas virtudes e limitações éticas.

leitora
 
segunda-feira, dezembro 12, 2005
  VIVIANE LIMA
Recebi este mail ontem da Monica, de quem sou amiga ja ha 15 anos-posso garantir que nao se trata de um dos muitos esquemas e burlas que circulam na Internet.
Eu sei que talvez pareca abusivo estar a publicar este post no Leitura Partilhada, e eu gostava muito de nao ter que o escrever. A Viviane era uma dos muitos Brasileiros com historias semelhantes as contadas na Selva: historias de emigracao, trabalho arduo e esperanca num futuro melhor que nunca se chegou a concretizar.
.
Caros amigos,
gostava de pedir a vossa colaboração efectuando os donativos que vos forem possíveis para efectuar a Cremação do corpo de uma ex: colega de trabalho que faleceu na madrugada da passada 3ª feira, dia 06. O nome dela era Viviane Lima e faleceu vitima de acidente de mota com o namorado (a notícia saíu no jornal desse mesmo dia 06). Ela trabalhou na mesma empresa há algum tempo e era muito amiga de algumas pessoas que ainda hoje trabalham comigo. Eu conhecia-a também. O que acontece é que ela era brasileira e estava cá sozinha, sem família alguma. Somos nós, conhecidos e amigos, que estamos a tratar do funeral porque a família é humilde e nem dinheiro tem para a passagem de avião. Acontece que para efectuar a trasladação do corpo são precisos pelo menos 15 mil euros e é-nos impossível angariar tamanha quantia!!! A solução possível é fazer a Cremação e enviar o "corpo" para a família no Brasil, ou seja, enviar as cinzas por correio...mas só será possível com muita ajuda porque mesmo sendo mais barato fica cerca de 2 mil euros! Todos nós já contribuímos e temos efectuado o peditório um pouco por todo o lado. Amanhã, 2ª feira, o corpo já vai ser transferido para a funerária mas só pode ser efectuada a cremação quando se reunir todo o dinheiro necessário. Como o tempo escasseia e ela corre risco de ser enterrada como indigente, gostava de pedir a vossa colaboração para que se trate logo deste processo, pois têm sido dias penosas para todos. Há uma advogada encarregue do caso dela, que tem procuração da família para tratar de tudo aqui e tomou a iniciativa de abrir uma conta bancária para angariar fundos para a Cremação. O que vos peço é que contribuam, nem que seja com 5 euros (isso para qualquer um de nós não faz certamente diferença e se todos contribuirem, faz um bom dinheiro para ajudar), e que divulguem entre os vossos amigos e colegas de trabalho, para poderem ajudar-nos... A Viviane tinha feito 25 anos 2 dias antes de morrer e queremos ajudar para que tenha um funeral digno e para que se possa enviar as suas cinzas à família. É um pedido urgente! Precisamos do dinheiro o mais rápido possível! Sejam solidários, por favor, e ajudem com o que puderem...qualquer pequena ajuda é benvinda!
A conta está no nome da advogada: Cristina E. Correia, é no Banco Santander e tem o número: 0246.00200032182
Agradeço desde já a vossa ajuda que, por muito pequena que seja, para nós é uma ajuda enorme! Divulguem por favor e contribuam!
Qualquer dúvida, entrem em contacto comigo!
Muito obrigado a todos!!!

Mónica Silva ...e demais amigos da Viviane!

.
Joana
 
 
«A selva escurecia rapidamente. O entrançado inferior diluía-se, perdia contornos e volumes na negridão que sobrevinha. Os recantos onde residia eterna sombra ampliavam-se, envolvendo e tragando os caules grossos e centenários. O verde rasteiro fora já absorvido; cá em baixo só pardejava a folhagem que a morte desprendera. A luz beijava agora apenas as franças mais altas, que se mostravam, finalmente, em toda a fantasia do seu recorte, sob um céu de azul morno e baço.»




leitora
 
domingo, dezembro 11, 2005
 
«Mas o silêncio volvia. E com ele, uma longa, uma indicifrável expectativa. Dir-se-ia que a selva, como uma fera, aguardava há muitos milhares de anos a chegada de maravilhosa e incognoscível presa.»

O medo que tudo anula, até o deslumbre da beleza imensa. O medo, não - a certeza do destino à espera.


leitora
 
 
“A sua vida de isolado enchia-se de puerilidades, de
monólogos interiores..."

(p.62)

Troti
 
sábado, dezembro 10, 2005
 
«E por toda a parte o silêncio. Um silêncio sinfónico, feito de milhões de gorjeios longínquos, que se casavam ao murmúrio suavíssimo da folhagem, tão suave que parecia estar a selva em êxtase.»

O silêncio é sinfónico e o êxtase quase silencioso. Não me posso esquecer disto.

leitora
 
 
o forte





Alberto vira ainda, em Santo António de Borba, a muitos meses de Portugal, restos de cantaria ida de Lisboa, para convento que não passara jamais de aspiração a realizar. E lá para cima, no Guaporé, o desmantelado forte do Príncipe da Beira, ruínas de uma soberania longínqua, ferro podre, bronze com azinhavre, falava de 203 dias de viagem através da floresta, que tantos levaram os construtores da barricada, do Pará ao lugar onde o rei de Portugal queria ostentar canhões com a sua coroa. E essa artilharia, agora desfeita, devorada pela ferrugem, fora conduzida através das cachoeiras, numa primeira, titânica e muda batalha com os elementos que se opunham à vontade dominadora do lusíada.

(pág. 66)

Ler a Selva e acompanhar o percurso da personagem implica entrar, num certo sentido, dentro da selva também. Aqueles rios, aquelas cidades existem e têm a sua história contada. Por isso, precisei de me situar e entrei dentro de outra selva, os muitos links da Internet, e deixo-vos aqui um mapa daquela região.

Há uma palavra, aliás duas, que estou a anotar com interesse: o homem português aqui nesta obra é o lusitano, o lusíada. Para além de saber que Alberto é monárquico, estou curiosa face ao que possa concluir pelo uso frequente dos citados nomes.
...
laerce
 
 
“De quando em quando, o “Justo Chermont” desembocava
em trecho amplo e os olhos de Alberto corriam de norte
a sul, num abraço à vastidão luminosa. E, mais do que
navegando num rio, lhe parecia que singravam em lago
de remotos confins. Nem sempre se divisava a outra
margem e, se surgia, era um simples pespontado negro,
na linha do horizonte. A água dir-se-ia subir, subir
em esplanada, para ir despenhar-se em longínqua,
imponenete e imaginária barragem. Nas árvores mortas
que arrastava, preguiçosamente, pousavam belas
pernaltas...
Ainda mais adornos povoavam a água barrenta, grossa e
vagarosa na sua marcha como alava descendo dos
vulcões: era o murueé, era a aninga, o muri, as ilhas
decanarana que se soltavam das margens – um
interminável viveiro de plantas aquáticas e
vagabundas..."
(p.58/59)


Troti
 
sexta-feira, dezembro 09, 2005
  horizonte
«era sempre a mataria, a mataria e a água em amplitudes de pasmar a quem não concebesse que nos oceanos pudessem também nascer bosques mitológicos.»



Temos de ter abertura para a magia. Até porque a Amazónia (ainda) existe.

leitora
 
 
ciclos

Um dia, porém, a herba brasiliensis, levada sub-repticiamente por mãos britânicas, desdobrara a sua nacionalidade, entregando também a seiva enriquecedora em terras de Ceilão. Ferida pela emigrada, a borracha da Amazónia deixara de ser meio de elásticas fortunas, limitando a perspectiva das ambições. Era prata e não oiro o que se colocava agora no outro lado da balança.

(pág. 29)

A história do Brasil pode, também, ser contada por ciclos. O ciclo do ouro, o do café, o da borracha, o do cacau. De certa forma, se vê por aí, a riqueza imensa do país e também a forma como ela foi explorada pelos diferentes intervenientes. No livro A Selva, estamos no ciclo da borracha e esta passagem mostra bem o que então se passava. Nada que nós desconheçamos em relação à forma como a Inglaterra conseguiu ver sempre mais longe quando se tratava de progresso e economia. Pois… e nós a ver.
...
laerce
 
 
“Os olhos inexperientes não encontravam referência
nessas margens aparentemente sempre iguais, na
vegetação que se repetia, senão na espécie, no
entrançado, despersonalizando o indivíduo em prol do
conjunto, único que ali se impunha. Cada curva se
parecia com outra curva, cada recta com a recta
antecedente..."

(p.57)

Troti
 
quinta-feira, dezembro 08, 2005
  teatro
«Renunciou a ver de perto o Teatro Amazonas , famoso em todo o Norte do Brasil, com sua cúpula orgulhosa, que lhe sugerira, quando a vislumbrara de bordo, velha perspectiva de Constantinopla, encontrada nas páginas duma revista.»



Idealizado para ser uma jóia da belle époque encravada no coração da selva amazônica e colocar Manaus no patamar dos grandes centros da civilização ocidental, o Teatro Amazonas desponta, hoje, depois de quatro restaurações, como um dos mais belos monumentos artísticos da humanidade. Ele reflete o fastígio do ciclo áureo da borracha na Amazônia e a determinação do espírito do povo amazonense. Seu estilo eclético reúne quatro fachadas distintas (greco-romana), tendo como destaque uma cúpula a la turca de 36 mil escamas em cerâmica esmaltada, com as cores da bandeira brasileira; possui estátuas de ferro francesas, pinturas italianas neoclássicas, mármores de Carrara, cristais de Murano e da Boêmia, dourados barroco, estuques rococós, cadeiras de couro russo, jarros japoneses, pinho de Riga e madeiras regionais, cosmopolitismo reinante em Manaus, quando capital mundial da borracha.
Fonte

leitora
 
 
a pororoca


imagem daqui


Este é, sem dúvida, um livro que desperta vontade de ir mais além. Estou na parte em que Alberto chega a Manaus e desembarca mesmo contra a ordem expressa de quem o contratou. Já li um pouquinho mais e sei que ele vai tentar uma viragem no destino que lhe está traçado. Com certeza não vai conseguir.
Tenho também um fascínio muito grande por esse espaço imenso da narrativa que começa em Belém do Pará e não posso deixar de procurar informações colaterais, digamos assim.

Aqui está uma delas: a pororoca:
O fenómeno da Pororoca que ocorre na região Amazónica, principalmente na foz do seu grandioso e mais imponente rio, o Amazonas, é formado pela elevação súbita das águas junto à foz, provocada pelo encontro das marés ou de correntes contrárias, como se estas encontrassem um obstáculo que impedisse seu percurso natural…(cont.)
...
laerce
 
 
“O “Justo Chermont” ora enfiava pelos estreitos “
paranás”, tão ocultos nas margens que o barco
dir-se-ia penetrar na própria floresta ora despachava
para o céu os rolos do seu fumo em pleno centro do
rio. E então, se os olhos se dirigiam para a frente, a
saída tornava-se tão misteriosa como o fora a entrada
– tudo selva, selva por toda a aparte, fechando o
horizonte na primeira curva do monstro líquido.”

(p.57)

Troti
 
quarta-feira, dezembro 07, 2005
  escalas
«tudo selva, selva por toda a parte, fechando o horizonte na primeira curva do mosntro líquido. As suas veias mais pequenas, que davam passagem a grandes transatlânticos (...)»

Há umas semanas perguntaram-me se Lisboa fica perto do Porto. Hesitei. Depende da escala de longe - o que é para ti longe? Longe mede-se em horas de avião. Perto mede-se em horas de carro, ou de autocarro, ou de comboio. Perto, Lisboa fica perto do Porto.

E os nossos rios são alegres e delgados cursos de água, por vezes navegáveis, mas nunca por transatlânticos. E falta-nos Selva - cada ano nos falta mais selva...

leitora
 
 
“De quando em quando, a linha da selva recolhia-se e
ia debruar, mais além, um pequeno campo aberto no
matagal a fogo e a terçado – o “sítio” onde dois ou
três caboclos haviam fundado o seu lar.
Era sempre uma barraca coberta de folhas de palmeira e
de soalho erguido um ou dois metros acima da terra,
fixando-se em estacas. Para que as águas do rio, nas
grandes enchentes, passassem por baixo sem atingir
corpos e haveres naquele isolamento profundo. Ao lado,
um “girau” – estrado onde sorriam, dentro de velhas
latas, humildes plantas floridas. Um mamoeiro, duas ou
três touças de bananeiras, às vezes uns metros de
mandiocal, uma canoa balouçando-se no porto – e mais
nada.
...
O resto era a solidão imensa, uma vida encastoada na
selva, alheia a todas as inquietações do Mundo,uma
vida tão à parte, tão obscura e ignorada que Alberto
ficava a pensar num retiro de misantropos."

(p.52/53)

Troti
 
terça-feira, dezembro 06, 2005
  Amar a Amazónia
«Cobria-a densa vegetação que se entrelaçava, dir-se-ia com frenesi, numa ciclópica muralha de troncos, ramos e folhas. Eram miríades de variedades, roubando-se mutuamente o carácter, confundindo-se, fraternizando em abracadabrante luxúria vegetal. Árvore que pretendera desgrenhar a cabeleira mais acima da das irmãs, fora seguida por tão copiosa multidão de lianas e parasitas, que dentro de em pouco o seu desejo se tornara vaidade inútil. Quase não se vislumbravam os caules: as plantas rasteiras, os arbustos, os "tajás" e os cipós, tudo ocultavam, tudo fechavam, enexoravelmente. Os olhos não iam para lá da margem, da cortina espessa que resguardava as salas interiores, as clareiras - se, porventura, existiam»


Dos meus maiores desejos de viagem é visitar a Amazónia por água. Passear-me pela tal teia líquida, e sentir-me grão de areia, ainda mais pequena que os meus próprios olhos.

leitora
 
 
ficção?


Portinari, Retirantes



De um dia para o outro, o seringueiro de “saldo”, que suportava uma dezena de anos na selva, em luta com a natureza implacável, para adquirir os dinheiros necessários ao regresso, via-se sem nada – e sem saber até como o haviam despojado. De novo pobre, com família e a terra, preocupações constantes do seu exílio, a atraírem-no de longe, ele sufocava, uma vez mais, as saudades, a dor do tempo perdido, e regressava ao seringal, tão miserável como na primeira hora em que lá aportara.

(pág. 29)

Demasiado real para ser ficção.



...
laerce
 
 
“...essa imensa vegetação, cerrada e múltíplice,
continuava a não permitir, apesar de tão próxima, que
vislumbrassem a sua profundidade. Sugeria, porém, a
existência de rincões em eterna sombra, de criptas
vegetais onde o sol jamais entrava, terra mole e
ubérrima, lançando por todos os poros um tronco para o
céu – um mundo em germinação fabulosa, alucinante e
desordenada, negando hoje os princípios estabelecidos
ontem, afirmando amanhã uma realidade que ninguém
ousaria antever."

(p.52)

Troti
 
segunda-feira, dezembro 05, 2005
  «enorme oval líquido.
Depois de saber que toda aquela água não era pertença do oceano, mas sim o corpo da imensurável aranha hidrográfica da Amazónia, vinha-lhe o assombro da vastidão, do que pesa e esmaga pormenores e, pela sua grandeza, se recusa de começo à fria análise.»

Como é bom rendermo-nos ao assombro, sermos vítimas desta recusa inicial à análise. Existe, ponto. É, e os meus olhos são pequenos para sequer abarcar, quanto mais compreender, olhar.

leitora
 
 
“continuava a importuná-lo a promiscuidade em que a
vida se realizava ali, a igualdade em que todos se
fundiam, como se cada um não tivesse o seu
temperamento, as suas predilecções, a autonomia que
ele desejava para si."

(p.51)

Troti
 
domingo, dezembro 04, 2005
  Amazónia
I

Era, então, a Amazónia um imã na terra brasileira e para ela convergiam copiosas ambições dos quatro pontos cardeais, porque a riqueza se apresentava de fácil posse, desde que a audácia se antepusesse aos escrúpulos. Com os rebalhos, idos do sertão do Nordeste, demandavam a selva exuberante todos os aventureiros que buscam pepitas de oiro ao longo dos caminhos do Mundo. E como não era na brenha espessa que se encontrava, para os ligeiros de consciência, a aurífera jazida, quedavam-se os ladinos em Belém e Manaus, a traficar com o esforço mitológico dos que, entre todos os perigos, se entregavam à extracção da borracha.

A Selva
Ferreira de Castro

Este Mundo de maiúscula, que entretanto, não sei bem porquê, passou a ser apenas mundo, não mudou assim tanto. A Amazónia continua a sua luta pela sobrevivência. As ambições mantêm-se copiosas... O Verde mantém-se luxuriante - onde ainda existe verde.

leitora
 
 
"...a linha pardacenta, que se via ao longe, foi-se
aproximando, crescendo, alastrando, mudando de cor.
Era verde agora e já se verificava, nitídamente, o
recorte do arvoredo.
...
densa vegetação que se entrelaçava, dir-se-ia com
frenesi, numa ciclópica muralha de troncos, ramos e
folhas. Eram miríades de variedades, roubando-se
mutuamente o carácter, confundindo-se, fraternizando
em abracadabrante luxúria vegetal...
Quase não se vislumbravam os caules: as plantas
rasteiras, os arbustos, os “tajás” e os cipós, tudo
ocultavam, tudo fechavam, inexoravelmente.
...
E sempre a mesma coisa, sempre a mesma coisa.

(p.49)

Troti
 
sábado, dezembro 03, 2005
  citações iniciais
«Estamos dentro das mais densas solidões do Mundo.»
Tavares Bastos
"Vale do Amazonas", 1866



É engraçado ver estas citações, e senti-las datadas. A mais densa solidão está sempre dentro de nós, e apenas dentro de nós. O Mundo é densamente povoado...


leitora
 
 
Emigrantes no Mundo


No século XX, os escritores portugueses tomam verdadeiramente consciência que Portugal tem emigrantes espalhados por todo o mundo. O Brasil continua ser a terra de eleição, mas também os há em grande quantidade nos Estados Unidos e em muitos outros países. O tema da diáspora, ensaiado por Fernão Mendes Pinto, volta agora a ser retomado. Estamos agora perante uma literatura que soube captar um fenómeno universal, vivido por todos aqueles que um dia tiveram que deixar as suas terras em busca de melhores condições de vida. Alguns destes romances sobre emigração, como os de Ferreira de Castro, obtém uma larga difusão internacional.

fonte


...
laerce
 
 
"Devia-lhes este livro, que constitui um pequeno capitulo da obra que ha-de registar a tremenda caminhada dos deserdados atraves dos seculos, em busca de pao e de justica."
.
Joana
 
  (e?)Migrantes
"Os homens transitam do Norte para o Sul, de Leste para Oeste, de país para país, em busca de pão e de um futuro melhor."
É assim que começa o romance Emigrantes de Ferreira de Castro. E é curioso como o tempo muda a eficácia das referências geográficas na caracterização dos movimentos migratórios dos humanos. Hoje, Ferreira de Castro trocaria certamente o Norte pelo Sul, para falar dos lugares de onde se parte com uma ponta de esperança. E nós? Estaremos capazes de perceber a diferença?

AMS
 
  A Selva
Comecei a ler este livro e veio-me logo à ideia um outro, Gaibéus de Alves Redol lido há muitos anos atrás.
Depois reparei que os dois se passam na década de 30, duas realidades de um mesmo país e de uma mesma época.
A migração sazonal dos gaibéus e a emigração definitiva de todos aqueles que partiram para o Brasil.
Este fenómeno da migração conhecido dos livros há muitos anos e vivido de perto por parte de alguns familiares não me tocou tanto quanto agora que também eu sou migrante.
Vou ler mais um pouco para depois poder partilhar aqui.

Rihian
 
 
“A selva, os homens que nela viviam, o seu drama
interdependente, uma plena autenticidade e nenhum
efeito fácil – era essa a minha ambição. (p.23)

Havia em mim o desejo de dar uma síntese de toda a
selva do Amazonas."

(p.24)

Troti
 
 
"Debruçado na amurada, de coração opresso, demorei-me a
ver o navio distanciar-se, avançando para a curva do
rio, essa curva que, quando o sol nascia, dava ao
grande curso líquido, com a ténue neblina do seu
próprio bafo, o aspecto brumoso dum lago ao despertar.
Eu tinha, então dezasseis anos. E dos quatro que
passara ali, não houve um só dia em que não desejasse
evadir-me...fugir de qualquer forma, mas fugir!"

(p.18)

Troti
 
sexta-feira, dezembro 02, 2005
 
da palavra à imagem









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laerce
 
 
uma certa forma de estar


Ferreira de Castro foi um escritor-operário que defendia o ideário anarco-sindicalista e um dos escritores portuguesesmais lidos de todos os tempos. Para além disso, a sua escrita faz a ponte entre um naturalismo ecologista e o neo-realismo social.Recusava-se também a ser mais um patrioteiro. Numa carta com data de 1953 escrevia:"(..) a verdade é que, por cima da condição de europeu, de latino e de português, sinto na minha alma uma grande identidade com a alma de todos os outros povos."Já noutro momento o escritor declarara:"Eu não sou bairrista, não sou regionalista, não sou nacionalista; amo Portugal inteiro, a Europa inteira, o mundo inteiro; amo profundamente o povo do nosso país, mas amo também toda a Humanidade."Esse amor pela Humanidade passava por compreender e amar o semelhante pelo que tem de positivo e negativo, de sucesso ou de insucesso, ou seja, pelo seu todo, e pelo que intrinsecamente é. Passava, finalmente, também, por"compreender e fraternizar com os homens (...) de todas as cidades e de todas as aldeias de todos os países da Terra, por cima de todas as fronteiras e de todas as pátrias."
fonte
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laerce
 
 
o reconhecimento



Em 1930 Ferreira de Castro publica "A Selva", na qual resgata as experiências vividas na Amazónia. Esse romance tornou-se um grande sucesso tanto em Portugal como no Brasil. Isso porque a obra trata dos problemas sociais vividos pelo povo da região Amazónia com objectividade e extremo senso crítico
Os seus estão livros traduzidos para vários idiomas. Sem sombra de dúvidas, as obras mais importantes de sua carreira são "Emigrantes" e "A Selva", pois são consideradas precursoras do Neo-Realismo em Portugal.


fonte




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laerce
 
quinta-feira, dezembro 01, 2005
 
O homem e a obra




José Maria Ferreira de Castro nasceu a 24 de Maio de 1898, no lugar de Salgueiros, freguesia de Ossela, concelho de Oliveira de Azeméis. De origens humildes, órfão de pai, a sua educação foi rude e exigente, influenciando a sua personalidade triste e amargurada. Em 1904 entra para a escola primária de Ossela, que lhe confere as únicas habilitações que possui, motivo do qual se orgulhava. Interessa-se desde muito cedo pela leitura, adquirindo todas as obras de cordel que a sua parca condição financeira podia suportar. Passa os primeiros anos da sua vida em intensa comunhão com a natureza do vale banhado pelo rio Caima, em Ossela. Aos 12 anos de idade emigra para o Brasil, passando parte da sua adolescência, de início no Seringal Paraíso, no interior da Amazónia, e posteriormente, em Belém do Pará, onde trabalhou arduamente para conseguir subsistir. Em 1916 consegue publicar o romance "Criminoso por Ambição", que distribui porta a porta. A partir daí, começa a colaborar com alguns jornais locais, estabelecendo, a pouco e pouco, relações com pessoas que lhe abrem o caminho na vida jornalística. Produz e publica, por esta altura, algumas novelas, que, apesar de renegadas mais tarde, lhe começam a conferir alguma notoriedade. Contudo, só em 1928, com a publicação de Emigrantes, se inicia definitivamente a sua carreira literária, alcançando notória consagração em 1930, ano em que publica a Selva, a obra lusófona com mais traduções feitas. Com este sucesso editorial, quer em Portugal, quer no estrangeiro, consegue, através da publicação de diversos e sucessivos êxitos literários, alimentar a auréola da notoriedade até falecer, em 1974, com 76 anos de idade. Mas, para além da notoriedade literária, a personalidade humanista de Ferreira de Castro, que tão bem alimentou a sua obra, constituiu uma referência cívica e moral na luta contra o regime ditatorial e em prol dos direitos humanos.

fonte


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laerce
 
 
'welcome to the JUNGLE'


Henri Rousseau



Concluído o percurso de Antonin Artaud, damos entrada na selva amazónica, um emaranhado não menos complexo do que o anterior, mas seguramente mais colorido e com mais lianas para nos agarrarmos, não estivessem por ali as primeiras pegadas do neo-realismo. Partimos de Ossela ( sim, um lugar bem pertinho do Porto). Vamos ver pela mão de quem…



...
laerce
 
 
"Eu devia este livro a essa majestade verde, soberba e enigmática, que é a selva amazónica..."

Troti
 

O QUE ESTAMOS A LER

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LEITURAS NO ARQUIVO

"ULISSES", de James Joyce (17 de Julho de 2003 a 7 de Fevereiro de 2004)

"OS PAPEIS DE K.", de Manuel António Pina (1 a 3 de Outubro de 2003)

"AS ONDAS", de Virginia Woolf (13 a 20 de Outubro de 2003)

"AS HORAS", de Michael Cunningham (27 a 30 de Outubro de 2003)

"A CIDADE E AS SERRAS", de Eça de Queirós (30 de Outubro a 2 de Novembro de 2003)

"OBRA POÉTICA", de Ferreira Gullar (10 a 12 de Novembro de 2003)

"A VOLTA NO PARAFUSO", de Henry James (13 a 16 de Novembro de 2003)

"DESGRAÇA", de J. M. Coetzee (24 a 27 de Novembro de 2003)

"PEQUENO TRATADO SOBRE AS ILUSÕES", de Paulinho Assunção (22 a 28 de Dezembro de 2003)

"O SOM E A FÚRIA", de William Faulkner (8 a 29 de Fevereiro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. I - Do lado de Swann)", de Marcel Proust (1 a 31 de Março de 2004)

"O COMPLEXO DE PORTNOY", de Philip Roth (1 a 15 de Abril de 2004)

"O TEATRO DE SABBATH", de Philip Roth (16 a 22 de Abril de 2004)

"A MANCHA HUMANA", de Philip Roth (23 de Abril a 1 de Maio de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. II - À Sombra das Raparigas em Flor)", de Marcel Proust (1 a 31 de Maio de 2004)

"A MULHER DE TRINTA ANOS", de Honoré de Balzac (1 a 15 de Junho de 2004)

"A QUEDA DUM ANJO", de Camilo Castelo Branco (19 a 30 de Junho de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. III - O Lado de Guermantes)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2004)

"O LEITOR", de Bernhard Schlink (1 a 31 de Agosto de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. IV - Sodoma e Gomorra)", de Marcel Proust (1 a 30 de Setembro de 2004)

"UMA APRENDIZAGEM OU O LIVRO DOS PRAZERES" e outros, de Clarice Lispector (1 a 31 de Outubro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. V - A Prisioneira)", de Marcel Proust (1 a 30 de Novembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA", de José Saramago (1 a 21 de Dezembro de 2004)

"ENSAIO SOBRE A LUCIDEZ", de José Saramago (21 a 31 de Dezembro de 2004)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VI - A Fugitiva)", de Marcel Proust (1 a 31 de Janeiro de 2005)

"A CRIAÇÃO DO MUNDO", de Miguel Torga (1 de Fevereiro a 31 de Março de 2005)

"A GRANDE ARTE", de Rubem Fonseca (1 a 30 de Abril de 2005)

"D. QUIXOTE DE LA MANCHA", de Miguel de Cervantes (de 1 de Maio a 30 de Junho de 2005)

"EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (Vol. VII - O Tempo Reencontrado)", de Marcel Proust (1 a 31 de Julho de 2005)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2005)

UMA SELECÇÃO DE CONTOS LP (1 a 3O de Setembro de 2005)

"À ESPERA NO CENTEIO", de JD Salinger (1 a 31 de Outubro de 2005)(link)

"NOVE CONTOS", de JD Salinger (21 a 29 de Outubro de 2005)(link)

Van Gogh, o suicidado da sociedade; Heliogabalo ou o Anarquista Coroado; Tarahumaras; O Teatro e o seu Duplo, de Antonin Artaud (1 a 30 de Novembro de 2005)

"A SELVA", de Ferreira de Castro (1 a 31 de Dezembro de 2005)

"RICARDO III" e "HAMLET", de William Shakespeare (1 a 31 de Janeiro de 2006)

"SE NUMA NOITE DE INVERNO UM VIAJANTE" e "PALOMAR", de Italo Calvino (1 a 28 de Fevereiro de 2006)

"OTELO" e "MACBETH", de William Shakespeare (1 a 31 de Março de 2006)

"VALE ABRAÃO", de Agustina Bessa-Luis (1 a 30 de Abril de 2006)

"O REI LEAR" e "TEMPESTADE", de William Shakespeare (1 a 31 de Maio de 2006)

"MEMÓRIAS DE ADRIANO", de Marguerite Yourcenar (1 a 30 de Junho de 2006)

"ILÍADA", de Homero (1 a 31 de Julho de 2006)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2006)

POESIA DE ALBERTO CAEIRO (1 a 30 de Setembro de 2006)

"O ALEPH", de Jorge Luis Borges (1 a 31 de Outubro de 2006) (link)

POESIA DE ÁLVARO DE CAMPOS (1 a 30 de Novembro de 2006)

"DOM CASMURRO", de Machado de Assis (1 a 31 de Dezembro de 2006)(link)

POESIA DE RICARDO REIS E DE FERNANDO PESSOA (1 a 31 de Janeiro de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 28 de Fevereiro de 2007)

"O VERMELHO E O NEGRO" e "A CARTUXA DE PARMA", de Stendhal (1 a 31 de Março de 2007)

"OS MISERÁVEIS", de Victor Hugo (1 a 30 de Abril de 2007)

"A RELÍQUIA", de Eça de Queirós (1 a 31 de Maio de 2007)

"CÂNDIDO", de Voltaire (1 a 30 de Junho de 2007)

"MOBY DICK", de Herman Melville (1 a 31 de Julho de 2007)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2007)

"PARAÍSO PERDIDO", de John Milton (1 a 30 de Setembro de 2007)

"AS FLORES DO MAL", de Charles Baudelaire (1 a 31 de Outubro de 2007)

"O NOME DA ROSA", de Umberto Eco (1 a 30 de Novembro de 2007)

POESIA DE EUGÉNIO DE ANDRADE (1 a 31 de Dezembro de 2007)

"MERIDIANO DE SANGUE", de Cormac McCarthy (1 a 31 de Janeiro de 2008)

"METAMORFOSES", de Ovídio (1 a 29 de Fevereiro de 2008)

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"O MANUAL DOS INQUISIDORES", de António Lobo Antunes (1 a 30 de Abril de 2008)

SERMÕES DE PADRE ANTÓNIO VIEIRA (1 a 31 de Maio de 2008)

"MAU TEMPO NO CANAL", de Vitorino Nemésio (1 a 30 de Junho de 2008)

"CHORA, TERRA BEM-AMADA", de Alan Paton (1 a 31 de Julho de 2008)

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"MENSAGEM", de Fernando Pessoa (1 a 30 de Setembro de 2008)

"LAVOURA ARCAICA" e "UM COPO DE CÓLERA" de Raduan Nassar (1 a 31 de Outubro de 2008)

POESIA de Sophia de Mello Breyner Andresen (1 a 30 de Novembro de 2008)

"FOME", de Knut Hamsun (1 a 31 de Dezembro de 2008)

"DIÁRIO 1941-1943", de Etty Hillesum (1 a 31 de Janeiro de 2009)

"NA PATAGÓNIA", de Bruce Chatwin (1 a 28 de Fevereiro de 2009)

"O DEUS DAS MOSCAS", de William Golding (1 a 31 de Março de 2009)

"O CÉU É DOS VIOLENTOS", de Flannery O´Connor (1 a 15 de Abril de 2009)

"O NÓ DO PROBLEMA", de Graham Greene (16 a 30 de Abril de 2009)

"APARIÇÃO", de Vergílio Ferreira (1 a 31 de Maio de 2009)

"AS VINHAS DA IRA", de John Steinbeck (1 a 30 de Junho de 2009)

"DEBAIXO DO VULCÃO", de Malcolm Lowry (1 a 31 de Julho de 2009)

...leitura livre... de leitores amadores (1 a 31 de Agosto de 2009)

POEMAS E CONTOS, de Edgar Allan Poe (1 a 30 de Setembro de 2009)

"POR FAVOR, NÃO MATEM A COTOVIA", de Harper Lee (1 a 31 de Outubro de 2009)

"A ORIGEM DAS ESPÉCIES", de Charles Darwin (1 a 30 de Novembro de 2009)

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